Quarta-feira, 10 de Julho de 2002
I Série — Número 30
IX LEGISLATURA
1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2002-2003)
REUNIÃO PLENÁRIA DE 9 DE JULHO DE 2002
Presidente: Ex.mo Sr. João Bosco Soares Mota Amaral
Secretários: Ex. mos Srs. Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Ascenso Luís Seixas Simões
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
António João Rodeia Machado
minutos.
S U M Á R I O
O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 15
Carneiro (PSD) e Elisa Ferreira (PS).
Deu-se conta da entrada na Mesa do projecto de lei n.º 108/IX
e da Defesa Nacional (Paulo Portas).
e do projecto de resolução n.º 43/IX.
Ao abrigo do n.º 2 do artigo 245.º do Regimento da Assembleia
da República, abriu o debate sobre o estado da Nação o Sr. Primei-
ro-Ministro (Durão Barroso).
Seguiram-se no uso da palavra, a diverso título, além daquele
orador, e do Sr. Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares
(Luís Marques Mendes), os Srs. Deputados Eduardo Ferro Rodri-
gues (PS), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Carlos
Carvalhas (PCP), Francisco Louçã (BE), Heloísa Apolónia (Os
Verdes), José Sócrates (PS), Marco António Costa (PSD), Nuno
Teixeira de Melo (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Luís Fazen-
da (BE), António Filipe (PCP), Machado Rodrigues e Clara
No encerramento do debate, interveio o Sr. Ministro de Estado
Entretanto, em interpelação à Mesa, o Sr. Deputado António
Costa (PS) perguntou qual era a resposta ao apelo que o Sr. Depu-
tado do PS Eduardo Ferro Rodrigues lançou no sentido de saber se
o Governo aceitava ou não que, no termo do debate na generalida-
de, a proposta de lei n.º 16/IX — Lei da estabilidade orçamental,
que altera a Lei n.º 91/2001, de 20 de Agosto, baixasse à comissão
competente, sem votação. Sobre esta matéria, usaram da palavra, a
diverso título, além do Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares e
daquele orador, os Srs. Deputados Guilherme Silva (PSD), Francis-
co Louçã (BE), Bernardino Soares (PCP), João Cravinho (PS) e
Telmo Correia (CDS-PP).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 20 horas e 40 minutos.
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O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum,
pelo que declaro aberta a sessão.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados presentes à sessão:
Partido Social Democrata (PSD):
Abílio Jorge Leite Almeida Costa
Adriana Maria Bento de Aguiar Branco
Álvaro Roque de Pinho Bissaia Barreto
Ana Maria Sequeira Mendes Pires Manso
Ana Paula Rodrigues Malojo
António Alfredo Delgado da Silva Preto
António da Silva Pinto de Nazaré Pereira
António Edmundo Barbosa Montalvão Machado
António Fernando de Pina Marques
António Henriques de Pinho Cardão
António Manuel da Cruz Silva
António Maria Almeida Braga Pinheiro Torres
António Pedro Roque da Visitação Oliveira
Arménio dos Santos
Bernardino da Costa Pereira
Bruno Jorge Viegas Vitorino
Carlos Alberto Rodrigues
Carlos Jorge Martins Pereira
Carlos Manuel de Andrade Miranda
Carlos Parente Antunes
Daniel Miguel Rebelo
Diogo Alves de Sousa de Vasconcelos
Diogo de Sousa Almeida da Luz
Duarte Rogério Matos Ventura Pacheco
Fernando Manuel Lopes Penha Pereira
Fernando Mimoso Negrão
Fernando Pedro Peniche de Sousa Moutinho
Fernando Santos Pereira
Francisco José Fernandes Martins
Gonçalo Dinis Quaresma Sousa Capitão
Gonçalo Miguel Lopes Breda Marques
Gonçalo Trigo de Morais de Albuquerque Reis
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva
Gustavo de Sousa Duarte
Henrique José Monteiro Chaves
Hugo José Teixeira Velosa
Isménia Aurora Salgado dos Anjos Vieira Franco
João Bosco Soares Mota Amaral
João Carlos Barreiras Duarte
João Eduardo Guimarães Moura de Sá
João José Gago Horta
João Manuel Moura Rodrigues
Joaquim Carlos Vasconcelos da Ponte
Joaquim Miguel Parelho Pimenta Raimundo
Joaquim Virgílio Leite Almeida da Costa
Jorge José Varanda Pereira
Jorge Manuel Ferraz de Freitas Neto
Jorge Nuno Fernandes Traila Monteiro de Sá
Jorge Tadeu Correia Franco Morgado
José Alberto Vasconcelos Tavares Moreira
José António Bessa Guerra
José António de Sousa e Silva
José Luís Ribeiro dos Santos
I SÉRIE — NÚMERO 30
José Manuel Álvares da Costa e Oliveira
José Manuel Carvalho Cordeiro
José Manuel de Lemos Pavão
José Manuel Ferreira Nunes Ribeiro
Judite Maria Jorge da Silva
Luís Álvaro Barbosa de Campos Ferreira
Luís Filipe Alexandre Rodrigues
Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves
Luís Manuel Machado Rodrigues
Luís Maria de Barros Serra Marques Guedes
Manuel Alves de Oliveira
Manuel Filipe Correia de Jesus
Manuel Joaquim Dias Loureiro
Manuel Ricardo Dias dos Santos Fonseca de Almeida
Marco António Ribeiro dos Santos Costa
Maria Assunção Andrade Esteves
Maria Aurora Moura Vieira
Maria Clara de Sá Morais Rodrigues Carneiro Veríssimo
Maria da Graça Ferreira Proença de Carvalho
Maria do Rosário da Silva Cardoso Águas
Maria Elisa Rogado Contente Domingues
Maria Eulália Silva Teixeira
Maria Goreti Sá Maia da Costa Machado
Maria Isilda Viscaia Lourenço de Oliveira Pegado
Maria Leonor Couceiro Pizarro Beleza de Mendonça Tavares
Maria Manuela Aguiar Dias Moreira
Maria Natália Guterres V. Carrascalão da Conceição Antunes
Maria Ofélia Fernandes dos Santos Moleiro
Maria Teresa da Silva Morais
Maria Teresa Pinto Basto Gouveia
Melchior Ribeiro Pereira Moreira
Miguel Fernando Alves Ramos Coleta
Paulo Jorge Frazão Batista dos Santos
Pedro do Ó Barradas de Oliveira Ramos
Pedro Filipe dos Santos Alves
Pedro Miguel de Azeredo Duarte
Rodrigo Alexandre Cristóvão Ribeiro
Rui Manuel Lobo Gomes da Silva
Rui Miguel Lopes Martins de Mendes Ribeiro
Salvador Manuel Correia Massano Cardoso
Sérgio André da Costa Vieira
Vasco Manuel Henriques Cunha
Vítor Manuel Roque Martins dos Reis
Partido Socialista (PS):
Aires Manuel Jacinto de Carvalho
Alberto de Sousa Martins
Alberto Marques Antunes
Ana Maria Benavente da Silva Nuno
Antero Gaspar de Paiva Vieira
António Alves Marques Júnior
António Bento da Silva Galamba
António de Almeida Santos
António Fernandes da Silva Braga
António José Martins Seguro
António Luís Santos da Costa
Artur Miguel Claro da Fonseca Mora Coelho
Artur Rodrigues Pereira dos Penedos
Ascenso Luís Seixas Simões
Augusto Ernesto Santos Silva
Carlos Manuel Luís
10 DE JULHO DE 2002
Edite Fátima Santos Marreiros Estrela
Eduardo Arménio do Nascimento Cabrita
Eduardo Luís Barreto Ferro Rodrigues
Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira
Fausto de Sousa Correia
Fernando dos Santos Cabral
Fernando Manuel dos Santos Gomes
Fernando Pereira Serrasqueiro
Francisco José Pereira de Assis Miranda
Guilherme Valdemar Pereira d’Oliveira Martins
Jamila Bárbara Madeira e Madeira
João Cardona Gomes Cravinho
João Rui Gaspar de Almeida
Joaquim Augusto Nunes Pina Moura
Jorge Lacão Costa
Jorge Manuel Gouveia Strecht Ribeiro
Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho
José Adelmo Gouveia Bordalo Junqueiro
José Alberto Sequeiros de Castro Pontes
José António Fonseca Vieira da Silva
José Apolinário Nunes Portada
José Augusto Clemente de Carvalho
José Carlos Correia Mota de Andrade
José Eduardo Vera Cruz Jardim
José Manuel Santos de Magalhães
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa
Júlio Francisco Miranda Calha
Laurentino José Monteiro Castro Dias
Leonor Coutinho Pereira dos Santos
Luís Afonso Cerqueira Natividade Candal
Luís Alberto da Silva Miranda
Luís Manuel Capoulas Santos
Luís Manuel Carvalho Carito
Luiz Manuel Fagundes Duarte
Manuel Alegre de Melo Duarte
Manuel Maria Ferreira Carrilho
Manuel Pedro Cunha da Silva Pereira
Maria Celeste Lopes da Silva Correia
Maria Custódia Barbosa Fernandes Costa
Maria de Belém Roseira Martins Coelho Henriques de Pina
Maria do Carmo Romão Sacadura dos Santos
Maria Isabel da Silva Pires de Lima
Maria Manuela de Macedo Pinho e Melo
Maximiano Alberto Rodrigues Martins
Miguel Bernardo Ginestal Machado Monteiro Albuquerque
Nelson Madeira Baltazar
Osvaldo Alberto Rosário Sarmento e Castro
Paula Cristina Ferreira Guimarães Duarte
Paulo José Fernandes Pedroso
Renato Luís de Araújo Forte Sampaio
Ricardo Manuel Ferreira Gonçalves
Rosa Maria da Silva Bastos da Horta Albernaz
Rosalina Maria Barbosa Martins
Rui António Ferreira da Cunha
Rui do Nascimento Rabaça Vieira
Vicente Jorge Lopes Gomes da Silva
Victor Manuel Bento Baptista
Vitalino José Ferreira Prova Canas
Vítor Manuel Sampaio Caetano Ramalho
Zelinda Margarida Carmo Marouço Oliveira Semedo
Partido Popular (CDS-PP):
Acílio Domingues Gala
António Herculano Gonçalves
Diogo Nuno de Gouveia Torres Feio
Henrique Jorge Campos Cunha
Isabel Maria de Sousa Gonçalves dos Santos
João Guilherme Nobre Prata Fragoso Rebelo
João Nuno Lacerda Teixeira de Melo
João Rodrigo Pinho de Almeida
Manuel de Almeida Cambra
Narana Sinai Coissoró
Pedro Manuel Brandão Rodrigues
Partido Comunista Português (PCP):
António Filipe Gaião Rodrigues
António João Rodeia Machado
Bernardino José Torrão Soares
Bruno Ramos Dias
Carlos Alberto do Vale Gomes Carvalhas
Jerónimo Carvalho de Sousa
José Honório Faria Gonçalves Novo
Lino António Marques de Carvalho
Maria Luísa Raimundo Mesquita
Maria Odete dos Santos
Bloco de Esquerda (BE):
Francisco Anacleto Louçã
João Miguel Trancoso Vaz Teixeira Lopes
Luís Emídio Lopes Mateus Fazenda
Partido Ecologista «Os Verdes» (PEV):
Heloísa Augusta Baião de Brito Apolónia
Isabel Maria de Almeida e Castro
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Secretário
vai ler o expediente.
O Sr. Secretário (Duarte Pacheco): — Sr. Presidente e
Srs. Deputados, deram entrada na Mesa, e foram admiti-
das, as seguintes iniciativas legislativas: projecto de lei n.º
108/IX — Estabelece um novo regime jurídico de protec-
ção dos animais (PS), que baixou à 1.ª Comissão, e o pro-
jecto de resolução n.º 43/IX — Comissão Parlamentar de
Inquérito à Tragédia de Camarate (PSD, PS e CDS-PP).
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a ordem do dia
de hoje é preenchida na íntegra pelo debate sobre o estado
da Nação.
Assim, para proceder à intervenção de abertura do de-
bate, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro, que dispõe de
45 minutos.
O Sr. Primeiro-Ministro (Durão Barroso): — Sr. Pre-
sidente, Sr.as e Srs. Deputados: Para sabermos para onde
vamos é conveniente sabermos de onde partimos.
Ao fazer a apresentação do Programa do Governo nesta
Assembleia afirmei expressamente: «Portugal atravessa
um dos momentos mais difíceis da sua história democráti-
ca. Vivemos uma crise de confiança, uma crise de valores,
uma crise de autoridade e uma gravíssima crise orçamental
e financeira. Durante anos, o País andou a viver acima das
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I SÉRIE — NÚMERO 30
suas possibilidades, gastou o que tinha e, sobretudo o que
não tinha, porque o Governo prometeu tudo a todos, sem
regra e sem critério». Foi isto que vos disse aqui, no pas-
sado dia 17 de Abril. Este era, sem dúvida, o diagnóstico
preocupante da situação do País, feito com verdade e as-
sumido sem demagogias.
Um diagnóstico que, com muita frequência, entidades
idóneas, credíveis e independentes — cá dentro e lá fora
— vinham a confirmar e a reforçar. Um diagnóstico que,
apesar dos sistemáticos sinais de alarme e das constantes
chamadas de atenção, os anteriores responsáveis governa-
tivos sistematicamente desvalorizaram.
Herdámos, assim, uma situação particularmente difí-
cil, com um défice orçamental galopante, desequilíbrios
externos incomportáveis, ausência de investimento, um
Estado que se transformou num peso morto para a eco-
nomia e num factor de asfixia para a livre iniciativa dos
portugueses.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Governar é decidir. E não perdemos
tempo a decidir. A decidir, desde logo, uma estratégia
capaz de fazer frente à difícil situação do País.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Essa estratégia assentou, e assenta, em
três eixos essenciais: primeiro, rigor orçamental e sanea-
mento das finanças públicas; segundo, incentivo à produ-
tividade e ao crescimento da economia; terceiro, realiza-
ção de reformas de fundo há muito reclamadas mas sem-
pre adiadas. Esta era, e é, a estratégia. Cumprimo-la com
rigor, vamos continuar a fazê-lo com firmeza, com cora-
gem, sempre, e, cada vez mais, com coragem e com
determinação.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O saneamento das finanças públicas era, e é, a priori-
dade mais urgente, particularmente até 2004. Portugal tem
de disciplinar as suas finanças e cumprir o Pacto de Estabi-
lidade e Crescimento que firmou na União Europeia.
Nenhuma economia pode crescer e desenvolver-se
com um Estado despesista e perdulário. O Estado tem de
ser um factor de dinamismo e não um travão à iniciativa
individual.
O Orçamento rectificativo, que rapidamente fizemos
aprovar nesta Assembleia, foi, nesse quadro, a primeira
decisão essencial para colocar verdade nas contas do
Estado.
Sem contas públicas em ordem, Portugal não tem cre-
dibilidade e sem credibilidade não conseguimos ter
sucesso.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Credibilidade, Sr. Presidente e Srs.
Deputados, é a palavra-chave para o nosso sucesso colec-
tivo.
Estamos já a dar os primeiros passos — e sublinho «os
primeiros» — para reganhar a credibilidade perdida e
transmitir uma nova confiança aos investidores, nacionais
e estrangeiros.
Conhecemos as dificuldades, mas não vamos abrandar
o passo. O próximo ano, 2003, será o ano decisivo. Por
isso, o Orçamento do Estado para 2003, já em preparação,
não se desviará em nada dos princípios de rigor e de exi-
gência que traçámos.
Os portugueses sabem bem que o País não pode viver
acima das suas possibilidades, endividar-se permanente-
mente, gastar o que tem e o que não tem, alimentar vícios
antigos e despesas supérfluas, quando faltam recursos para
investir em obras essenciais e meios financeiros indispen-
sáveis à promoção de maior justiça social.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Esta orientação é essencial para construir um ambiente
de confiança, porque a confiança constrói-se com atitudes
sérias e decisões responsáveis, não com discursos retóricos
ou inflamados. O novo ambiente de confiança que estamos
a construir é essencial para Portugal ganhar produtividade
e competitividade. Esta é a nossa batalha fundamental e
dela não fugimos, dela não fugiremos.
Daí, Sr. Presidente, Srs. Deputados, o segundo eixo da
nossa estratégia governativa, apostar no aumento da produ-
tividade e no crescimento da nossa economia.
Também aqui o Governo não perdeu tempo. Fomos
céleres a aprovar o Programa para a Produtividade e o
Crescimento, dirigido ao relançamento da actividade eco-
nómica, ao reforço da concorrência saudável, ao fomento
do investimento produtivo, à revitalização do tecido em-
presarial. Este programa tem vários méritos e foi, desde
logo, muito bem recebido pela comunidade empresarial.
Mas há aqui uma orientação nova e essencial: incenti-
var as nossas empresas para o mercado das exportações.
A reserva fiscal de investimento que vai ser criada, par-
ticularmente para as empresas exportadoras, não é uma
medida de circunstância. É o sinal de uma aposta séria
num novo modelo de desenvolvimento, assente no inves-
timento e no aumento das exportações, essencial para que
as nossas empresas ganhem novas quotas de mercado,
tornando-se mais produtivas e com maior competitividade.
Desde a adesão à Comunidade Europeia, o peso das
exportações portuguesas de bens e serviços no produto
interno bruto aumentou apenas de cerca de 29,5% para
cerca de 32,5%. No mesmo período, aquele rácio passou,
na Finlândia, de 26,5% para 41%, na Holanda, de 51%
para 66% e, na Irlanda, de 51% para 95%, o que demons-
tra bem a necessidade de promover e estimular o investi-
mento por parte das empresas exportadoras. Daí o acento
tónico que estamos a colocar nesta área da nossa econo-
mia.
Mas também não esquecemos o contributo decisivo do
investimento público, cuja retoma importa garantir susten-
tadamente.
Transmitimos aos agentes económicos essa mensagem
de confiança e de aposta no futuro. Por isso, tive oportuni-
dade de anunciar, há alguns dias atrás, um programa espe-
cial de obras públicas, abrangendo, por um lado, a acelera-
10 DE JULHO DE 2002
ção de várias obras e, por outro, o lançamento de novos e
importantes projectos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Contudo, não nos ficamos por aqui no
nosso objectivo de revitalizar a economia e de modernizar
o País. Daí que, já no próximo mês de Outubro, iremos
proceder à apresentação de um vasto programa de investi-
mentos em obras públicas, com particular incidência no
domínio das vias de comunicação.
A nossa aposta no investimento reprodutivo é mesmo
para levar a sério. Portugal precisa de crescer e de progre-
dir, rumo este de que também não abdicaremos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O terceiro eixo da estratégia do Governo é o das refor-
mas estruturais.
Também aqui devemos ser claros. Fomos eleitos para
gerir melhor os recursos públicos, mas, sobretudo, fomos
mandatados para ajudar a mudar estruturalmente o Estado
e a sociedade portugueses.
Portugal precisa de atacar os problemas nas suas causas
estruturais e não apenas minorar os seus efeitos ou conse-
quências. Neste plano, o balanço é inequívoco — em três
meses, foram aprovadas mais reformas do que nos últimos
três anos. É o sinal da nova atitude reformadora que culti-
vamos.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Estão neste caso a criação do rendimen-
to social de inserção, que põe fim à lógica da subsídio-
dependência que caracterizava o rendimento mínimo
garantido…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Risos do PS.
… e coloca o acento tónico na inserção social e no exercí-
cio pleno da cidadania. Queremos ajudar as pessoas a
saírem da pobreza e não queremos condená-las à depen-
dência do Estado e a manterem-se eternamente nessa
mesma pobreza.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Com a proposta de lei de bases da segurança social pre-
tende-se assegurar, nomeadamente, a sustentabilidade
financeira do sistema público de segurança social e a liber-
dade de escolha dos cidadãos, como acontece, aliás, em
toda a Europa mais desenvolvida. O que não compreendo,
Srs. Deputados, é como é que alguns dos Deputados da
oposição falam tanto no modelo social europeu mas, de-
pois, procuram combater o Governo quando este, ao fim e
ao cabo, procura concretizar e consagrar, em Portugal, o
modelo social europeu, que é o que queremos desenvolver
e aprofundar no nosso país.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Ao novo sistema de gestão hospitalar presidem preocu-
pações de rigor e de eficácia no funcionamento do Serviço
Nacional de Saúde, que este Governo está determinado a
salvar.
O regime jurídico das parcerias público/privadas na sa-
úde é um instrumento decisivo para dotar o País de uma
rede de unidades hospitalares capazes de atender à satisfa-
ção das necessidades dos doentes.
O Estatuto do Aluno do Ensino Não Superior institui
mecanismos de responsabilização dos alunos e de reforço
da autoridade dos professores, assim contribuindo para a
indispensável estabilidade do meio escolar.
Com a Lei de Desenvolvimento e Qualidade no Ensino
Superior pretende-se pôr fim à situação anárquica que se
vive no ensino universitário e politécnico, garantindo o
valor dos nossos diplomas, permitindo às nossas institui-
ções e aos nossos diplomados concorrer com os seus con-
géneres internacionais.
A reforma da acção executiva dará um contributo es-
sencial à normalização do funcionamento dos tribunais e
ao reforço da confiança dos agentes económicos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — A lei da imigração introduz critérios de
rigor na admissão de novos imigrantes, garantindo, em
simultâneo, condições para a sua plena integração na soci-
edade portuguesa.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Srs. Deputados da oposição, confessem
que, em três meses, não esperavam tanta iniciativa, tanta
actividade, tanta capacidade reformadora do Governo!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Risos do PS.
O Sr. José Magalhães (PS): — Não está nada aprova-
do, mas é giro! Está tudo na generalidade!
O Orador: — Mas, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputa-
dos, em particular Srs. Deputados da oposição, quero ga-
rantir-vos que não vamos dar-vos tempo para descansar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Risos do PS.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quero anunciar
hoje, perante esta Câmara, que as reformas irão continuar.
O Sr. José Magalhães (PS): — É surpreendente!
O Orador: — Assim, até ao final do corrente mês de
Julho, o Governo aprovará três novas reformas essenciais
no domínio do trabalho, da justiça e da organização e
administração do Estado: reforma da legislação laboral,
privatização do notariado e descentralização do Estado.
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I SÉRIE — NÚMERO 30
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PCP: — Ah!
O Orador: — A reforma da legislação laboral é essen-
cial. Portugal tem as leis laborais mais rígidas de toda a
União Europeia.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Esta rigidez não promove nem o inves-
timento, nem a criação de emprego, nem a competitividade
da economia. Mais: esta rigidez é contra o próprio interes-
se dos trabalhadores portugueses.
Protestos do PCP.
Srs. Deputados do Partido Comunista, os trabalhadores
portugueses não comem ideologia, os trabalhadores portu-
gueses precisam de ter um sistema mais competitivo, mais
flexível para, assim, garantirem a produtividade das
empresas, porque eles são os primeiros interessados na
produtividade e na competitividade da nossa economia.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Isso é conversa!
O Orador: — Por isso, a orientação da reforma a em-
preender será muito clara. Ela vai abranger a flexibilidade
da organização do tempo de trabalho,…
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Claro!
O Orador: — … a mobilidade funcional e geográfica
dos trabalhadores, o regime da isenção do horário de traba-
lho, a utilização de novas tecnologias, o regime de comis-
são de serviço, os acidentes de trabalho, o regime de férias
e faltas, os contratos a prazo.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Claro!
O Orador: — Para nós, Srs. Deputados, o direito ao
trabalho é correlativo do dever de trabalhar e de contribuir
para o progresso do nosso país.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): — Há trabalhadores com
os salários em atraso, como os da OGMA!
O Orador: — Sejamos claros: ao contrário do que
mentirosamente dizem algumas forças da oposição, não se
trata de liberalizar os despedimentos — não o faremos.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Já não é preciso!
O Orador: — Trata-se, sim, de criar as condições para
mais e melhor trabalho, mais e melhor produtividade, mais
e melhor investimento, mais e melhor emprego. Essa é a
nossa aposta e dela não vamos abdicar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — É o paraíso social!
O Orador: — Idêntica preocupação de modernidade
orientará a privatização do notariado.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): — Como dá lucro ao Esta-
do, privatiza-se!
O Orador: — É outra reforma indispensável às pes-
soas e às empresas.
Portugal precisa de serviços notariais mais rápidos e
mais baratos. O regime de monopólio actualmente existen-
te perdeu sentido. Torna-se indispensável introduzir um
regime concorrencial.
As ideias centrais do regime que vamos introduzir no
notariado são claras. A actividade notarial passará a ser
exercida em regime de profissão liberal, de forma aberta,
livre e concorrencial, competindo ao Estado a função regu-
ladora e fiscalizadora que garanta sempre o primado da
legalidade e da qualidade.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Por fim, o Governo tomará, em breve,
um outro vasto conjunto de decisões em matéria de des-
centralização, que permitirá transformar o paradigma tra-
dicional da relação entre o Estado central e o poder local.
É um imperativo nacional combater o centralismo bu-
rocrático que dificulta a vida dos cidadãos e impede a
resolução atempada dos seus problemas.
É tempo de dar combate sem tréguas às disparidades de
desenvolvimento que, nos últimos anos, se agravaram
progressivamente e têm a sua expressão mais dramática na
desertificação de vastas zonas do interior do País.
Para inverter esta situação, o Governo porá em prática
um programa ambicioso, articulado em torno de quatro
eixos fundamentais.
Em primeiro lugar, promoção do surgimento de novas
áreas metropolitanas capazes de impulsionar o desenvol-
vimento social, económico e cultural das populações
abrangidas.
Em segundo lugar, democratização e agilização opera-
cional das CCR (Comissões de Coordenação Regional),
alterando a sua estrutura orgânica e alargando as respecti-
vas atribuições.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Em terceiro lugar, transferência de com-
petências dos governadores civis para as autarquias locais,
em matérias consultivas, de financiamento, de manutenção
da ordem e tranquilidade públicas e de licenciamento de
actividades diversas.
Em quarto lugar, atribuição de novas competências às
autarquias locais, nomeadamente no domínio da saúde, da
educação, do ambiente e ordenamento do território, da
cultura, da habitação ou da economia.
10 DE JULHO DE 2002
Quero dizer-vos, Srs. Deputados, que acredito mesmo
no princípio da subsidiariedade e estou seguro que, com o
vosso apoio, esta legislatura ficará marcada por uma das
mais substanciais reformas desde o 25 de Abril, que é, de
facto, a de acabarmos com o paradigma centralista, apos-
tando na descentralização e no poder local no nosso país.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Todas estas reformas, Sr. Presidente e Srs. Deputados,
têm um objectivo central — o aumento da competitividade
da nossa economia. Este é o objectivo central das medidas
estruturais, das medidas macroeconómicas e das medidas
microeconómicas.
Portugal tem de ser um país competitivo. Mas Portugal
não é, ainda hoje, um país suficientemente atractivo para
os investidores.
Ainda há pouco, foi editada a lista do ambiente de
negócios, classificação promovida pela Economist Intelli-
gence Unit, uma das mais prestigiadas publicações neste
domínio, em que Portugal aparece em 23.º lugar, tendo
atrás de nós, no quadro europeu, apenas a Grécia. Nos
primeiros lugares surgem países como a Holanda, o Cana-
dá e a Finlândia. Não é um facto surpreendente.
Já no relatório sobre a competitividade do Fórum Eco-
nómico Mundial, de 2001, Portugal aparece na 31.ª primei-
ra posição, atrás, por exemplo, da Estónia e da Hungria.
Esta tabela revela, ainda, um facto inédito: a Finlândia
aparece como o país mais competitivo do mundo. A Fin-
lândia, país que, ainda há poucos anos, estava todo virado
para o mercado da ex-União Soviética e que, em poucos
anos, conseguiu reestruturar fundamentalmente a sua eco-
nomia. Os indicadores deste relatório permitem, aliás,
concluir que aquele país tem grandes probabilidades de se
manter no topo da lista nos próximos anos. Ora, isto acon-
tece porquê? Porque foram implementadas políticas e
reformas adequadas, levadas a cabo com persistência e
determinação.
Se outros já o fizeram, também nós seremos capazes de
o fazer.
Os exemplos citados comprovam, aliás, que políticas
adequadas e determinação na sua aplicação podem superar
desvantagens aparentes, como a dimensão do mercado ou a
localização periférica. Não serão a Finlândia, a Islândia ou
a própria Irlanda mais periféricas do que Portugal? Se eles
conseguiram desenvolver-se, por que razão não consegui-
remos nós fazer o mesmo ou melhor? Acredito que somos
capazes de fazer tão bem ou melhor do que aqueles nossos
parceiros.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O próximo alargamento da União Europeia ainda não
foi suficientemente ponderado no nosso país. Recentemen-
te, através de um inquérito aos empresários, constatei que a
esmagadora maioria dos empresários portugueses ainda
não ponderou suficientemente as consequências e as opor-
tunidades que o alargamento da União Europeia pode
trazer.
Este próximo alargamento vai colocar-nos perante um
desafio decisivo. Vencer esse desafio está, ainda, nas nos-
sas mãos. Mas, para isso, é urgente mudar o nosso modelo
de desenvolvimento.
Encontramo-nos perante uma oportunidade — porven-
tura, a última — de alterar o padrão de especialização da
economia portuguesa. Este Governo aposta num modelo
de produção assente na qualidade e sempre na criação de
maior valor acrescentado, no abandono, gradual mas firme,
do modelo tradicional de competição exclusivamente vira-
do para o preço, assente na baixa qualificação da mão-de-
obra e nos baixos salários.
Por isso, definimos, pela primeira vez, um conjunto co-
erente de políticas, simultaneamente nos domínios das
finanças públicas, da microeconomia e das reformas estru-
turais, mobilizando todos os instrumentos disponíveis a
nível nacional e concentrando a sua aplicação num espaço
de tempo bastante curto.
As dificuldades que enfrentamos são reais e não podem
ser desvalorizadas, mas a verdade é que essas dificuldades
criam também uma grande oportunidade: obrigam-nos a
ter sucesso. Existe, hoje, uma grande oportunidade de
mudança e de recuperação do tempo perdido. Hoje, não
temos alternativa que não seja a de fazer bem e depressa.
Quero dizer-vos que estou certo de que vamos vencer mais
este desafio, porque acredito na energia e na capacidade
dos trabalhadores e dos empresários portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Queremos um
País mais rico para podermos ter uma sociedade mais justa.
Para nós, o crescimento económico, mais do que um objec-
tivo, é um instrumento, um instrumento para maior justiça
social.
Falar de justiça social é, desde logo, falar de saúde e de
solidariedade social.
A actual situação da saúde em Portugal é um flagelo.
Um flagelo sobretudo para os mais pobres da nossa socie-
dade, para os que esperam e desesperam na busca de uma
consulta ou de uma operação, para os que não encontram
ainda nos serviços de saúde a resposta pronta e humaniza-
da a que têm direito.
Temos a consciência de que esta situação não se muda
de um dia para o outro. Mas temos também a certeza de
que é preciso agir depressa, porque temos pressa de mudar
o actual estado de coisas.
Portugal tem um problema estrutural: as intermináveis
listas de espera. Ora, para um problema extraordinário,
uma solução de emergência; por isso, o Governo aprovou
já um programa, em dois anos, de combate às listas de
espera nos nossos hospitais.
Portugal tem um problema crónico: uma gestão buro-
crática e despesista dos seus hospitais. Para um problema
crónico, uma solução corajosa; por isso, o Governo apro-
vou já um novo modelo de gestão dos nossos hospitais,
que vai permitir maior rapidez, prontidão e eficácia no
funcionamento das nossas unidades de saúde.
Portugal tem um problema grave: a falta de hospitais
e a sua desadequada distribuição. Para um problema
grave, uma solução inovadora; por isso, o Governo apro-
vou, em regime de parceria com entidades privadas e
sociais, um ambicioso programa de construção de 10
8
I SÉRIE — NÚMERO 30
novos hospitais, cinco dos quais serão lançados já no
início do próximo ano.
É assim, com decisões concretas, e não com meros dis-
cursos, que se constrói, dia-a-dia, mais justiça social.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Tenho orgulho
em chefiar um Governo que acaba de aprovar uma reforma
de incontornável alcance social, a reforma em que o Esta-
do assume expressamente o compromisso da convergência
das pensões mínimas com o salário mínimo nacional.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — É falso!
O Orador: — É um compromisso solene que se con-
sagra na nova Lei de Bases da Segurança Social.
O Sr. Lino de Carvalho (PCP): — É falso!
O Orador: — Num prazo de quatro anos, as pensões
mínimas de invalidez e velhice do regime geral passam a
ser fixadas, tendo em conta as carreiras contributivas, entre
65% e 100% do salário mínimo nacional.
Estes aumentos constituem o maior esforço financeiro
do Estado para melhorar as condições de vida dos refor-
mados portugueses, depois da introdução, há mais de uma
década, do 14.º mês no pagamento de pensões. A preços
de 2002, este esforço representará um encargo de 77
milhões de contos.
Com esta decisão, os reformados e pensionistas portu-
gueses, em particular os mais carenciados e vulneráveis,
terão a certeza de uma forte actualização das suas pensões
de reforma.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
É um esforço notável de solidariedade que o Estado vai
fazer para que a justiça social deixe de ser uma figura de
retórica e se assuma como pressuposto e condição da dig-
nidade da pessoa humana. Este objectivo da justiça social
é, e será sempre, o mais importante objectivo da nossa
acção governativa.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É também uma preocu-
pação social que nos leva a ser implacáveis no combate à
fraude e à evasão fiscais.
Não vemos os impostos apenas como uma fonte — in-
dispensável — de receita do Estado mas igualmente (para
além de um factor de competitividade com o exterior)
como um instrumento de justiça social, por via da sua
função de redistribuição da riqueza.
Não é mais tolerável aquilo a que vimos assistindo,
com muitos dos que podem a não pagar o que devem,
obrigando outros a pagar o que não podem.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Governo não pactuará com esta situação. Por isso,
independentemente de intervenções a nível legislativo que
venham a justificar-se, foi anunciada e está já em aplicação
uma operação especial de combate à fraude e à evasão
actual?!
fiscais. Dentro de algum tempo espero poder examinar
convosco os resultados, nesta Câmara.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados:
Os esforços que hoje estamos a fazer não são esforços em
vão. Eles vão traduzir-se, num prazo de dois anos, em mais
emprego para os jovens, em melhores salários para os
trabalhadores, em pensões mais elevadas para os reforma-
dos e numa redução da carga fiscal.
Tenho a certeza de que este é um esforço necessário,
mas um esforço que tem de ser partilhado por todos —
Estado e cidadãos, empresários e trabalhadores, Governo e
oposição.
É este propósito, de partilha solidária de esforços e
responsabilidades entre todos os sectores do Estado, que
levou o Governo a apresentar a esta Câmara uma lei de
estabilidade orçamental. Espero que o sentido de Estado
e a noção do superior interesse do País sejam mais fortes
que quaisquer interesses partidários, particulares ou cor-
porativos.
É que está em causa não apenas o indispensável — e,
sublinho, indispensável — equilíbrio das contas públicas
mas igualmente a credibilidade externa, o cumprimento de
compromissos internacionais que temos de honrar. E quero
crer que ninguém vai querer ficar de fora deste dever pa-
triótico de defender o nome de Portugal perante os nossos
parceiros europeus.
Aquilo que está em causa, meus senhores, é a honra de
Portugal e nós não podemos falhar aos compromissos que
assumimos com a União Europeia. Por isso, é necessária e
indispensável esta lei de estabilidade orçamental.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Queremos, contudo, ir mais longe.
O Governo atribui uma particular importância à con-
certação social. Acredito nas virtualidades do diálogo
social. Acredito que trabalhadores e empresários são os
primeiros a compreender que a estabilidade social e a par-
tilha de responsabilidades só ajudam a um processo mais
rápido e mais sólido de crescimento e desenvolvimento.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Mas você só quer
tramar uma parte!
O Orador: — Acredito que a estabilidade das expecta-
tivas constitui também um importante factor para a con-
fiança dos agentes económicos. Neste sentido, quero aqui
anunciar-vos, hoje, que o Governo vai propor a todos os
parceiros sociais a celebração de um acordo social de
médio prazo que abranja, designadamente, as seguintes
matérias: política de rendimentos e produtividade; política
de emprego e formação profissional; política fiscal e tam-
bém política de segurança social.
O Sr. José Magalhães (PS): — Que tal cumprir o
10 DE JULHO DE 2002
O Orador: — Este acordo social — com um prazo mí-
nimo de vigência de quatro anos — permitirá estabelecer
regras de partilha dos esforços que a todos são exigíveis,
nestes próximos dois anos, com a certeza de que, logo nos
dois anos seguintes, todos começarão a partilhar dos bene-
fícios que, em conjunto, iremos obter.
Tenho a certeza de que os parceiros sociais, contra a
opinião de alguns políticos que pensam no seu próprio
interesse mas não no interesse dos trabalhadores, com-
preendem a justeza desta proposta e a urgência da sua
concretização.
O Governo, pelo seu lado, tudo fará para que este acor-
do social venha a ser uma realidade.
Não receamos a conflitualidade social, mas sabemos
que ela não conduz a lado algum. Nas condições actuais do
nosso país, só poderia trazer-nos mais, e muito mais sérios,
problemas.
O caminho é o da concertação, o caminho é o do diálo-
go, o caminho é o do compromisso social. Aqueles que
faltarem à chamada, faltarão à chamada perante Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Sabemos que o
tempo é escasso para o muito que temos de fazer. Por isso,
não perdemos tempo. Temos pressa, porque também os
portugueses têm pressa.
Em três meses, o País já compreendeu que este Gover-
no tem uma nova atitude política.
Risos do PS.
Vozes do PS: — Pois já! É verdade!
O Orador: — É um Governo com desígnios, com es-
tratégia e com vontade.
Risos do PS.
Um Governo que substituiu o adiamento pela cultura
da decisão.
O Sr. José Magalhães (PS): — E da trapalhada!
O Orador: — Um Governo que não vacila face aos
interesses instalados.
O Sr. António Costa (PS): — Serve-os!
O Orador: — Um Governo que não hesita nem recua
perante os problemas e as dificuldades.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Risos do PS.
É que as dificuldades realmente existem e, ao contrário
de outros, não vamos escamoteá-las.
Já há alguns anos que vínhamos alertando para as con-
sequências negativas que a política seguida viria a ter em
termos de confiança.
A interrupção da legislatura, a crise política gerada pela
demissão do anterior governo, que pôs durante quase cinco
meses o País entre parêntesis,…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Muito bem!
O Orador: — … a falta de credibilidade da anterior
política orçamental, a falsidade dos dados publicamente
revelados,…
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — … tudo isso teve, naturalmente, efeitos
devastadores sobre a confiança dos cidadãos.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Exactamente!
O Orador: — E esta situação não pode evidentemente
inverter-se de um dia para o outro.
Mas, atenção, este é o caminho! Este é o caminho: falar
com verdade; decidir com coragem; executar com deter-
minação. Este é o caminho, Sr.as e Srs. Deputados!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A propósito de confiança, a confiança não se constrói
com encenações artificiais ou discursos desfasados da
realidade. A credibilidade é o caminho, em linha recta,
para a confiança. Não se espere de mim ou deste Governo
efeitos fáceis ou declarações de mera conveniência mediá-
tica. O País já sabe os custos de uma política de ilusões e
está ainda a pagar um preço muito elevado por causa dessa
política de «vendedores de ilusões» e de promessas que
não foram capazes de cumprir.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Há que inverter este estado de coisas! Nesta ocasião,
quero dizer-vos que estou seguro, absolutamente seguro,
de que não há outro caminho e de que será assim que os
portugueses voltarão a confiar e que Portugal será olhado
com cada vez maior respeito.
O conjunto coerente e articulado de políticas que defi-
nimos dá-nos razões para encarar o futuro com esperança e
confiança. Os portugueses já demonstraram que, em cada
dificuldade, há também um desafio.
Deixem-me dizer-vos, Srs. Deputados, num registo
pessoal, que cada crítica, justa ou injusta, só me estimula,
cada dificuldade só me anima, e que a vossa oposição me
dá cada vez mais força para levar a cabo este nosso pro-
grama.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PS: — Ah! Assim é que é! Esse é que é o
caminho! Força!
O Orador: — Este desafio que temos pela frente, que
o nosso país tem pela frente, é um desafio que estimula os
portugueses para novas realizações.
Esta é uma grande oportunidade, uma oportunidade
que o nosso país não vai desperdiçar.
10
I SÉRIE — NÚMERO 30
Estou certo, estou seguro, de que não podemos falhar,
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — É preciso
não falharemos. A bem de Portugal!
ter «lata»!
O Orador: — O que se passou ao longo destes três
meses faz com que o País, que tinha efectivamente difi-
culdades e uma crise orçamental, esteja à beira de uma
crise económica, de que os senhores são os principais
responsáveis.
Aplausos do PS.
Mais: para quem, durante tanto tempo, deste lado, falou
das divergências existentes entre as projecções e as reali-
dades, que dizer de, ao fim de dois meses, terem vindo
aqui apresentar projecções, para este ano de 2002, de cres-
cimento económico e de investimento que foram desmen-
tidas pelo Banco de Portugal,…
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — … desmentidas pela prática política que
este Governo tem tido e que transforma problemas orça-
mentais numa gravíssima recessão económica, com conse-
quências graves para Portugal e para os portugueses?
Aplausos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, agora, o seu Governo transfor-
mou-se num governo de políticas especiais — é uma espé-
cie de «Governo especial» cheio de ideias gerais! Apresen-
tou um programa especial de obras públicas, uma acção
especial de combate à fraude e evasão fiscais. Antes con-
vinha que cumprissem o que estava aprovado, tanto do
lado do investimento público como do lado do combate à
fraude e evasão fiscais. Isso seria bastante melhor do que
essas operações «especiais» que são meras mistificações!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
«Mais rentável para os políticos é a apresentação de
novos projectos e o lançamento de grandes obras públicas,
o que, certamente, é publicitado pelos meios de comunica-
ção social, do que promover a execução e a administração
eficientes de programas públicos, o que não atrai a atenção
dos jornalistas». Quem o disse, e muito bem, foi o Prof.
Cavaco Silva. E, como se está a demonstrar, o «aluno»
seguiu o «mestre»!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
Em relação ao combate à fraude fiscal, pergunto se os
senhores estão dispostos a agendar, para amanhã, o projec-
to de lei do PS sobre eficácia fiscal, já que impediram que
o mesmo fosse debatido nesta Assembleia. É muito mais
importante aprovar esse projecto de lei do que realizar
50 000 operações especiais, dirigidas pelo Ministério das
Finanças!
Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.
O Sr. Presidente: — Foram numerosos os Srs. Depu-
tados que se inscreveram para formular pedidos de escla-
recimento ao Sr. Primeiro-Ministro. Dar-lhes-ei a palavra
pela ordem estabelecida.
Em primeiro lugar, tem a palavra, por 5 minutos, o Sr.
Deputado Eduardo Ferro Rodrigues.
O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presi-
dente, Srs. Deputados: Quando as notícias sobre o presente
não são boas, não há nada como prometer «amanhãs que
cantam». Essa é uma prática normal em várias bancadas.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Esta intervenção do Sr. Primeiro-Ministro tem vários
erros de facto sobre o passado, na medida em que veio
aqui dizer-nos que já fizeram várias reformas de fundo, a
maior parte das quais, porém, não foi sequer discutida, na
especialidade, na Assembleia da República, nem alvo de
qualquer votação. É assim que se vê a consideração que o
Governo tem pela Assembleia da República:…
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — É muito
mais do que vocês tiveram!
O Orador: — … toma como reformas de fundo diplo-
mas apenas aprovados pelo Governo como propostas de
lei, que não foram aqui votadas na Assembleia da Repúbli-
ca, como é o caso do rendimento social de inserção, da lei
de bases da segurança social e de várias outras aqui men-
cionadas.
Aplausos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, há uma coisa em que lhe dou
toda a razão: em três meses, o Sr. Primeiro-Ministro e o
seu Governo fizeram mais do que nós fizemos em três
anos. Fez mais trapalhadas, fez mais inconstitucionalida-
des e fez mais processos políticos de desprezo pelo papel
dos Deputados e da Assembleia da República. Sobre isso,
não há dúvidas!
Aplausos do PS.
O Sr. Primeiro-Ministro não relembrou na sua inter-
venção a célebre frase proferida no primeiro debate sobre
o estado da Nação: «O País está de tanga!» É que foi com
essa frase que os senhores trabalharam durante estes três
meses para apresentar uma realidade, que, então, não cor-
respondia àquilo que estavam a dizer dessa mesma reali-
dade.
Vozes do PS: — Muito bem!
10 DE JULHO DE 2002
O Sr. José Magalhães (PS): — Muito bem!
O Orador: — Quanto à lei da estabilidade orçamental,
nós queremos uma boa lei, uma lei que permita uma soli-
dariedade nacional no combate ao défice mas que se tradu-
za também no arranque do crescimento e do desenvolvi-
mento; queremos uma lei de estabilidade orçamental com
diferenciação positiva, em que não possam ser castigadas
regiões que estão atrasadas e que enfrentam grandes pro-
blemas de ultraperiferia, como a Região Autónoma dos
Açores ou regiões atrasadas do próprio continente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o tempo de que
dispunha esgotou-se. Peço-lhe para concluir.
O Orador: — Sr. Presidente, vou terminar, dizendo o
seguinte: estamos disponíveis para, em sede de Comissão
de Economia, Finanças e Plano, desenvolver um trabalho
sério e aprofundar, com o Governo, o debate de uma lei de
estabilidade orçamental, mas não estaremos disponíveis
para votar ou pactuar com uma lei que contenha qualquer
inconstitucionalidade.
Queria perguntar ao Sr. Primeiro-Ministro se está certo,
se assegura que a proposta de lei da estabilidade orçamen-
tal, que será discutida amanhã na Assembleia da Repúbli-
ca, não contém qualquer inconstitucionalidade.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o
Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Depu-
tado Ferro Rodrigues, de facto, é extraordinário! Direi que
há aqui uma grande desfaçatez da sua parte, Sr. Deputa-
do…
Aplausos do PSD.
Vozes do PS: — Oh!
O Orador: — Como é possível vir agora, ainda o actu-
al Governo não tem três meses sobre a data em que foi
investido por esta Assembleia, procurar atirar para cima
dele a responsabilidade por todos os últimos desenvolvi-
mentos?! Como é possível, Sr. Deputado?! Sempre que
enfrentavam uma dificuldade, VV. Ex.as andaram, durante
seis anos, a atirar as culpas para os governos de Cavaco
Silva e, em três meses, já se esqueceram do governo do
Engenheiro Guterres!?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
V. Ex.ª, com certeza, ainda não se esqueceu do Enge-
nheiro António Guterres?!
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Já, já!
O Orador: — O seu partido não se esqueceu do gover-
no do Engenheiro António Guterres?
Protestos do PS.
O seu partido lembra-se que havia um governo chefia-
do pelo Engenheiro António Guterres, no qual estava o
Ministro Ferro Rodrigues?!
O Sr. Rui Vieira (PS): — Não lhe chega aos calca-
nhares!
O Orador: — O seu partido lembra-se que houve um
governo que calculou que o défice do Orçamento do Esta-
do seria, em 2001, de 1,1%?! E sabe, ou imagina, qual é o
défice que vamos encontrar? Pensa V. Ex.ª que isto não
tem consequências em termos de confiança, do ponto de
vista interno e externo?!
Vozes do CDS-PP: — Claro!
O Orador: — Não, Sr. Deputado Ferro Rodrigues,
aqueles aspectos negativos que caracterizam — e são sé-
rios — a actual conjuntura não derivam deste ou daquele
meu discurso, derivam ainda da vossa acção e da vossa
omissão enquanto foram governo!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PS: — Não, não!
O Orador: — V. Ex.ª referiu-se ao facto de as medidas
que tomámos ainda não estarem concretizadas. Pois é,
apresentámo-las à Assembleia da República, fizemos a
nossa parte e esperamos a vossa resposta nesta sede.
Mas, em termos de respeito pela Assembleia da Repú-
blica, o Sr. Deputado sabe quantas vezes já aqui estive,
nestes três meses, comparando com o meu antecessor? O
meu antecessor, em igual período, deslocou-se a esta As-
sembleia duas vezes, enquanto que eu, com esta, é a sexta
vez que aqui estou, desde que assumi funções.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
V. Ex.ª sabe quantas vezes os membros do seu governo
vieram a esta Assembleia e às comissões, em idêntico
período, em 1995 e em 1999? Eu digo-lhe: 11 vezes em
1995 e 11 vezes em 1999. Nestes dias, com este Governo,
os seus membros vieram às comissões 43 vezes, …
O Sr. José Magalhães (PS): — É falso!
O Orador: — … assim mostrando o nosso respeito
pela Assembleia da República.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
Por isso, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, a nossa vonta-
de é, obviamente, a de dialogar no âmbito da Assembleia
da República, mas não prescindimos da maioria e do pro-
jecto que a anima.
12
I SÉRIE — NÚMERO 30
O Sr. José Magalhães (PS): — E as inconstitucionali-
O Sr. José Magalhães (PS): — E bem!
O Orador: — … proclamando ele «aos sete ventos»
que viria cá todos os meses, que os membros do seu gover-
no viriam cá as vezes que fossem necessárias! A compara-
ção dos números fala por si.
Bem haja, Sr. Primeiro-Ministro, bem hajam os mem-
bros do Governo por terem esta postura de cooperação
institucional com a Assembleia da República.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Risos do PS.
Sr. Primeiro-Ministro, vem seguindo o Governo os pas-
sos certos para as exigências do quadro nacional em que
nos encontramos: saneámos as finanças públicas, e conti-
nuamos nesse esforço com a lei da estabilidade orçamen-
tal; apresentou-se ao País um programa de estímulo à pro-
dutividade e à economia; durante estes três meses, apresen-
taram-se na Assembleia da República 19 propostas de lei
e, dessas 19 propostas de lei, 12 referem-se a reformas
estruturantes que foram, durante seis anos, sistematica-
mente adiadas! Foi V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, que, em
três meses, fez mais do que os governos socialistas em três
anos.
Vozes do PSD: — É verdade!
O Sr. José Magalhães (PS): — Isso já tinha sido dito!
O Orador: — Vejam lá o que é, realmente, o empe-
nho nas reformas e o trazer à Assembleia da República
leis fundamentais — algumas delas, porventura, nem
teriam de por cá passar, mas V. Ex.ª fez questão que a
Assembleia da República partilhasse esta preocupação e
este esforço de recuperar o País e de o colocar no cami-
nho da modernização.
Sr. Primeiro-Ministro, a questão que lhe quero colocar
tem a ver, um pouco, com algo que já foi abordado na sua
intervenção, isto é, com o facto de se ter desenvolvido
muito a ideia de que a verdade que se tem revelado ao
País, a verdade sobre a situação difícil em que o País foi
deixado, é um mau serviço, que essa forma de expor ao
País a realidade dura e crua em que se encontra tem efeitos
negativos nos agentes económicos e é a causa das situa-
ções de recessão e de menor crescimento que, eventual-
mente, se estão agora a verificar.
A minha pergunta é esta: entende V. Ex.ª que devia ter
continuado a política do «faz de conta»? Que era essa a
forma de, efectivamente, garantir um avanço na vida eco-
nómica, garantir os passos que temos de dar para vencer os
desafios que se nos colocam, continuando a mentir e a
ocultar aos portugueses esta situação?
Entende V. Ex.ª que tem razão o líder do maior partido
da oposição, depois de termos ouvido as declarações do
Governador do Banco de Portugal — que, aliás, faz afir-
mações que não são novas, já em documentos do Banco de
Portugal de Março último se registava esta ideia da reces-
são, esta ideia de reservas relativamente ao crescimento?
dades?
O Orador: — Em relação à questão concreta que colo-
ca sobre a lei da estabilidade orçamental, gostaria de dizer
o seguinte: estamos disponíveis para eliminar quaisquer
normas que suscitem dúvidas quanto à inconstitucionali-
dade; estamos disponíveis para chegar imediatamente a
consenso convosco, desde que VV. Ex.as estejam disponí-
veis para viabilizar uma lei de estabilidade orçamental, que
deveria ser uma das vossas prioridades,…
Vozes do PS: — E é!
O Orador: — … porque foi um governo vosso que as-
sinou o Pacto de Estabilidade e Crescimento com a União
Europeia e o País não entenderia que agora, perante esta
situação, o Partido Socialista, que teve responsabilidades
nela, fugisse dela e não procurasse alargar, em Portugal, os
consensos necessários para a credibilidade da política
económica e para a nossa sustentação perante o exterior.
Espero, por isso, da vossa parte — da minha parte, farei o
possível —, que não esqueçam as responsabilidades que
assumiram.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Deputado Ferro Rodrigues, nós
anunciamos obras, VV. Ex.as criticam; nós anunciamos o
combate à fraude e à evasão fiscais, VV. Ex.as criticam;
nós falamos de um acordo de concertação social, ponto
que V. Ex.ª nem sequer referiu. Mas espero que também se
juntem a nós naquela que é uma necessidade patriótica: a
de voltar a trabalhar para o futuro de Portugal!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.
Primeiro-Ministro, a minha primeira palavra vai, exacta-
mente, no sentido de saudar V. Ex.ª e os membros do
Governo pela forma como se têm relacionado com a
Assembleia da República.
V. Ex.ª referiu já alguns números em matéria de pre-
senças do Sr. Primeiro-Ministro e dos membros do Gover-
no nas comissões. A essa informação posso ainda acres-
centar que, neste período, para além da presença do Sr.
Primeiro-Ministro, incluindo as vezes que aqui se desloca-
ram para acompanhar o Governo em debates gerais mas
sem incluir a presença normal do Sr. Ministro dos Assun-
tos Parlamentares, registaram-se em Plenário 86 presenças
de membros do Governo, enquanto que, em igual período,
na legislatura anterior, os membros do governo desloca-
ram-se ao Plenário 17 vezes. E na VII Legislatura estive-
ram presentes 18 membros do governo em período igual.
Vejam VV. Ex.as a diferença! E se tivermos presente
que o Sr. Eng.º Guterres criticava o Prof. Cavaco Silva e
os seus governos por virem pouco à Assembleia da
República,…
10 DE JULHO DE 2002
V. Ex.ª considera que, efectivamente, a actuação deste
Governo, nestes três meses, tem dado mostras de reformar,
tem dado mostras de dar passos importantes na evolução
do País? Entende que é essa a causa dos receios de reces-
são, dos indícios de recessão, que é essa a causa de algu-
mas reservas quanto ao crescimento, ou que, pelo contrá-
rio, são essas as medidas que vão fazer inverter, que vão
combater a situação de desgoverno que herdámos de seis
anos socialistas?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Essa pergunta é o
que se chama «dar graxa ao cágado»!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o
Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Srs.
Deputados, Sr. Deputado Guilherme Silva, em primeiro
lugar, quero agradecer as palavras de apoio e de estímulo
que quis dirigir ao Governo.
Em relação à cooperação institucional com a Assem-
bleia da República, quero dizer mais uma vez perante esta
Câmara que, para nós, esse é um princípio de que não
abdicamos. Achamos que é essencial um clima de boa
cooperação institucional, que temos vindo a manter com a
Assembleia da República e também com o Presidente da
República, se calhar surpreendendo alguns que não gosta-
riam que houvesse esse entendimento e essa cooperação
institucional.
O Sr. José Sócrates (PS): — Francamente!
O Orador: — Mas há uma coisa de que não prescin-
dimos, que é a firmeza em relação aos nossos objectivos e
da maioria que temos nesta Assembleia. Por isso, quere-
mos manter essa cooperação institucional. Seremos impe-
cáveis no respeito por esses princípios porque entendemos
que só assim é que se valorizam as nossas instituições
democráticas.
Em relação à sua pergunta concreta, Sr. Deputado Gui-
lherme Silva, só se surpreendeu com os números do Banco
de Portugal quem não ouviu os repetidos avisos que nós
tínhamos vindo a fazer. Eu próprio, nesta Assembleia, em
sucessivos debates sobre o estado na Nação, na altura
como líder da oposição, a então Sr.ª Deputada Manuela
Ferreira Leite, actual Ministra de Estado e das Finanças, o
Sr. Deputado Tavares Moreira fizemos tantos avisos de
que isto iria acontecer! Nós próprios alertámos tantas
vezes para a situação, bem como economistas independen-
tes e instituições internacionais. Mas a verdade é que nada
se fez. E a questão que agora se coloca é esta: o que é que
deve fazer o Governo? Deve continuar a atirar o lixo para
debaixo do tapete, pretendendo que está tudo bem, procu-
rando fazer uma encenação de optimismo artificial? Ou
deve, pelo contrário, expor a verdade ao público em geral,
expor a verdade aos eleitores e também aos agentes eco-
nómicos nacionais e externos?
O Sr. José Magalhães (PS): — Não pode! Não conse-
gue!
O Orador: — Sr. Deputado, eu só acredito na estraté-
gia da verdade e da credibilidade. Penso que a credibilida-
de é o caminho mais curto para a confiança e que esta não
se ganha com a criação artificial de efeitos mediáticos,
com encenações. Não esperem de mim «faroladas» mediá-
ticas, esperem sim trabalho, muito trabalho, credibilidade,
consistência, sempre a bem de Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para um pedido de esclarecimen-
to, tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro e Srs. Mem-
bros do Governo, a primeira constatação que eu quereria
fazer hoje é a de que só é possível analisar ou pensar o
estado da Nação ou o estado da economia comparativa-
mente. Esse é o primeiro dado. Quero registar, nesta pri-
meira análise, que não sei se o Sr. Primeiro-Ministro não
se terá equivocado. O Sr. Primeiro-Ministro disse que este
Governo tinha tomado mais iniciativas em três meses do
que em três anos de governo do PS. Não sei se não se
enganou, Sr. Primeiro-Ministro, penso que, se calhar, foi
mesmo em seis anos de governo do PS.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Provavelmente, este Governo já tomou
mais iniciativas do que o governo do Partido Socialista em
seis anos!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. António Filipe (PCP): — Então, já podem ir
O Sr. José Magalhães (PS): — É excitante essa pers-
embora!
pectiva!
O Orador: — Sr. Deputado José Magalhães…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Telmo Correia, dei-
lhe a palavra para dialogar com o Sr. Primeiro-Ministro,
não com o Sr. Deputado José Magalhães!
O Sr. José Magalhães (PS): — Isso é verdade, Sr. Pre-
sidente. Tem razão!
O Orador: — Sr. Presidente, peço imensa desculpa
mas se o Sr. Deputado José Magalhães me interromper e
me interpelar sucessivamente ou lhe respondo ou não con-
sigo usar da palavra. O Sr. Presidente terá de compreender.
O Sr. Presidente: — Terei, então, de apelar ao Sr.
Deputado José Magalhães para que não interrompa o ora-
dor.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
14
I SÉRIE — NÚMERO 30
É mais ou menos esta a análise que o PS fazia desta
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, queria recordar o
debate do estado da Nação de há um ano atrás, que foi um
debate marcado por duas frases essenciais que vinham de
dias antes desse debate; uma, do Sr. Deputado Jorge Coe-
lho: «quem se mete com o PS, leva!» — a frase é conheci-
da e ainda nos lembramos dela; outra, do ex-Primeiro-
Ministro António Guterres: «eu vou às fuças da direita!»
— era connosco, Sr. Primeiro-Ministro, era connosco!
Ora, o que é que aconteceu comparativamente? O Sr.
Primeiro-Ministro não foi «às fuças» a ninguém, antes pelo
contrário foi para casa! O PS parece continuar enervado e
a ameaçar que vai dar em alguém mas, realmente, nem deu
nem tem capacidade de dar em ninguém!
Risos do CDS-PP.
E o centro-direita, a tal direita que era suposto «levar
nas fuças», está no poder, está com mérito, está bem e está
para mudar o País. Esse é um dado fundamental.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Ainda em relação a esse debate, Srs. Deputados do PS,
queria recordar-vos que os números anunciados na altura
em relação ao défice do Estado eram, de facto, de 1,1%.
Nessa altura, o então Deputado Paulo Portas dizia aqui
numa intervenção: «cuidado, porque o défice do Estado
pode ser o dobro ou pode ser o triplo». Sr. Ministro da
Defesa, enganou-se, não era o triplo, era o quádruplo,
porque, segundo os dados de que hoje dispomos, é de
3,9%. Nós não tínhamos os números mas, se nos enganá-
mos e se errámos, foi por defeito — na altura, a situação
económica era muito pior do que nós dissemos!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Queria ainda recordar — e faço-o por
uma razão que já explicarei — uma intervenção, proferida
aquando desse debate, que vou referir textualmente, em
que uma Deputada dizia: «os senhores não resolvam o
problema do défice do Estado e vão ver qual é o resulta-
do!». Quem o dizia era a agora Sr.ª Ministra das Finanças,
então Deputada Manuela Ferreira Leite, hoje acusada,
numa linguagem inaceitável, pelo líder parlamentar do PS,
de enorme incompetência. O que é que mudou? O que
mudou foi que esta Sr.ª Deputada — que, na bancada do
PSD, foi a primeira a alertar com esta clareza para o pro-
blema — é hoje a Ministra das Finanças, está a resolver o
problema do défice e tem integral confiança desta maioria.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
A análise que os senhores faziam da situação económi-
ca faz-me lembrar, Srs. Deputados do PS e Sr. Primeiro-
Ministro, uma história que costuma contar um amigo meu:
é um bocado como quem olha para um cadáver que tem os
pés num frigorífico e a cabeça num forno, e que, olhando
para ele próprio, diz que está óptimo porque a temperatura
média é de 37º.
Risos.
mesma matéria.
Vou terminar, Sr. Primeiro-Ministro, deixando-lhe
duas questões concretas. Peço-lhe, Sr. Primeiro-Ministro,
se pode adiantar algo mais em relação à reforma da legis-
lação laboral, designadamente em matéria de negociação
colectiva, em matéria de flexibilidade e de mobilidade.
Por outro lado, Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe se
nos pode adiantar algo — porque menos burocracia tam-
bém é base da confiança — em relação à privatização
dos notários.
Trata-se de matérias fundamentais, matérias para levar
a cabo, matérias para levar a cabo em quatro anos com
total confiança e com total apoio da nossa parte.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o
Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Depu-
tado Telmo Correia, agradeço as suas palavras de apoio ao
nosso Governo.
Queria referir uma questão que me parece importante:
se não tivesse sido a intervenção do Sr. Deputado Ferro
Rodrigues, insinuando que a actual situação resultava de
algumas declarações minhas, fugindo assim à responsabi-
lidade própria do seu partido enquanto foi governo, eu não
tinha trazido aqui mais questões em relação ao passado.
O Sr. José Sócrates (PS): — Não tinha?! Por amor de
Deus! Não seja cínico!
O Orador: — Aliás, de uma forma geral, penso que
hoje já estamos de acordo com o diagnóstico feito em
relação ao passado. Aquilo que aqui trouxe hoje e aquilo
em que eu gostava que nos concentrássemos é o que se
refere ao futuro, às medidas que estamos a tomar em ter-
mos de correcção do desequilíbrio macroeconómico (tenho
de o referir porque é inevitável referi-lo, Sr. Deputado), às
medidas microeconómicas de apoio às nossas empresas, ao
fomento da produtividade e das exportações, e também,
obviamente, às reformas estruturais. É isso que estamos a
fazer e é nessa linha que vamos.
E se, de vez em quando, temos de chamar a atenção
para o passado, fazemo-lo não por qualquer prazer especial
que nos dê ver o PS em dificuldades, mas porque o povo
português tem de entender a dimensão do desafio, e o
desafio que temos pela frente é, de facto, um grande desa-
fio. Por isso, é que hoje vos anunciei que queremos propor
um acordo de concertação social, porque achamos que é
possível, se houver cedências e compromissos do lado dos
empresários, por um lado, e do lado dos trabalhadores, por
outro, chegar a uma situação em que poderemos dizer que
vamos suportar alguns esforços durante algum tempo mas
que vai haver uma saída, porque eu acredito que vai haver
uma saída.
E as medidas que agora anunciámos, nomeadamente a
flexibilização da legislação laboral, têm apenas em vista
colocar Portugal em situação idêntica à de outros países,
10 DE JULHO DE 2002
como a Alemanha, que, hoje em dia, está a ser governado
por um governo socialista e que tem uma legislação labo-
ral bem mais flexível do que a nossa. A questão que se
coloca é esta, Srs. Deputados: se não garantirmos condi-
ções de competitividade semelhantes às dos nossos par-
ceiros europeus…
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — E as diferenças
dos salários?
O Orador: — … temos não apenas muito investimento
que poderá deixar de vir para Portugal como investimento
que está aqui e que pode fugir. Esta é a verdade, e tem de
ser dita! Tem de ser dita a verdade para o País entender a
magnitude do desafio que tem pela frente!
Vem aí um alargamento da União Europeia que está a
alterar radicalmente as condições da nossa competitivi-
dade, e é sobre estas questões que eu gostava que o País
reflectisse e que esta Assembleia da República também
falasse e não, como tem acontecido tantas vezes no deba-
te político, sobre questões incidentais, que até podem ter
a sua importância mas que é uma importância relativa.
Bem sei que, do ponto de vista mediático, é mais fácil
pegar neste ou naquele acontecimento, neste ou naquele
epifenómeno, que é mais interessante, que dá para mais
alguns calembours ou para mais alguns trocadilhos. Mas,
do ponto de vista do País, como é que se resolvem os
problemas?!
A verdade é que, até agora, Sr. Deputado, se já repa-
rou, no fundo não houve ainda críticas sérias nem funda-
mentadas às propostas essenciais. Alguém está contra o
princípio da convergência das pensões mínimas com o
salário mínimo nacional?! Não!
O Sr. António Costa (PS): — Mas isso já está em vigor!
O Orador: — Então, vamos aprovar! Contamos com o
vosso voto para apoiar a reforma que o governo apresentou
nesta Assembleia da República!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. António Costa (PS): — Mas já está em vigor!
O Orador: — Alguém está contra a introdução de
maior rigor, maior flexibilidade na gestão dos hospitais?!
Alguém está contra pôr alguma ordem no desenvolvimento
anárquico do nosso sistema de ensino superior e que se dê
valor aos nossos diplomas, por forma a que os nossos
jovens não sofram na concorrência internacional?! Alguém
está contra uma política de imigração séria, responsável,
uma política que seja firme no controlo mas acolhedora e
generosa na integração?! Alguém está contra estabelecer
parcerias público-privadas, por exemplo, para criar novos
hospitais, assegurar o seu funcionamento e também (não o
referi há pouco) não apenas com o sector privado mas com
o sector social, com as Misericórdias, para criarmos hospi-
tais e centros de saúde de cuidados continuados para os
mais idosos ou doentes em situação terminal?! Eram estas
as questões que eu gostava de ouvir e saber se a oposição
está contra, se está a favor ou se se abstém. Mas o debate
político tem sido dominado por questões incidentais e eu
gostava que o debate político se centrasse naquilo que tem
a ver com o futuro do País porque estou convicto — des-
culpem, Srs. Deputados, mas tenho a certeza — de que é
este o caminho e de que os senhores se arrependerão se
não estiverem connosco no caminho para desenvolver
Portugal.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Sr. Presidente, Sr.
Primeiro-Ministro, afirmou que quando chegou ao Gover-
no havia em Portugal um clima de pessimismo. Hoje o
clima é de optimismo, de confiança, de felicidade… Aliás,
os trabalhadores das OGMA, que estiveram agora à sua
porta, traduziram isso mesmo: confiança, felicidade, estado
de grande satisfação por terem os salários em atraso…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Foi uma manifestação
de apoio.
O Orador: — Aquando do debate sobre o orçamento
rectificativo dissemos-lhe que a sua política ia levar à
estagnação e, muito provavelmente, a uma recessão.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Exactamente!
O Orador: — Hoje os dados estão aí: infelizmente,
prossegue-se uma política de submissão ao Pacto de Esta-
bilidade, da responsabilidade do PS e também do PSD,
como é sabido.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Exactamente!
O Orador: — As declarações catastróficas que fez de
que o País estava de tanga levaram a maior desconfiança,
ao pessimismo, tudo isso para aplainar o caminho, para
apertar o cinto aos mesmos de sempre, e hoje temos as
dificuldades que temos.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — O que é que nos diz o Banco de Portu-
gal? Diz que podemos chegar ao fim do ano com um cres-
cimento zero, que estamos em estagnação. Eu avanço
mais: corremos o grande risco de entrar em recessão,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Exactamente!
O Orador: — … com o cortejo das falências, do
desemprego e da conflitualidade social, que são da respon-
sabilidade do Governo.
Aplausos do PCP.
É uma evidência que o Governo não inverteu as ten-
dências negativas que vinham do passado, estando hoje o
País pior do que estava há três meses — veja todos os
indicadores de confiança, todos, mesmo os que foram
publicados hoje!
16
I SÉRIE — NÚMERO 30
Também lhe digo, hoje, Sr. Primeiro-Ministro, que a
quebra do crescimento vai reflectir-se nas receitas do Or-
çamento e que a política abrupta, cega da Dr.ª Manuela
Ferreira Leite para cumprir o Pacto de Estabilidade vai
criar mais dificuldades às empresas, às famílias e ao nosso
país. Mas, mais: com o sobreendividamento, vamos correr
o risco de muitos activos de empresas importantes caírem
nas mãos do estrangeiro, de um dia para o outro, o que
aliás está já a acontecer também com a política irresponsá-
vel e antinacional das privatizações.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — O Sr. Primeiro-Ministro gaba-se de ter
feito muito, mas tem muita pressa e procurou fugir ao
debate profundo na Assembleia da República.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Mas a pressa que teve foi para quê?!
Interessou-se em dinamizar o investimento produtivo?
Interessou-se com as empresas que estão em deslocaliza-
ção e em vias de encerramento? Interessou-se pelas difi-
culdades dos reformados, dos trabalhadores, sobretudo
daqueles que têm salários mais magros e que estão a ser
«comidos» pela inflação?
A pressa do Governo e a sua preocupação foi a de dar
satisfação aos grandes interesses: a contra-reforma fiscal
foi para dar satisfação aos banqueiros e aos especuladores;
a contra-revolução da segurança social foi para dar satisfa-
ção às seguradoras privadas; e joga-se com a saúde dos
portugueses para fazer negócio. É isto que está em causa,
concretizando-se a política defendida no passado por um
Deputado do PSD: «quem quer saúde que a pague!».
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Primeiro-Ministro, a desvalorização
da escola pública, o corte dos juros bonificados e o facto
de se procurar levar à roleta da bolsa os milhões da segu-
rança social fazem parte de uma política iníqua e injusta.
O que se passou com grandes empresas, como a
NROM, a WorldCom, a Vivendi, bem como o que se está
a passar com o afundamento da Bolsa portuguesa é um
dedo acusador àqueles que querem colocar na roleta da
Bolsa, trocando o certo pelo incerto, as poupanças dos
trabalhadores.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Primeiro-Ministro, os grandes inte-
resses têm no seu Governo um Governo aberto, por isso
sabem que podem contar com V. Ex.ª e com os seus minis-
tros para dobrarem a parada, para exigirem mais desregu-
lamentação, mexida das leis laborais… Até as multinacio-
nais alemãs tiveram a desfaçatez de, em público, fazer uma
chantagem!
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Orador: — É evidente que o Sr. Ministro da propa-
ganda…, perdão, o Sr. Ministro da Segurança Social, que
está ali sentado na bancada do Governo, disse logo, muito
alto e bom som, que em Portugal quem manda são os por-
tugueses. Mas o Conselho de Ministro reuniu-se e logo a
seguir tivemos o anúncio de que o Governo ia, de uma
forma célere, rever a lei laboral,…
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — E muito
bem!
O Orador: — … não deixando pedra sobre pedra.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Carlos Carvalhas, o
seu tempo esgotou-se, pelo que terá de concluir.
O Orador: — E, se bem o disse, melhor o fez!
Sr. Primeiro-Ministro, aconselho-o a olhar também
para as empresas, para as OGMA, para a Vestis, para ex-
Quimigal, para as indústrias cerâmica e têxtil e para os
requerimentos que fizemos e que até agora não tiveram
qualquer resposta.
O Sr. Primeiro-Ministro está muito contente, mas cer-
tamente que os profissionais da RTP, os reformados, os
trabalhadores e muitos pequenos e médios empresários não
seguem esse contentamento.
Pode dizer-se que três meses é pouco na vida de um
governo e muito menos na vida de um país. Mas os golpes
que já foram feitos aos interesses dos portugueses e aquilo
que foi anunciado colocam na ordem do dia uma resistên-
cia para a qual convidamos todas as forças de esquerda.
Connosco pode contar, essa resistência tê-la-á todos os
dias!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o
Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Depu-
tado Carlos Carvalhas, se os problemas dos trabalhadores
portugueses, por exemplo os problemas dos trabalhadores
das OGMA, se resolvessem com ideologia, V. Ex.ª já os
teria resolvido com certeza há muito tempo!
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Com o aumento
Passo a referir a verdade sobre a situação que herdámos
do anterior governo: de 1996 a 2000, houve prejuízos nas
OGMA de 6 milhões de contos; em 2001, houve prejuízos
no valor de 8 milhões de contos; o endividamento de curto
prazo foi de 9 milhões de contos; o passivo total das
OGMA é de 32 milhões de contos; a percentagem dos
dos salários!
O Orador: — No caso concreto das OGMA, a respon-
sabilidade é do meu Governo?!
O Sr. Honório Novo (PCP): — Do meu é que não é!
O Orador: — É do meu Governo essa responsabili-
dade?!
10 DE JULHO DE 2002
salários em relação ao volume dos negócios já era de mais
de 50% e, mesmo assim, o anterior governo achou por bem
admitir mais 600 trabalhadores numa empresa que já tinha
esta situação!
Pergunto: a responsabilidade é minha?! Estou disponí-
vel para assumir todas responsabilidades, mas penso que
não é justo atribuírem-me uma responsabilidade como
esta.
Digo-vos que estamos a tentar encontrar a solução, é
para isso que estamos a trabalhar, e por isso mesmo foi
desbloqueada uma verba que permite pagar os salários de
Junho e um mês de férias. Estamos a trabalhar com a
banca, estamos à procura de encontrar uma solução,
porque verdadeiramente nos interessa o futuro dos traba-
lhadores. Mas não é com ideologia nem com declarações
como as do Sr. Deputado Carlos Carvalhas que se resol-
ve qualquer problema dos trabalhadores. Pelo contrário,
são declarações como as suas que afastam o investimento
em Portugal!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Deputado critica o actual modelo de economia
prevalecente no nosso país. Fala, aliás, de algumas crises
no actual sistema capitalista. Mas esqueceu-se de referir a
crise mais profunda que atingiu o ex-sistema comunista ou
socialista…
Vozes do PCP: — Ah!
O Orador: — Mas, qual é o seu modelo, Sr. Deputa-
do? A questão é esta: qual é a alternativa? Qual é o seu
modelo?
Em termos concretos, o que é que V. Ex.ª quer? Como
é que V. Ex.ª gostava que fosse o nosso país? Com empre-
sas privadas, ou não? Com concorrência, ou não?
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Se me está a fazer
uma pergunta, deixe-me responder-lhe!
O Orador: — É que a questão é extremamente séria,
Sr. Deputado! Nós estamos, neste momento, com proble-
mas de competitividade gravíssimos ao nível europeu. Se
não garantirmos condições de competitividade à nossa
economia não virá para Portugal investimento externo e
muito investimento interno irá para fora do nosso país.
Esta é que é a questão! Por isso, temos de enfrentar o pro-
blema. De nada serve falar contra as multinacionais ale-
mãs. V. Ex.ª obriga, contra a sua vontade, uma multinacio-
nal a ficar em Portugal?! Como é que faz?! Como é que V.
Ex.ª faz?! Ou V. Ex.ª propõe que Portugal saia da União
Europeia?! Da zona euro?! Do sistema de economia de
mercado?! Do sistema de livre concorrência?! Qual é o seu
modelo?! Esta é a questão que temos que discutir com os
portugueses, em particular com os trabalhadores, porque
tenho a certeza de que ninguém mais do que os trabalhado-
res está interessado na concertação social.
Deixe-me que lhe diga, Sr. Deputado, que não é
fomentando a instabilidade social, não é procurando
ganhar nas ruas com greves e com manifestações aquilo
que não conseguiu ganhar através do voto democrático que
se consegue dar credibilidade e confiança à economia e
melhorar o futuro dos trabalhadores portugueses!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra, também
para pedir esclarecimentos, o Sr. Deputado Francisco
Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr.
Primeiro-Ministro, escolheu entreter o debate com algumas
banalidades sobre confiança, logo reforçadas por graças
cadavéricas de uma das bancadas que o apoiam, anuncian-
do algumas decisões requentadas e tentando polvilhar tudo
isto com anúncios espampanantes. A verdade é que o País
já conhece este Governo e ao fim de 100 dias bem sabe-
mos que este Governo é ultraliberal em economia e ultra-
conservador em questões sociais.
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Muito bem!
O Orador: — Este Governo deixa uma mensagem ao
País: esteja de «tanga» ou de «fraque», salve-se quem
puder!
Fala-nos de credibilidade — é a palavra-chave —, diz-
nos que o Governo é de decidir. Este Governo decidiu,
mas fê-lo mal. Queria baixar os impostos, mas aumentou-
os — decidiu mal; queria diminuir os benefícios fiscais
injustificados, mas aumentou-os — decidiu mal; queria
melhorar os serviços de saúde, mas temos as portas abertas
para o Grupo Mello e outros interessados na privatização
de 35 hospitais — decidiu mal! Este Governo, perante
qualquer dificuldade, decidiu sempre mal.
Queixaram-se os produtores de vinho que os conduto-
res se comportam mal porque bebem pouco e o Governo
decidiu imediatamente, como se sabe!
Dizem-se, sempre com demagogia, contra os salários
opulentos na RTP, mas, naturalmente, desde que não seja o
de um Deputado do PSD!
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Muito bem!
O Orador: — Disse-nos o Sr. Primeiro-Ministro que
agora não deixará descansar a Assembleia. Há-de nos
explicar como é que as bancadas que o apoiam querem o
fim-de-semana dos quatro dias!
Aplausos do BE.
Em tudo isto, sistematicamente, sempre, Sr. Primeiro-
Ministro, o Governo decidiu mal!
O Governo tenta usar a política de assustar o País para
assim governar. Diziam que iam pôr em causa 50 000
postos na função pública, depois eram 10 000…, não,
afinal já diz que são 4600!…. Não se sabe! A Ministra das
Finanças logo decidirá, escolhendo a próxima vítima.
Em todas estas matérias não podemos acusar o Gover-
no de não ter decidido, acusamo-lo de ter decidido mal, de
estar mal preparado, de não saber o que quer, de não saber
o que faz e de não saber o que vem a seguir.
Sr. Primeiro-Ministro, não nos pode falar de credibili-
dade quando os seus ministros, um após outro, demons-
18
I SÉRIE — NÚMERO 30
tram uma total falta de preparação. O Sr. Ministro da Saú-
de vem ao Parlamento declarar-se aborrecido, enfastiado
com aquele princípio de «a trabalho igual salário igual» —
não leu a Constituição!
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Muito bem!
O Orador: — A Sr.ª Secretária de Estado da Educação
diz que, porventura, enfim, Salazar não teria tido razão ao
não consagrar um princípio de religião oficial de Estado —
não leu a Constituição!
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Muito bem!
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Essas é
que são banalidades!
O Orador: — Cada linha que o Sr. Ministro Morais
Sarmento escreve de uma proposta de lei viola a Constitui-
ção! E viola sistematicamente a Constituição, Sr. Primeiro-
Ministro!
O Sr. Primeiro-Ministro dizia que não tínhamos razão,
mas, como bem se viu, o Tribunal Constitucional e o Pre-
sidente deram-nos razão.
Digo-lhe a esse respeito, aliás, que se não for hoje que
retira a pasta da RTP à tutela do Ministro Morais Sarmento
será daqui a um mês. Algum dia terá que ser, porque terá
que acabar a política incendiária em relação à RTP. É
tempo de acabar essa política incendiária!
Mas este Governo não decidiu em relação ao que era
importante decidir. Mudou muito, mas o que é que mudou
de essencial? O que é que nos prepara para 2004? O que é
que nos faz combater o endividamento? O que é que nos
faz combater a desqualificação? O que é que nos faz com-
bater a falta de produtividade, a falta de emprego, a preca-
riedade do trabalho? Aí, o Governo não tem medidas!
Bem nos pode dizer que este é o caminho, mas sobre
isso, Sr. Primeiro-Ministro, o que lhe quero dizer é que, na
nossa opinião, um bom governo é aquele que toma quatro
decisões: uma reforma fiscal que permita recolher pelo
menos 1000 milhões de contos do que é roubado todos os
anos; uma política de criação de emprego para 1 milhão de
trabalhadores e de trabalhadoras em situação precária, que
estão a recibo verde e que não têm garantias em Portugal;
uma política de desenvolvimento dos serviços públicos
que qualifique os mais de 300 centros de saúde como a
primeira prioridade na garantia da qualidade da prestação
dos serviços; por último, mais Europa, melhor Europa,
mais coordenada, mais democrática e mais capaz de res-
peitar os princípios essenciais do desenvolvimento de cada
país e do conjunto que somos.
É nestas quatro matérias — emprego, serviços públi-
cos, reforma fiscal e Europa — que se tem de constituir
um bom governo. E o seu, que é o pior dos governos que
esta Assembleia da República tem vindo a discutir e a
analisar ao longo dos últimos muitos anos, não tem respos-
tas em nenhuma destas matérias. Agrava os problemas,
esconde-os, oculta-os, pensa que o tempo passa e entre-
tém-nos, mas 2004 está à nossa frente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o seu tempo esgo-
tou-se. Terá de concluir.
O Orador: — Para isso, é preciso uma decisão de um
governo que governe, de uma maioria que tenha escolhas e
de uma estratégia que seja vencedora. E essa será também
a nossa intervenção, Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o
Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Depu-
tado Francisco Louçã, trazia o número já preparado. Na
realidade, não se colocam verdadeiras questões nem inter-
pelações à nossa política.
Só queria dizer-lhe uma coisa, Sr. Deputado: não seja
tão categórico, tão definitivo! Eu também era assim quan-
do era novo!
Risos.
Não seja! Não seja!
V. Ex.ª faz juízos definitivos, categóricos, de que este é
o pior Governo, que o Governo não está preparado…
Bom, o País ficaria tranquilo se fosse o Sr. Deputado Fran-
cisco Louçã a governar e a tomar conta das finanças públi-
cas e dos nossos impostos?
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Não me compare
consigo!
O Orador: — Sr. Deputado, tenho uma certa simpatia
por si. Identifico-me! É uma imagem da minha juventude!
Risos.
Mas não deve ser assim tão categórico e tão definitivo!
De resto, o que nos afasta, do ponto de vista das ideias,
fica demonstrado quando V. Ex.ª nos critica. Cada crítica
que faz, por mais dura e severa que seja, é a confirmação
de que, provavelmente, estamos no caminho certo, Sr.
Deputado.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — É verdade!
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Que belo argu-
mento!
O Orador: — Eu não espero o apoio do vosso respei-
tável grupo parlamentar. Aliás, devo dizer que até acharia
estranho se o vosso grupo parlamentar apoiasse a nossa
orientação em matéria de política económica, em matéria
de política fiscal, em matéria de política europeia, em
matéria de sinais de estímulo e de crescimento para a nossa
economia. Só que nós não somos tão categóricos e tão
definitivos e tão arrogantes no julgamento das pessoas!
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Não são arro-
gantes?!
10 DE JULHO DE 2002
O Orador: — Nós não dizemos, como VV. Ex.as às
vezes dizem, e como disse há pouco o Sr. Deputado Carlos
Carvalhas, que estamos ao serviço de interesses. Mas des-
culpo-vos isso!
Vozes do PCP: — Ah!
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Não tem poder
para nos desculpar!
O Orador: — Desculpo, porque os senhores estão ce-
gos pela vossa posição ideológica. Mas só por isso é que
posso desculpar uma acusação que não é séria e que, caso
VV. Ex.as quisessem, de facto, significar isso, atingiria a
honra das pessoas que fazem parte deste Governo, que têm
uma ideologia própria, ideias e valores próprios, mas,
apenas, ao serviço de Portugal!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presiden-
te, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados, em primei-
ro lugar, deixo uma palavra de solidariedade de Os Verdes
para com os trabalhadores das OGMA, que hoje estiveram
concentrados na exigência do pagamento dos seus salários
em atraso e na defesa do seu trabalho.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Oradora: — Uma palavra de solidariedade para
todos os que neste País lutam pelos seus direitos e pela
garantia de direitos das gerações futuras. É por isso, Sr.
Primeiro-Ministro, que nos preocupa muito que V. Ex.ª
caracterize estas acções como formas de fomentar a insta-
bilidade social. Na nossa perspectiva, vai pelo mau cami-
nho!
Sr. Primeiro-Ministro, desde a situação dos trabalhado-
res das OGMA e da situação de muitos outros trabalhado-
res de outras empresas do País até à situação em que se
encontra, neste momento, por exemplo, o rio Arunca, víti-
ma de uma descarga de efluentes tóxicos…, assim vai o
estado da Nação! Vai mal! Vai muito mal, Sr. Primeiro-
Ministro!
O Governo, como já hoje ouvimos, repetidamente, nes-
ta Casa, tem insistido regularmente na ideia de que em três
meses fez mais do que outros governos em três anos. O
que não percebo é, se se reclama como um Governo de
acção, afinal do que está à espera para tomar medidas em
relação a algumas situações gravíssimas, que põem em
causa a segurança das pessoas e constituem verdadeiros
crimes e atentados à saúde pública. Pergunto: porque será
que sobre essas matérias o Governo anda calado?
Dou um primeiro exemplo, que tem a ver com a extrac-
ção de areias em meio hídrico. Em relação às inúmeras
iniciativas que Os Verdes lançaram na Legislatura passada,
o então porta-voz do ambiente do PSD e actual Secretário
de Estado do Ambiente subscrevia todas as nossas preocu-
pações, que exigiam acção pronta, que exigiam acção
imediata! Mas agora calam-se, não apresentam soluções
para a regulação de uma actividade que funciona exclusi-
vamente no interesse dos areeiros e que tem delapidado os
nossos rios, as suas margens e que tem posto em risco
estruturas que sobre elas assentam.
Todos nos lembramos, Sr. Primeiro-Ministro, das con-
sequências da extracção de inertes no drama de Entre-os-
Rios. Por isso, pergunto: de que é que o Governo está à
espera para pôr cobro a esta fúria e a esta ânsia de extrac-
ção de areia em meio hídrico? De que estão à espera para
impedir este crime, que não tem outro nome? De que estão
à espera para regularizar esta actividade? Este absurdo, Sr.
Primeiro-Ministro, não se compadece com mais demoras!
O segundo exemplo que quero dar constitui um atenta-
do à saúde pública, que está a tomar proporções verdadei-
ramente preocupantes. Refiro-me às toneladas de farinha
de aves e bovinos que estão armazenadas e depositadas em
condições profundamente inadequadas por esse País fora,
algumas em grave estado de contaminação e de putrefac-
ção, constituindo já verdadeiros riscos de contaminação
dos nossos solos. Continuamos, Sr. Primeiro-Ministro, à
espera de uma solução!
Durante a presente Legislatura, já tive a possibilidade
de, em sede de Comissão, questionar quer o Sr. Ministro
da Agricultura quer o Sr. Ministro do Ambiente sobre esta
matéria. A resposta que tive foi «zero» em termos de acção
e de medidas a tomar pelo Governo.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Oradora: — Por conseguinte, Sr. Primeiro-Ministro,
quero deixar-lhe esta preocupação: os armazéns estão a
esgotar a sua capacidade, uma vez que são depositadas
cerca de 200 toneladas dessas farinhas por dia em aterros
de resíduos sólidos urbanos. A verdade é que todos consi-
deram que esta é uma solução profundamente inadequada.
Sr. Primeiro-Ministro, de que é que estão à espera para que
sejam tomadas medidas relativamente a esta questão?
Sr. Primeiro-Ministro, a inacção do Governo em rela-
ção às matérias que acabo de referir permite o agravamen-
to destas situações, tornando as suas proporções e conse-
quências ainda mais dramáticas. Este Governo, ao fim de
três meses, incompreensivelmente, nada fez! Mas tem que
responder a estas questões, por estes atentados. É precisa-
mente isso que gostaria que o Sr. Primeiro-Ministro fizesse
de seguida.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o
Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Depu-
tada Heloísa Apolónia, em primeiro lugar, quero dizer-lhe
que esperava uma palavra de congratulação pelo facto de o
Governo, em menos de três meses, ter feito aquilo que o
governo anterior não fez nos últimos anos.
O Sr. José Magalhães (PS): — É o vosso mantra!
O Orador: — O Governo apresentou a estratégia naci-
onal do desenvolvimento sustentável, para discussão naci-
20
I SÉRIE — NÚMERO 30
onal e debate público, sobre a qual seria útil conhecer o
pensamento da Assembleia e do País.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Exactamente!
O Orador: — A verdade é que tivemos de dedicarmo-
nos a esse objectivo num prazo extremamente curto. Até
porque, como sabe, tivemos de dar o nosso contributo para
a estratégia europeia, que será defendida na Cimeira de
Joanesburgo.
Quanto aos problemas concretos que a Sr.ª Deputada
colocou, e que são problemas reais, devo dizer-lhe que
estão, todos eles, a ser enfrentados, nomeadamente o pro-
blema das farinhas contaminadas e tudo aquilo que repre-
senta de perigo para a saúde pública, estando a ser prepa-
rada uma decisão sobre o problema da extracção de iner-
tes, que preocupava (e preocupa ainda) o Deputado do
PSD que se dedicava a essa matéria e que actualmente
ocupa o cargo de Secretário de Estado do Ambiente, e
ainda o que a Sr. Deputada referiu em relação aos resíduos
sólidos urbanos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Mas, como V. Ex.ª deve compreender, o
Governo assumiu funções há três meses pelo que tem de
preparar as decisões com alguma cautela e com alguma
ponderação. Esse é o sentido da nossa acção!
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — A situação
não se compadece com mais demoras, Sr. Primeiro-
Ministro!
O Orador: — V. Ex.ª, estou certo, não ficará desiludi-
da com os resultados que o Governo irá mostrar em termos
de política de ambiente!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — É preciso é
saber quando!
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra o Sr. Deputado José Sócrates.
Assinalo que, nesta segunda volta de questões, cada
orador dispõe apenas de 3 minutos.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. José Sócrates (PS): — Sr. Presidente, Sr. Primei-
ro-Ministro, nada minou mais a confiança dos portugueses
na sua economia e nas suas instituições políticas do que a
fraude eleitoral cometida pelo seu Governo!
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Orador: — Nada alterou mais a relação de confian-
ça do que um governo que prometeu baixar os impostos e
os aumentou!
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Orador: — Isso contribuiu para deprimir o País,
para afastar os portugueses da sua relação de confiança e
de optimismo de um Governo que entrava em funções e foi
fatídico para atingir os indicadores de confiança nos seus
corações.
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Orador: — Mas não apenas isso! Nada afectou mais
a confiança dos portugueses do que o discurso negativista,
pessimista e deprimente feito pelo Sr. Primeiro-Ministro
quando apresentou, aqui, o Programa do Governo.
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Se calhar deviam ter
dito que estava tudo bem!…
O Orador: — Foram estes os dois erros capitais come-
tidos pelo seu Governo, Sr. Primeiro-Ministro.
Neste debate do estado da Nação não pode escapar
aquilo que é essencial: uma avaliação política destes três
meses do seu Governo.
Os dois erros capitais que referi contribuíram para que
as previsões do Banco de Portugal fossem previsões ne-
gras, que apontam para uma estagnação económica como
há muito tempo não se via!
Vozes do PS: — Muito bem!
Protestos do PSD.
O Orador: — Sr. Primeiro-Ministro, a Sr.ª Ministra
das Finanças, que está sentada ao seu lado, previu um
cenário macroeconómico que nos apresentou aqui aquando
do Orçamento rectificativo. Dizia a Sr.ª Ministra das Fi-
nanças que Portugal ia crescer este ano de 1% a 1,5%. O
Banco de Portugal vem dizer que só vamos crescer entre
0% e 1%!
No que diz respeito ao investimento, a Sr.ª Ministra das
Finanças disse que ía ser de —3% a 1,5%. O Banco de
Portugal diz que, afinal, o investimento se vai comportar
com uma taxa de evolução de —5% a —3%!
O Sr. António Costa (PS): — Exactamente!
O Orador: — A Sr.ª Ministra das Finanças disse que a
inflação ia situar-se entre 3,2% e 3,6%. O Banco de Portu-
gal vem dizer que a inflação vai ficar entre 3,5% e 4,5%!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — E as vossas previsões?
O Orador: — Os senhores não acertam uma!
Aplausos do PS.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Olha quem fala!
O Orador: — Para quem passou a vida a dizer o que
os senhores disseram, para quem tantas vezes chamou a
atenção dos anteriores governos para o rigor das previsões,
10 DE JULHO DE 2002
o que se pedia era que não falhassem logo à primeira! E se
a Sr.ª Ministra das Finanças chamava incompetentes aos
outros porque as suas previsões não eram correctas, o que
é que achará das suas próprias previsões?
Sr. Primeiro-Ministro, a definição de um quadro ma-
croeconómico no Orçamento rectificativo que aqui foi
apresentado, tão desfasado da previsões do Banco de Por-
tugal, é contra a credibilidade da economia e afecta a con-
fiança dos portugueses na condução da política macroeco-
nómica.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado o seu tempo esgo-
tou-se. Tem de concluir!
O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
A verdade é que nada foi mais devastador para a con-
fiança dos portugueses do que a acção deste Governo.
De facto, Sr. Primeiro-Ministro, pode gabar-se de ter
feito mais em três meses do que nós fizemos em três anos,
mas está com certeza a referir-se a asneiras, porque nunca
o anterior governo fez asneiras como os senhores têm
feito, pondo o País à beira da uma estagnação e de uma
recessão económica.
O que os senhores não podem evitar é o tom categórico
com que os portugueses fazem o balanço destes três meses.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir. O
seu tempo está esgotado.
O Orador: — O que aconteceu é que estes três meses
foram um desastre total e os portugueses têm bem cons-
ciência disso! Estes três meses de governo foram um
falhanço rotundo!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o
Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Depu-
tado José Sócrates, V. Ex.ª parece estar a querer ganhar a
«camisola amarela» na volta política à demagogia e à falta
de honestidade intelectual.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
O seu discurso, Sr. Deputado, é marcado apenas pelo
ressentimento e pelo mau perder.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Não há da sua parte qualquer esforço,
por mínimo que seja, de objectividade, de racionalidade e
de atenção aos dados, à memória e aos factos. V. Ex.ª
começa por dizer que a responsabilidade da actual situação
é minha, por causa dos meus discursos.
O Sr. Artur Penedos (PS): — É verdade!
O Orador: — Sr. Deputado, se a questão fosse os dis-
cursos, VV. Ex.as ainda estavam no poder! Se a questão
fosse os discursos, VV. Ex.as ainda não tinham saído do
Governo!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Deputado, se a situação estava boa, por que razão é
que se foram embora? Se a situação era assim tão excelen-
te, por que razão é que o ex-Primeiro-Ministro fugiu e não
cumpriu a legislatura até ao fim?!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
V. Ex.ª apresenta os dados do Banco de Portugal e diz:
«Mas que escândalo! Há uma contradição entre os dados
do Banco de Portugal…» — previsões, refiro — «… e
aquilo que está no Orçamento rectificativo».
O Sr. José Magalhães (PS): — Pois claro!
O Orador: — Sr. Deputado, então muito maior con-
tradição há entre esses dados e aquilo que estava no Orça-
mento do Estado que VV. Ex.as fizeram! Porque, então,
sim, o Orçamento do Estado para 2002 seria completamen-
te surrealista, completamente fora da realidade! E V. Ex.ª
não diz isto?! V. Ex.ª não reconhece isto?!
O Sr. José Magalhães (PS): — Esse argumento é sui-
cida!
O Orador: — Sr. Deputado, uma coisa é a luta políti-
ca, a natural divergência, mas tem de haver um mínimo de
racionalidade no debate, um mínimo de honestidade inte-
lectual, porque, senão, perde-se completamente o sentido
do equilíbrio e da proporção!
É por isso que vejo constantemente o seu discurso
como um discurso marcado pelo ressentimento e, se ca-
lhar, pela ambição, que é legítima, mas digo-lhe, Sr. Depu-
tado, que não é assim que constrói a sua própria credibili-
dade.
A verdade é que temos hoje uma situação difícil, que
não queremos escamotear. O problema da confiança come-
çou bem antes.
E, já agora, lembro-lhe também, por uma questão de
rigor, o que disse o ex-Primeiro-Ministro, o ex-líder do seu
partido, no debate sobre o estado da Nação há um ano, em
Junho de 2001, porque, honra lhe seja, apesar de tudo era
intelectualmente mais honesto do que alguns Srs. Deputa-
dos: «Reconheço que há portugueses, como trabalhadores,
como consumidores, como empresários, com uma quebra
de confiança em relação ao que acontecia há tempos
atrás». E continuava o Eng.º Guterres: «Quebra de con-
fiança que não tem muitas vezes nada a ver com a situação
em concreto de cada um». A verdade é que ele já reconhe-
cia, há um ano atrás, em Junho de 2001, que estávamos
numa trajectória de quebra de confiança. Isto são dados
indesmentíveis e factuais!
22
I SÉRIE — NÚMERO 30
O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, peço-lhe
que termine.
O Orador: — Termino já, Sr. Presidente.
Sr. Deputado, por maior que seja a divergência política,
tem de haver um mínimo de seriedade e de honestidade
intelectual quando se debate para se poder debater com um
espírito construtivo.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. José Sócrates (PS): — Sr. Presidente, peço a
palavra para defesa da honra da minha bancada.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, qual é o motivo do
agravo?
O Sr. José Sócrates (PS): — Sr. Presidente, o Sr. Pri-
meiro-Ministro referiu-se à falta de honestidade com que
nos portámos no anterior governo e insistiu neste facto,…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
não?!
… por isso peço a V. Ex.ª, Sr. Presidente, para me conce-
der a palavra para defesa da honra da bancada.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
Dispõe, para o efeito, de 3 minutos.
O Sr. José Sócrates (PS): — Sr. Presidente, Sr. Pri-
meiro-Ministro, içar a voz crispado e zangado é próprio
de quem não tem razão e, pior, de quem está a perder o
debate.
Aplausos do PS.
Risos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Primeiro-Ministro não gostou de ouvir, pois
Mas sabe, Sr. Primeiro-Ministro, quanto a honestidade,
entre mim e si há uma diferença, é que eu nunca prometi
em campanha eleitoral uma coisa e, depois de estar em
funções executivas, fiz outra. Isso eu nunca fiz!
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — O Sr. Primeiro-Ministro não pode dizer
o mesmo. Ter honestidade política é sermos fiéis à nossa
palavra. O Sr. Primeiro-Ministro, infelizmente, em matéria
dos impostos, não pode dizer isso. E, quanto à honestida-
de, estamos conversados.
Aplausos do PS.
O Sr. Primeiro-Ministro não pode iludir as consequên-
cias para a economia que o discurso político tem. Um
Primeiro-Ministro tem de medir as suas palavras e os
senhores, todos os membros do Governo, não tiveram
consciência dos efeitos negativos, dos efeitos deprimentes
do discurso político negativista. E isso é da vossa inteira
responsabilidade! E basta olhar para os indicadores de
confiança, num momento, aliás, em que eles subiam na
Europa e desciam em Portugal.
O Sr. António Costa (PS): — Exactamente!
O Orador: — O Sr. Primeiro-Ministro não gostou
que eu lhe referisse a discrepância entre as previsões do
Banco de Portugal e as previsões da Sr.ª Ministra das
Finanças?! Mas porquê, se os senhores sempre criticaram
essa divergência?! Aliás, recordo-me de uma frase sua,
Sr. Primeiro-Ministro, proferida aqui na Assembleia:
«Não façam mais previsões, fiquem-se com as previsões
do Banco de Portugal!»
Aplausos do PS.
Ora, aqui está um bom conselho que o Sr. Primeiro-
Ministro podia seguir.
E a Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, que, aliás,
está ali tão caladinha, porque é que não se explica?! Por-
que é que não explica esta enorme divergência?
Protestos do PSD.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Expli-
quem vocês!
O Orador: — Agora já não acha que há incompetên-
cia, Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças?!
Protestos do PSD.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados do PSD, agradeço
que deixem o orador falar.
O Orador: — Ou acha que é mais difícil fazer previ-
sões?! É que não existe qualquer razão para a divergência,
porque a informação de que o Governo dispunha era a
mesma do Banco de Portugal. Poderíamos aceitar se,
entretanto, a situação tivesse evoluído e o Banco de Portu-
gal tivesse mais informação do que o Governo, mas tal não
aconteceu. A informação é exactamente a mesma, são
dados de Maio, que estavam já na posse do Governo.
Esta discrepância de previsões afecta ainda mais e mina
a confiança dos agentes económicos. Esta é uma questão
política relevante. E necessário dizer-lhe isto, Sr. Primeiro-
Ministro, para que V. Ex.ª perceba que os senhores são
responsáveis pelo afundamento dos indicadores de con-
fiança, e essa é uma das razões que explicam a actual
situação de estagnação económica.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr. Depu-
tado.
O Orador: — Termino já, Sr. Presidente.
Não fuja a essa responsabilidade, Sr. Primeiro-
Ministro, porque isso é feio.
Aplausos do PS.
10 DE JULHO DE 2002
O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a pala-
vra o Sr. Primeiro-Ministro, dispondo, para o efeito, tam-
bém de 3 minutos.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Depu-
tado José Sócrates, compreendo que V. Ex.ª queira falar
bem alto, por razões que têm a ver com o seu próprio par-
tido, mas deixe-me dizer-lhe o seguinte: quando chegámos
ao Governo, não sabíamos que o défice deste ano, do ano
de 2002, seria, se nada fizéssemos em contrário, cerca de
4,5%. Confesso que, de facto, não o antecipávamos; não o
prevíamos, nem nós, nem o Banco de Portugal! E VV.
Ex.as também nunca disseram que era dessa ordem a pesa-
da herança que deixavam ao novo governo. Esta é a única
razão pela qual tivemos de rever determinadas opções.
Esta é a verdadeira razão.
Mas, o que mais me surpreende no seu discurso, Sr.
Deputado, é que V. Ex.ª tem a desfaçatez e a falta de pudor
de estar a querer dar lições de economia e de finanças à
Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças,…
O Sr. Paulo Pedroso (PS): — E as suas previsões!?
O Orador: — … quando VV. Ex.as são responsáveis
por um défice que é cerca de quatro vezes superior àquele
que tinham apresentado.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Como é possível os senhores quererem apagar comple-
tamente o passado tão recente?! Não estamos a falar de
algo que se passou há 20, 10 ou 5 anos, estamos a falar de
algo que ocorreu há alguns meses atrás, de algo que os
senhores apresentaram não como previsão mas como ob-
jectivo, como Orçamento, de um défice do Estado de
1,1%, e, neste momento, estamos em risco…
O Sr. José Sócrates (PS): — De descer menos que a
União Europeia!
O Orador: — … de ter um défice que é quatro vezes
superior e que nos envergonha perante a Europa e perante
nós próprios. A questão é esta, Sr. Deputado!
Depois, V. Ex.ª diz: «É o seu discurso…!». Extraordi-
nária visão a sua! Então, o problema está no discurso de
quem denuncia a situação ou de quem criou a situação? E
quem criou a situação foi o governo irresponsável de que
V. Ex.ª fez parte, e, por isso, também tem culpa na situa-
ção pesada que este Governo herdou.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
É por isso, Sr. Deputado, que aquilo que me indigna é,
de facto, a falta de honestidade intelectual e política…
Vozes do PS: — Na resposta está a repetir a ofensa!
O Orador: — … que V. Ex.ª demonstra em quase
todas as suas intervenções.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra o Sr. Deputado Marco António Costa.
O Sr. Marco António Costa (PSD): — Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro, é com algum espanto que hoje, na
primeira vez que me dirijo a esta Câmara, assisto a um
debate sobre o estado da Nação cujo centro tem sido loca-
lizado nas questões económicas e financeiras do País e
vejo sentados tranquilamente na bancada do Partido Socia-
lista os dois dirigentes que, nos últimos anos, tiveram a
responsabilidade das contas públicas em Portugal, desig-
nadamente os Srs. Deputados Joaquim Pina Moura e Gui-
lherme d’Oliveira Martins.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Esses estão cala-
dos!
O Orador: — E espanta-me que tenha de ser o Sr.
Deputado José Sócrates, que teve a responsabilidade do
pelouro do ambiente no governo que cessou funções há
três meses — não há três anos mas, sim, há três meses —,
a vir pedir explicações à Sr.ª Ministra de Estado e das
Finanças sobre a situação financeira do País.
De facto, estamos perante uma situação, nunca vista,…
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Bizarra!
O Orador: — … de rever e de branquear a história e
de afastamento, de que não há memória na vida política
portuguesa, por parte de um grupo parlamentar e de um
grupo de ex-governantes, da sua responsabilidade política
relativamente ao estado do País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
É com manifesta apreensão, Sr. Primeiro-Ministro, que
ontem assisti a uma conferência de imprensa do Partido
Socialista, que introduziu uma inovação na vida política
portuguesa, a de pedir esclarecimentos ao Sr. Ministro das
Obras Públicas, Transportes e Habitação…
O Sr. José Magalhães (PS): — E muito bem!
O Orador: — … por ele fazer, por ele mandar execu-
tar e por ele dizer que é para realizar.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. José Magalhães (PS): — É uma fraude!
O Orador: — Aliás, sobre esta matéria, permita-me,
Sr. Primeiro-Ministro, que marque a diferença relativa-
mente ao passado, é que o senhor não anunciou obras só
para uma região do País, o senhor anunciou um pacote de
obras para todo o País, com sentido de equilíbrio e de
coesão nacional.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
24
I SÉRIE — NÚMERO 30
Lamento que hoje, nesta Câmara, tenha ouvido falar no
debate de urgência acerca da lei de eficácia fiscal. Pergun-
to: onde estava o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues
nos últimos seis anos? Onde estavam os senhores Deputa-
dos do Partido Socialista nos últimos seis anos para não
terem tido a oportunidade de, nesta Câmara, apresentar as
propostas políticas que agora, com urgência, querem deba-
ter?
Vozes do PS: — Faça as perguntas ao Primeiro-
Ministro!
O Orador: — E pergunto ainda: onde estava o Partido
Socialista, Sr. Primeiro-Ministro, e onde estavam os res-
ponsáveis máximos do Partido Socialista enquanto a tele-
visão pública se afundava e eles nada faziam para resolver
a situação?
Estas são as questões que o povo português quer ver
respondidas antes de nós, PSD, começarmos a prestar
contas daquilo que é a nossa acção política.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Portanto, seria importante que, hoje e aqui, o Partido
Socialista, no primeiro debate sobre o estado da Nação
após a sua saída do governo, viesse explicar a esta Câmara
como deixou o País, para que, depois, todos nós pudésse-
mos entender aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro, com
grande clareza, aqui nos disse, ou seja, o que estamos a
fazer, nestes três meses, para tirar o País do «buraco» em
que o PS o deixou.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que ter-
mine.
O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
O Sr. Primeiro-Ministro anunciou a criação da agência
portuguesa de investimento, mas esta mensagem não pas-
sou, porque, nessa altura, mais uma vez, a bancada da
oposição criou um facto político para impedir que ela
passasse. Por isso, pergunto-lhe, muito concretamente, em
que consiste a agência portuguesa de investimento e por-
quê a sua localização no norte do País.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, o Sr. Primeiro-
Ministro informou a Mesa que responderá a bloco de 3
pedidos de esclarecimentos,…
O Sr. José Magalhães (PS): — Ah!… Agora, respon-
dem em bloco!
O Sr. Presidente: — … porque tem de gerir o tempo
atribuído ao Governo, que já é escasso.
Assim, para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr.
Deputado Nuno Teixeira de Melo.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Sr. Presi-
dente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Secretá-
rios de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: É sabido como a
minha bancada combateu a regionalização. Também é
sabido, como, em referendo, vencemos, nomeadamente ao
Partido Socialista, esta batalha.
O Sr. Artur Penedos (PS): — Venceram o quê?!
O Orador: — Mas combatemos a regionalização no
pressuposto de que, na sequência da vitória, se seguiria o
necessário processo de descentralização.
O Partido Socialista, derrotado, aceitou a derrota, como
lhe competia, de resto, e prometeu, desde logo, essa des-
centralização. Só que a verdade é que, à imagem do que
sempre faz, nunca a cumpriu, nunca a promoveu, nem no
primeiro mandato do Engenheiro António Guterres, após o
referendo da regionalização, nem no segundo mandato do
Engenheiro António Guterres, apesar de, com grande pom-
pa e circunstância, a anunciarem no respectivo programa
eleitoral, de que, certamente, estarão lembrados, porque
faziam parte da equipa.
Protestos do PS.
Pois bem, Sr. Primeiro-Ministro, também no Governo a
que V. Ex.ª preside, melhor — é certo! — do que o do
Engenheiro António Guterres, prometeu cumprir a descen-
tralização política, administrativa e financeira. Também
isto consta do Programa do XV Governo Constitucional.
Deste mesmo Programa consta igualmente uma série de
medidas essenciais que passam pela transferência de novas
atribuições e competências às autarquias locais, pelo refor-
ço das competências das associações de municípios,…
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — … por várias medidas no domínio do
abastecimento público, no plano do ordenamento do terri-
tório e mesmo de criação de novas áreas metropolitanas,
de que, de resto, V. Ex.ª levantou, hoje e aqui, o véu.
Na verdade, hoje, V. Ex.ª confirmou a intenção descen-
tralizadora deste Governo, com a apresentação de medidas
concretas — medidas que, naturalmente, por as desejarmos
e por as termos prometido, saudamos!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — E saudamos, porque é nos respectivos
municípios que melhor se conhecem os problemas das
populações!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — É nos respectivos municípios que se re-
solvem os problemas das populações!
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — É nos respectivos municípios que me-
lhor se prestam contas, caso sejam ou não resolvidos os
problemas dessas mesmas populações!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — É isso mesmo!
10 DE JULHO DE 2002
O Orador: — Em todo o caso, Sr. Primeiro-Ministro
— e com isto termino —, importa esclarecer alguns aspec-
tos que nos parecem particularmente importantes.
Desde logo, no tempo, porque de tempo se trata: para
quando podemos esperar, em concreto, as medidas que V.
Ex.ª, hoje, aqui anunciou e, porventura, outras?
Outro aspecto importante é o de saber se o Governo
estará a ponderar…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o seu tempo esgo-
tou-se. Peço-lhe que conclua.
O Orador: — Sr. Presidente, se me conceder mais
alguns segundos, vou terminar.
Sr. Primeiro-Ministro, está a ser ponderada a necessi-
dade de se transferirem para as autarquias não apenas mais
competências, que, de resto, de certo modo são desejadas,
mas também meios, ou seja, competências políticas e
administrativas e também competências financeiras.
Finalmente, pergunto se este processo descentralizador
implicará em algum momento um aumento da despesa
global, ou se, pelo contrário, implicará, como é desejável,
uma maior racionalização dessa mesma despesa. Numa
palavra, Sr. Primeiro-Ministro: podemos contar com a
verdadeira descentralização política, administrativa e fi-
nanceira?
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Sr.
Primeiro-Ministro, o Governo decidiu, como uma das suas
primeiras orientações, decretar a instabilidade dos traba-
lhadores e das suas famílias nas suas vidas. E fê-lo em
concreto, em primeiro lugar, em relação aos trabalhadores
da Administração Pública, anunciando dezenas de milhares
de despedimentos, pela não renovação de contratos, crian-
do um quadro de supranumerários, de excedentários, em
que quer colocar muitos milhares de trabalhadores da Ad-
ministração Pública, ameaçando com a licença forçada,
sem vencimento, para os trabalhadores que não queiram
cumprir determinados ditames, e dizendo até que, se ao
fim de 90 dias não houver colocação dos que estão neste
quadro de supranumerários, imediatamente se lhes reduzirá
o seu vencimento em um sexto.
O Governo decretou, com isto, a instabilidade da vida
destes trabalhadores e, com esta matéria, faz um dos mais
poderosos ataques à vida dos trabalhadores da Administra-
ção Pública, aos seus direitos, com consequências graves
para a sua vida e para os próprios serviços públicos,…
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — … que, em tantos casos, deles precisam,
como se está a verificar em muitos pontos da Administra-
ção Pública.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Ora aí está!
O Orador: — Mas não só! O Governo quer generali-
zar esta instabilidade a todos os trabalhadores do sector
privado, para além dos baixos salários, em contraste com o
aumento do custo de vida, para além das reformas degra-
dadas, designadamente, na função pública. O Governo
quer alargar a precariedade no sector privado, quer, dizen-
do que não há liberalização dos despedimentos, fazer tudo
o resto: alterar os horários, o trabalho a tempo parcial, os
vínculos, precarizando-os, dando, desta forma, resposta a
todas as reivindicações do patronato, seja ele português ou
de qualquer outra nacionalidade. O que o Governo propõe
é mais instabilidade, e decreta-a!
O Sr. Primeiro-Ministro invoca a necessidade de mais
competitividade para justificar estas medidas. Mas é ou
não verdade que, durante décadas, temos tido este modelo
de baixos salários, a exploração da mão-de-obra e que este
modelo é um incentivo à não modernização das empresas,
à não inovação tecnológica, e que a manutenção deste
modelo não tirará o País deste atraso no desenvolvimento.
Aliás, bem poderíamos diminuir mais os salários, por essa
ordem de ideias! Até poderíamos criar um salário máximo
nacional, para que não houvesse falta de competitividade
nessa matéria, porque o que estaríamos a fazer seria a criar
uma miséria competitiva dos trabalhadores, que é aquilo
para que o seu Governo quer empurrar a sociedade portu-
guesa.
Vozes do PCP: — Exactamente!
O Orador: — De resto, Sr. Primeiro-Ministro, se fala
das multinacionais, lembre-se de que, quando era Deputa-
do do PSD, aprovou, nesta Assembleia, um projecto de
resolução, da nossa iniciativa,…
O Sr. Honório Novo (PCP): — Bem lembrado!
O Orador: — … que previa medidas de controlo para
aquilo que as multinacionais fazem quando se deslocali-
zam do nosso País,…
Vozes do PCP: — Já se esqueceu?!
O Orador: — … que permitia e propunha o controlo
dos dinheiros públicos que lhes são dados, que permitia e
propunha multas quando as contratualizações por eles
assumidas não fossem cumpridas…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o seu tempo esgo-
tou-se, tem de terminar.
O Orador: — Vou terminar, Sr. Presidente.
Por tudo isto, Sr. Primeiro-Ministro, esta situação não
pode passar em claro. E digo-lhe, não em tom intimista,
como aquele com que o Sr. Primeiro-Ministro nos brindou,
nem sou capaz de preparar o espontâneo encostar de coto-
velo à tribuna, mas com frontalidade, que se o Sr. Primei-
ro-Ministro diz que «temos de saber de onde vimos para
saber para onde vamos», nós dizemos que sabemos de
onde o Governo vem e sabemos para onde vai, e que o
País não pode ir por aí!
Aplausos do PCP.
26
I SÉRIE — NÚMERO 30
O Sr. Presidente: — Para responder aos pedidos de
esclarecimentos que lhe foram formulados pelos Srs.
Deputados Marco António Costa, Nuno Teixeira de Melo
e Bernardino Soares, tem a palavra o Sr. Primeiro-
Ministro.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr. Depu-
tado Marco António Costa, agradeço as suas palavras e
aproveito para dizer que essa agência portuguesa para o
investimento, que estamos a preparar, é um dos instrumen-
tos com o qual mais contamos para fomentar o investimen-
to, quer externo, quer interno. Neste momento, estamos a
preparar os estatutos, em moldes inovadores.
Pensamos que é, exactamente, no fomento do investi-
mento e das exportações que está a chave para encontrar
um novo modelo de desenvolvimento, para evitar o tal
modelo de desenvolvimento assente nos baixos salários e
na não qualificação da nossa produção. E estamos a prepa-
rar com cuidado, com extremo rigor essa agência portu-
guesa para o investimento, reestruturando toda a nossa
diplomacia económica e procurando também unir essa
agência portuguesa de investimento à acção que actual-
mente é desenvolvida pelo ICEP, procurando ligar a acção
interna à acção também que é desenvolvida através dos
nossos postos e missões no estrangeiro para a promoção da
imagem de Portugal e a captação de investimento estran-
geiro.
A razão pela qual decidimos que a sede dessa agência
fosse no Porto tem a ver com a minha convicção de que o
País não é só Lisboa.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Não estamos neste momento em fase de criar muitos
institutos ou agências, pelo contrário.
Vozes do PS: — Ah!…
O Orador: — De qualquer forma, já dei indicações no
sentido de aqueles institutos que forem criados, como este,
através da reestruturação de outros já existentes, serem
sediados fora de Lisboa. E penso que aqui também há uma
homenagem ao Porto, às gentes do norte, à iniciativa em-
presarial, ao trabalho, quando decidimos — e bem! —
sediar a agência portuguesa para o investimento naquela
que é uma das cidades mais dinâmicas do País, porque
acredito e entendo que Portugal, enquanto estiver sacrifi-
cado à macrocefalia de Lisboa, não será um País plena-
mente desenvolvido, como queremos que ele seja!
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo,
agradeço-lhe as questões que colocou e devo dizer-lhe que
acredito na descentralização.
É curioso que o anterior governo falava tanto na pró-
pria regionalização, mas, uma vez «chumbada» essa regio-
nalização, pela vontade dos portugueses, não apresentou
qualquer projecto de verdadeira descentralização ou des-
concentração, pelo contrário. Lembram-se da ideia? A
memória, de facto, é curta, mas não pode ser tão curta
assim! A ideia foi a de criar os tais comissários regionais,
directamente dependentes do Primeiro-Ministro.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Exacto!
O Orador: — A nossa proposta é exactamente a con-
trária: que os responsáveis das comissões de coordenação
regional sejam eleitos pelos presidentes de câmara.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Exacto!
Risos do PS.
Nós acreditamos na liberdade, na iniciativa e num po-
der mais plural.
Aplausos do PSD e do CDS-PP:
O Sr. Presidente: — Sr. Primeiro-Ministro, o seu tem-
po esgotou-se. Tem de concluir.
O Orador: — Sr. Presidente, fui informado de que dis-
punha de 5 minutos, para poder responder aos três pedidos
de esclarecimentos.
O Sr. Presidente: — Tem toda a razão, Sr. Primeiro-
Ministro. Peço desculpa.
Faça favor de prosseguir.
O Orador: — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Em relação à descentralização, com certeza que aqui-
lo que aqui vos anunciei em linhas gerais, e que vai ser
concretizado em termos de diplomas, aprovados em Con-
selho de Ministros, ainda durante este mês, fica sujeito à
cooperação, pelo menos em grande parte, naquilo que diz
respeito às autarquias, da Associação Nacional de Muni-
cípios Portugueses. Este é um desafio que também lan-
çamos ao poder local, que queremos com mais compe-
tências, mas com os recursos financeiros, com a «mochi-
la» financeira…
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — … para levar a cabo essas competências.
Estou seguro de que, se for esta a vontade das autarquias
portuguesas, faremos, ao longo desta Legislatura, uma
«revolução silenciosa», que vai alterar muito sensivelmen-
te as questões da relação entre poder central e poder local,
no nosso País.
Sr. Deputado Bernardino Soares, se, por falta de com-
petitividade da nossa economia, houver trabalhadores no
desemprego, a quem eles irão pedir contas não é ao senhor
mas a mim!
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Por isso é que vou tomar todas as medi-
das, como Chefe do Governo, para garantir a Portugal
melhores condições de competitividade. Se seguisse a sua
via, aumentaria drasticamente o desemprego; se eu procu-
10 DE JULHO DE 2002
rasse promover a rigidez da legislação do trabalho, então
aumentaria drasticamente o desemprego, afastaríamos
todos os investidores privados.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — A nossa discordância, neste ponto, é to-
tal e absoluta. Não há qualquer hipótese de concordarmos
nessa via!
Protestos do PCP.
Não há emprego sem empresas! Não há futuro para os
trabalhadores sem empresas saudáveis! E VV. Ex.as ainda
continuam a pensar em termos do modelo clássico, do con-
flito de classes na empresa, entre patrões e empregados,…
Protestos do Deputado do PCP Jerónimo de Sousa.
… quando aquilo que nos interessa, a todos nós, é que
haja de facto uma cooperação entre empregadores e tra-
balhadores,…
O Sr. Machado Rodrigues (PSD): — Muito bem!
O Orador: — … porque só assim é que teremos
empresas saudáveis e só assim é que poderemos garantir
melhores condições aos trabalhadores portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): — Vai perder! Vai
perder a maioria, como Cavaco Silva e outros perderam! Já
tiveram maiores maiorias e perderam!
Risos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a
palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda, que dispõe, para o
efeito, de 3 minutos.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr. Pri-
meiro-Ministro, reparei na forma como se dirigiu às várias
bancadas da oposição: umas vezes, com ameaças vela-
das;…
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh!…
O Orador: — … outras vezes, com sobranceria;…
Risos do PSD e do CDS-PP.
… outras, ainda, com uma pseudocondescendência.
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Muito bem!
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O Orador: — Vi, até, como, a partir deste Parlamento,
fez também ameaças veladas…
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Oh!…
O Orador: — … à resistência social, legal e constitu-
cional,…
Risos do PSD e do CDS-PP.
… e isto permite-me identificar alguns traços da sua con-
duta e do seu Governo.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Agora é
psicanalista!
O Orador: — Em primeiro lugar, um Governo de con-
fronto, que sempre o assumiu e para o qual estávamos
preparados. Mantém-se nesse desígnio, de um Governo de
confronto!
Em segundo lugar, quero dizer-lhe, Sr. Primeiro-
Ministro, no que à minha bancada concerne, que não tem
nem estatura moral,…
Protestos do PSD.
… nem estatura política, nem percurso coerente, para nos
deixar lições sobre a nossa actividade política.
O Sr. João Teixeira Lopes (BE): — Muito bem!
O Orador: — E muito menos, e esta talvez seja uma
terceira condição — e talvez não a dissesse se não fosse o
seu estilo do debate… Nos últimos dias, o Sr. Primeiro-
Ministro fez uma confissão, que raramente um político faz
e que, seguramente, um político com experiência não
deveria fazer, a de que não sabe explicar as medidas que
toma.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Quer mais expli-
cado ainda?! Só se for com um desenho!
O Orador: — Esta é, de facto, uma confissão extraor-
dinária. E vem o Sr. Primeiro-Ministro, aqui, procurar dar
algumas explicações… Sr. Primeiro-Ministro, não aceita-
mos explicações do explicador que, reconhecidamente,
falhou na explicação das suas medidas.
A dificuldade que o povo português tem em entender
as suas medidas, apesar de todos os seus esforços propa-
gandísticos, resulta do facto de realmente não se coaduna-
rem nem com as promessas eleitorais nem com o ambiente
de confiança que era suposto ser gerado no País, de acordo
com as expectativas que a maioria de direita quis trazer ao
debate político.
Sr. Primeiro-Ministro, faço duas perguntas muito claras
e incisivas.
O Sr. Primeiro-Ministro disse-nos hoje, aqui, no seu
discurso — e foi a novidade do dia —, que vai propor um
pacto social. Este pacto social, ao que se percebe, traz
como cabeçalho a exigência da liberalização da legislação
laboral, por parte das confederações patronais e das multi-
nacionais, que já a estão a exigir publicamente.
Como não é crível que consiga obter nesta matéria uma
concertação de todas as partes, porque aquilo que traz é, à
partida, a cedência em relação à legislação laboral, à esta-
bilidade no emprego da maior parte dos trabalhadores
28
I SÉRIE — NÚMERO 30
portugueses, devo concluir — dir-me-á se «sim» ou «não»
— que, falando de números, o debate político ainda não
passou, por enquanto, de um número, para que as dificul-
dades de constituir uma maioria orçamental para o Orça-
mento do ano que vem não sejam tão visíveis na opinião
pública e no debate político. Será, ou não, também um
número político?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o seu tempo esgo-
tou-se. Peço-lhe que conclua.
O Orador: — Concluo já, Sr. Presidente.
Para terminar, o Sr. Primeiro-Ministro também nos
falou da lei de imigração como uma reforma. Esta lei «em-
purra» para uma política de expulsões dezenas de milhar
de imigrantes. O «espectro» do lado esquerdo do Parla-
mento contesta essa expulsão de imigrantes, a Igreja cató-
lica também. O Sr. Ministro da Administração Interna tem-
nos dito coisas contraditórias.
Sr. Primeiro-Ministro, vai expulsar imigrantes ou vai
encontrar uma forma de regularização extraordinária dessa
imigração?
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Também para pedir esclarecimen-
tos, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Pri-
meiro-Ministro, enquanto os senhores estiveram na oposi-
ção, os partidos da actual maioria, ambos, mostraram-se
muito preocupados com os problemas da segurança e da
autoridade do Estado, tratava-se mesmo uma grande «ban-
deira» eleitoral de ambos os partidos.
Sr. Primeiro-Ministro, qual é a situação actual em
matéria de segurança dos cidadãos?
É certo que os problemas da segurança estão menos
mediatizados, mas também é certo que eles não desapare-
ceram. É verdade que os problemas estão menos mediati-
zados não por se terem alterado mas, fundamentalmente,
por os senhores, que usavam e abusavam de um discurso
demagógico em torno dos problemas da segurança, deixa-
ram de o fazer.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — É por esta razão que os problemas estão
menos mediatizados.
O discurso do PSD e do CDS-PP, partidos que faziam
eco de uma certa histeria securitária, deu lugar a um silên-
cio absoluto da vossa parte, acerca dos problemas da segu-
rança. Os senhores agitaram esses problemas até à exaus-
tão e agora, pura e simplesmente, fazem de conta que eles
não existem — não vimos uma única referência a estes
problemas na intervenção do Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — O CDS-PP nem
fala!
O Orador: — Em matéria de autoridade do Estado, as
notícias recentes que tivemos não são brilhantes e preocu-
pam-nos. Não fazemos juízos precipitados sobre actuações
policiais recentes, entendemos que tudo deve ser esclareci-
do — o Governo prometeu-nos esses esclarecimentos e
aguardamos serenamente pelos mesmos. Nós não conde-
namos ninguém antecipadamente,…
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Fazem muito bem!
O Orador: — … mas ficamos preocupados. E nós, que
não gerimos as nossas preocupações em função de ciclos
eleitorais, como os senhores fazem, temos consciência de
que os cidadãos têm preocupações justas em relação à sua
segurança.
Temos consciência de que os níveis de insegurança não
diminuíram — todos os estudos sobre as preocupações dos
cidadãos apontam neste sentido —, e o Governo calou-se e
não tomou uma única medida positiva para melhorar as
condições de segurança dos cidadãos portugueses. Pelo
contrário, o Governo, em vez de prosseguir uma política
de combate à droga, que é necessária, tem a intenção de
poupar dinheiro com a fusão do Serviço de Prevenção e
Tratamento da Toxicodependência (SPTT) e do Instituto
Português da Droga e da Toxicodependência (IPDT), sem
demonstrar como é que isso se faz e sem ter consciência
das eventuais consequências negativas que essa opção
poderá ter no combate à droga.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Os senhores, em vez de uma política de
legalização e de inserção social dos imigrantes, apresentam
uma proposta de lei que lançará mais imigrantes na ilegali-
dade e na marginalidade — é isto que vemos por parte do
Governo!
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador. — Pergunto, Sr. Primeiro-Ministro, que
medidas é que o seu Governo tomou para melhorar a segu-
rança dos cidadãos. Onde é que está o célebre subsídio de
risco? V. Ex.ª já se esqueceu de que, aquando do assassi-
nato de um agente da PSP na Damaia, altura em o senhor
estava na oposição, se indignou por o governo da altura ter
recusado o subsídio de risco que o PSD propôs, dizendo
que se fosse pelo PSD já havia subsídio de risco?!
Vozes do PCP: — Bem lembrado!
O Orador: — Sr. Primeiro-Ministro, pergunto-lhe no-
vamente: onde está o subsídio de risco, cuja falta tanto
lamentou?
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): — Já se esqueceu!
O Orador: — Que medidas é que estão previstas, Sr.
Primeiro-Ministro, para alterar o dispositivo policial,
adaptando-o às necessidades de prevenção da criminali-
dade.
10 DE JULHO DE 2002
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, tem de concluir,
pois o seu tempo já se esgotou.
O Orador: — Sr. Primeiro-Ministro, até à data, não
vimos absolutamente nada e, de duas, uma: ou Governo
não faz, porque entende que está tudo feito e que não é
preciso fazer mais nada nesta matéria, ou o Governo não
faz, porque, apesar de tudo o que andou a dizer, não tem
capacidade para pôr em prática uma política capaz de
melhorar as condições de segurança e de tranquilidade dos
cidadãos!
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Primeiro-
Ministro para responder.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, o Sr. De-
putado Luís Fazenda destacou, e bem, como sendo muito
importante nas minhas propostas, o acordo social. Há, de
facto, uma diferença entre nós em relação ao acordo social:
V. Ex.ª não acredita nas virtudes da concertação social, eu
acredito nas virtudes da concertação social.
O Governo quer promover a concertação social. O Go-
verno vai fazer os possíveis, aquilo que estiver ao seu
alcance, para que haja compromissos do lado dos trabalha-
dores e dos empresários, porque entendemos que é útil
para o País que se aceitem alguns esforços, durante algum
tempo, na certeza de que eles serão recompensados na fase
seguinte. E aquilo que oferecemos aos trabalhadores por-
tugueses e, em geral, a todos os agentes económicos é
precisamente a possibilidade de um acordo plurianual. Não
vamos, como acontecia no passado, apresentar em cada
ano valores irrealistas para a inflação e propor salários
abaixo daquilo que virá a ser a inflação; pelo contrário,
vamos assumir, durante algum tempo, alguns esforços, na
certeza de que esses esforços serão compensados a médio
prazo.
Portanto, aqui temos uma diferença, que é a nossa filo-
sofia: o ponto de partida em relação às virtudes da concer-
tação social. Quero assegurar-lhe de que o Governo irá de
boa fé para esse exercício de concertação social e fará
aquilo que depende de si próprio — não foge às suas res-
ponsabilidades!
Depois, V. Ex.ª disse que este é um Governo de con-
fronto. Eu até preferia que dissesse mesmo que é um Go-
verno de combate.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Somos um Governo de combate às difi-
culdades, de combate aos bloqueios, de combate aos inte-
resses instalados! Sabemos que quando se procura fazer
reformas num país há sempre movimentos de contra-
reforma, e VV. Ex.as estão do lado da contra-reforma, estão
do lado daqueles que não querem as reformas que podem
bulir contra factores de rigidez no tecido económico, con-
tra algumas corporações instaladas. Sempre que há vonta-
de reformadora no País surgem, com os argumentos mais
diversos, com as desculpas mais díspares, aqueles que
querem, a todo o custo, opor-se à reforma, sobretudo quan-
do esta toca em determinados interesses instalados e pro-
cura reduzir a despesa pública.
Somos, pois, um Governo de combate às dificuldades,
ao atraso, à miséria no nosso país! Mas não confunda a
nossa firmeza e a nossa convicção, a firmeza e a convicção
do Governo e da maioria que o apoia, com arrogância ou
falta de respeito institucional! Pelo contrário, e já aqui o
demonstrámos, somos o Governo que tem mostrado mais
respeito por esta Assembleia da República, que tem feito
tudo para assegurar uma boa cooperação institucional com
a Assembleia da República, com o Presidente da República
e com todos os outros órgãos de soberania! VV. Ex.as
pensam que isto nos levaria ter menor firmeza e determi-
nação no nosso combate, e não é este o caso.
O Sr. Deputado António Filipe poderia ser a minha
melhor testemunha nesta questão. Li com muita atenção o
seu livro sobre os trabalhos parlamentares — é talvez o
melhor livro publicado, em Portugal, sobre a evolução nas
relações governo/oposição —, e tenho a certeza de que se
o Sr. Deputado António Filipe fizer uma nova edição, vai
chegar à conclusão extraordinária de que, desde o 25 da
Abril até hoje, o governo com mais presença, mais partici-
pação e mais cooperação com a Assembleia da República é
este Governo, é o Governo desta maioria.
Risos do PS e do PCP.
Por isso é que o Sr. Deputado António Filipe, que é um
especialista de Ciência Política, que já escreveu sobre estas
coisas, não tocou neste assunto, porque sabe que nesta
matéria não podia criticar o Governo, e foi buscar a ques-
tão da polícia.
Sr. Deputado, deste Governo nunca irá ouvir uma pala-
vra a desautorizar a polícia. Sem autoridade (autoridade
democrática, claro!) não há exercício da liberdade, e nós
apoiamos a polícia nas suas tarefas de defesa da ordem
pública. Se há, ou houve, algum erro ou excesso, apure-se
o responsável. Mas, em geral, este Governo está por detrás
da sua polícia, acreditando nela, que é uma instituição ao
serviço do Portugal democrático, e deste discurso não
abdicamos.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PCP: — E o subsídio de risco?
O Orador: — É a autoridade que garante a segurança
dos cidadãos, e é essa segurança que queremos promover.
Por isso, o Governo tem, quanto a isto, a posição, equili-
brada e séria, que se exige a um governo responsável:
fazer os inquéritos que são necessários fazer, se houver
algumas queixas, mas também apurar as responsabilidades,
sem pôr em causa as instituições.
Eu quero só dizer-vos (e termino já, Sr. Presidente)
que, em relação a um caso que foi muito noticiado pela
comunicação social, o da Costa da Caparica, que ele está a
ser investigado pelas entidades competentes.
Vozes do PCP: — Responda à questão dos subsídios
de risco!
30
I SÉRIE — NÚMERO 30
O Orador: — Ouvi muitas pessoas a falar dos exces-
sos (a comunicação social deu, naturalmente, cobertura a
isso), mas não ouvi ainda falar, por exemplo, das centenas
de assinaturas que nos chegaram, de anónimos, de comer-
ciantes, de homens, de mulheres e de crianças, dizendo que
apoiam a intervenção da polícia e agradecendo aquilo que
ela fez para garantir a sua segurança!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PS: — Quanto ao subsídio de risco disse
«zero»!
O Sr. Presidente: — A lista dos oradores inscritos,
para formularem pedidos de esclarecimentos ao Sr. Primei-
ro-Ministro, está esgotada.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, peço a
palavra.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, para
interpelar a Mesa, porque, provavelmente por lapso, o Sr.
Primeiro-Ministro não respondeu à questão que formulei
sobre o subsídio de risco para a polícia.
Risos do PCP.
Vozes do PS: — Foi um lapso!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o Sr. Primeiro-
Ministro respondeu e o Sr. Deputado tira as conclusões.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Dá-me licença, Sr. Presi-
dente?
O Sr. Presidente: — Faça favor.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, a questão
é clara: temos um programa de legislatura. Está no Pro-
grama do Governo, e será cumprido esse compromisso que
temos para com os portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Honório Novo (PCP): — Vai ser cumprido a 15
dias das próximas eleições!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a pala-
vra o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues.
O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presi-
dente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados: Existe uma
generalizada convicção na sociedade portuguesa de que o
nosso país atravessa uma situação difícil; uma situação
difícil que possui várias expressões concretas.
Em primeiro lugar, ameaça-nos o risco de uma reces-
são económica, cuja profundidade, intensidade e conse-
quências são dificilmente previsíveis.
Em segundo lugar, defrontamos uma conjuntura inter-
nacional adversa, onde tardam a surgir os sinais claros de
recuperação económica num mundo ameaçado, igualmen-
te, por focos de tensão política de grande sensibilidade
para essa mesma recuperação económica.
Em terceiro lugar, temos perante nós uma exigente
agenda de compromissos no domínio europeu, seja no
plano do equilíbrio orçamental, seja no da aplicação dos
fundos estruturais, seja no da reforma da política agrícola,
que só serão superados por uma mobilização nacional clara
e decidida.
Finalmente, registamos índices de desconfiança nos
agentes económicos e sociais de uma gravidade sem para-
lelo, índices de desconfiança e de desalento que, precisa-
mente, são o maior inimigo dessa necessária mobilização
do melhor do nosso esforço colectivo.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Gostaria de, apesar deste quadro realista
de enorme preocupação, afirmar claramente a minha con-
vicção de que o nosso País tem forças e agentes económi-
cos capazes de ultrapassar estas dificuldades, como já no
passado o fizemos ao defrontar situações de crise.
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Orador: — Possuímos, em todos os sectores de acti-
vidade, empresas que se souberam modernizar e competir
de igual para igual nos mercados mais competitivos.
Saem hoje das nossas universidades dezenas de milha-
res de jovens que, ainda que com défices de formação e
desajustamentos face às necessidades do mercado, consti-
tuem um capital de mudança, de que nunca dispusemos no
passado.
Realizámos investimentos no nosso sistema de ciência
e tecnologia que esperam por ser devidamente valorizados
pelo conjunto da nossa sociedade.
O País modernizou e moderniza a sua rede de acessibi-
lidades, de uma forma que pode despertar para o progresso
regiões que se vinham afundando num ciclo de empobre-
cimento relativo.
Mas, para que estas forças de mudança possam ser va-
lorizadas, é necessário vencer o clima de desânimo que se
instalou profundamente na nossa sociedade, especialmente
nos últimos meses, é necessário inverter rapidamente os
índices de desconfiança que caíram para os seus níveis
mais baixos de há muito a esta parte. É necessário recupe-
rar a esperança.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Depu-
tados: Infelizmente, não posso afirmar que o impulso para
essa recuperação da esperança venha de onde, em primeiro
lugar, ele deve vir: do Governo e do Sr. Primeiro-Ministro.
O Sr. José Sócrates (PS): — Muito bem!
O Orador: — São já muitos os portugueses, muito
provavelmente uma considerável maioria, que consideram
10 DE JULHO DE 2002
que o vosso Governo, a vossa maioria, a vossa liderança,
Sr. Primeiro-Ministro, não estão à altura dos desafios que
Portugal enfrenta.
Aplausos do PS.
Assumo, sem qualquer dúvida, que está o País e está o
Governo perante problemas difíceis, que a consolidação
orçamental é exigente e que a conjuntura externa não nos
favorece. Mas também é verdade que o Sr. Primeiro-
Ministro tinha condições muito positivas para a governa-
ção: pela primeira vez, em muitos anos, uma maioria clara
nesta Câmara, uma indiscutível lealdade e colaboração
institucional do Sr. Presidente da República, uma postura
construtiva do maior partido da oposição…
Risos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não seja
ridículo!
O Orador: — … e a expectativa do eleitorado, sempre
generosa quando se forma um novo governo.
Aplausos do PS.
E foi esta expectativa positiva, elemento essencial para
o êxito de qualquer política, que o Sr. Primeiro-Ministro
desbaratou a uma velocidade e com uma profundidade
verdadeiramente invulgares.
Aplausos do PS.
Tenho afirmado, e gostaria de hoje o deixar de novo
bem expresso, que V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, tinha
dois caminhos possíveis para lançar as bases da sua gover-
nação, tinha duas tácticas ao seu dispor: procurar consen-
sos alargados, na sociedade portuguesa e no Parlamento,
para algumas das áreas mais sensíveis da governação,
consensos mínimos que dessem ao País um sinal de mobi-
lização para responder a difíceis exigências conjunturais e
estruturais; ou, então, seguir uma política de confronto
sistemático, de ser mais oposição a um Governo que já não
existe do que a um efectivo Governo da Nação, de gover-
nar contra os socialistas, culpabilizando-os pelo passado,
pelo presente e pelo futuro, como preocupação principal e
obsessiva da sua táctica política.
Aplausos do PS.
Foi este o caminho escolhido, e não creio que tenha
sido o melhor caminho.
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Orador: — Também por isso, o País vive hoje um
clima de desnecessária crispação, de desalento, de descon-
fiança, porque a política que o Governo começou por ten-
tar concretizar tem hoje profundas responsabilidades pelo
agravamento da situação económica e social e, especial-
mente, pelo clima negativo que vivemos.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Optou inicialmente o Governo por uma
dramatização da situação do País tão claramente excessiva
que, se se pretendia, como foi claro, prolongar a oposição
ao PS e criar o clima para medidas políticas impopulares,
apenas foi capaz de conduzir o País à descrença e a um
perigoso estado de anemia.
Aplausos do PS.
Mas o que mais fortemente contribuiu para descredibi-
lizar a actuação do Governo de V. Ex.ª foi a precipitação
da grande maioria das iniciativas políticas e legislativas, a
sua inconsistência e fragilidade.
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Orador: — Foi a forma como o Governo se relacio-
nou, desde o primeiro momento, com a Administração
Pública, que quebrou um laço de confiança fundamental
para bem gerir; foi a forma arrogante e precipitada como
procurou gerir o caso RTP, que mostrou que o Governo
não estava, excessivas vezes, à altura da postura de Estado
que se lhe exige.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Como não o estava, quando afastou de
funções públicas, sem respeito e sem decoro, personalida-
des que apenas cometeram o pecado de não apoiar a actual
maioria.
Protestos dos Deputados do PSD Fernando Pedro
Moutinho e Guilherme Silva.
Foram as opções económica e socialmente erradas, que
marcaram o estilo do Governo desde o seu primeiro mo-
mento, como o aumento do IVA ou o corte na bonificação
do crédito à habitação, que transmitiram a ideia de ausên-
cia de rumo e de inconsistência das políticas.
Ainda hoje alguém acredita que a mudança da política
de crédito à habitação, da forma como foi feita, trouxe algo
de significativamente positivo para as contas públicas, para
o clima económico ou para as expectativas sociais?! Ainda
hoje há alguém que defenda isto?!
Aplausos do PS.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Já estão a
descer os preços!
O Orador: — Foi também a perigosa imagem de des-
coordenação e de falta de verdade que a acção governativa
transmitiu, em momentos como as alterações à lei da tele-
visão, a polémica em torno das dívidas fiscais ou os inci-
dentes na fronteira espanhola, que deram deste Governo
mais uma imagem de cansaço e envelhecimento do que de
determinação e vontade. Só, aliás, assim se compreende a
diferença de idades entre o Primeiro-Ministro e o Deputa-
do Francisco Louçã. É a única forma de compreender isto!
32
I SÉRIE — NÚMERO 30
Aplausos do PS.
Risos do BE.
Mas, se os sinais dados pelos primeiros meses de Go-
verno se foram rapidamente traduzindo no agravamento
das expectativas e do nível de confiança dos portugueses, é
justo dizer que o Governo se deu conta dessa realidade,
provavelmente alertado pelas preocupações publicamente
expressas por tantos dos seus apoiantes. No entanto, tam-
bém aqui não podemos dizer que a resposta esteve melhor
do que o problema. Dois exemplos emblemáticos.
À crise de confiança empresarial respondeu o Governo
com um programa desconexo de apoio às empresas que
tarda demais em concretizar-se em algo de palpável, que se
traduziu até agora numa simples realidade, que foi a para-
lisia do Programa Operacional da Economia,…
O Orador: — O ICEP está inexplicavelmente parali-
sado, com gravíssimas consequências para o investimento
externo e para o turismo em Portugal.
Aplausos do PS.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Já estava
paralisado!
O Orador: — Por outro lado, ao clima de pessimismo
generalizado no sector da construção e obras públicas,
responde o Governo com a criação de um número mediáti-
co de regresso à «política dos pacotes», ao invés de afir-
mar, de forma serena e esclarecedora, como está a prosse-
guir, no curto prazo, o esforço de investimento que ao
Estado compete garantir e como pretende, no médio prazo,
concretizar novas áreas de investimento. É que — reparem
no seguinte —, no PIDDAC, havia muitíssimos mais
milhões de euros para investimentos em infra-estruturas
rodoviárias, ferroviárias e aeroportuárias do que aqueles
que foram anunciados no sábado, no final do Conselho de
Ministros de balanço dos três meses, pelo Sr. Primeiro-
Ministro. Portanto, a sensação que dá, como muito bem foi
salientado pela Deputada Elisa Ferreira, é que tentaram
apresentar, como um programa de relançamento das obras
públicas, um programa que é um verdadeiro corte nas
obras que tinham sido aprovadas em PIDDAC.
Aplausos do PS.
Protestos do Deputado do PSD Fernando Pedro Mou-
tinho.
O que o País precisa de saber, o que as empresas preci-
sam de saber são os compromissos reais e quantificados do
investimento público e não apresentações de pacotes com-
postos de investimentos já programados, a par de promes-
sas de investimentos insuficientemente preparados.
Aplausos do PS.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados:
Já vi escrito e também já ouvi hoje, dito, que é o PS, que
está em minoria no Parlamento, o responsável pela ineficá-
cia das iniciativas governativas. Não existe uma ponta de
verdade nessa afirmação. Para além de colaborarmos na
viabilização da agenda legislativa do Governo, por vezes
aceitando, para além do razoável, prazos de agendamento
de carácter extraordinário, dispusemo-nos de todas as
formas a colaborar na busca de soluções.
O Sr. António Costa (PS): — É verdade!
O Orador: — E continuaremos a trabalhar na mesma
perspectiva. Desafiamos o Governo e a maioria a respon-
der positivamente a esta disponibilidade.
Temos as nossas prioridades, aquelas que considera-
mos essenciais para a resposta aos problemas do País. Em
algumas delas existem consensos alargados, que importa
valorizar, noutras, divergências saudáveis e necessárias,
Vozes do PS: — É verdade!
Protestos do PSD.
… e que revela uma enorme falta de sensibilidade para os
problemas reais das pequenas e médias empresas da indús-
tria e dos serviços. E, já agora, aproveito para relembrar
dois factos singelos.
O Sr. Ministro da Economia, em conferência de
imprensa, disse que, até 30 de Junho de 2002, haveria a
revisão do modelo do POE — procedimentos e instrumen-
tos, financiamento convertível, capital de risco, protocolo
com instituições pré-qualificadas. Já passaram algumas
semanas e não se viu absolutamente nada!
O Sr. Paulo Pedroso (PS): — Zero!
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Quanto à criação do Fundo de Garantia
e Titularização de Créditos, «zero»!
Quanto à criação do Fundo de Aquisição e Sindicação
de Participações, «zero»!
No entanto, na mesma conferência de imprensa, o que
é que prometeu o Sr. Ministro da Economia até 30 de Ju-
nho de 2002? Exactamente aquilo que o Sr. Primeiro-
Ministro veio aqui hoje, já em meados de Julho, anunciar,
ou seja, a aprovação do regime de privatização do notaria-
do e a apresentação da revisão das leis do trabalho. Não
está mal coordenado o Governo!
Aplausos do PS.
Aliás, ao mesmo tempo, responsáveis do Ministério da
Economia produzem afirmações de desprezo pelo apoio
aos factores imateriais de promoção da competitividade,
que são essenciais ao nosso tecido empresarial, enquanto
estruturas importantes para o apoio à nossa competitivida-
de externa, como, por exemplo, o ICEP, são paralisadas
inexplicavelmente.
Vozes do PS: — É verdade!
10 DE JULHO DE 2002
que podem contribuir para enriquecer a capacidade do País
em assumir os seus combates.
Deixo, neste ponto, 10 áreas onde julgo essencial traba-
lhar, na Assembleia da República e no País, para cons-
truirmos as respostas de que os portugueses necessitam.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Primeiro área: a questão europeia. Esta é
uma área onde existe um largo potencial de consenso na
sociedade portuguesa. Importa, no entanto, que, quando
estão em debate questões essenciais para o nosso futuro,
como o alargamento da União Europeia, a sua reforma
institucional, a reforma da política agrícola comum ou a
avaliação intercalar do Quadro Comunitário de Apoio, se
aprofunde o debate no nosso país e na Assembleia da Re-
pública.
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Orador: — Estamos disponíveis para esse debate e
para apoiar, a todos os níveis, a actuação do Governo na
defesa dos interesses nacionais.
Aplausos do PS.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Até que
enfim!
O Orador: — Importa que Portugal mantenha a sua
capacidade de actuação e peso nas decisões institucionais
da União, importa que se prepare, desde já, o pós-2006,
numa perspectiva de que a coesão económica e social na
União Europeia tem de se continuar a fazer sentir e, em
alguns domínios, terá até de se acentuar.
Aplausos do PS.
Segunda área: as políticas de saúde.
O PS considera que é possível construir respostas a
muitos dos problemas que os portugueses sentem nesta
área, desde que, para tal, as políticas prosseguidas consi-
gam compatibilizar o grande objectivo de aprofundar os
ganhos de saúde com uma modernização efectiva dos
modelos de gestão do Serviço Nacional de Saúde.
Terceira área: as políticas de apoio ao desenvolvimento
da competitividade empresarial.
Em primeiro lugar, é essencial que se ultrapassem os
bloqueios que estão a paralisar as políticas activas de apoio
ao relançamento económico. Precisamos de, urgentemente,
traduzir em acção, no plano económico, uma linha de rumo
global clara e uma atenção particular aos estrangulamentos
que afectam hoje, especialmente no plano financeiro, as
pequenas e médias empresas — a economia portuguesa
está hoje a viver bem abaixo do seu potencial produtivo.
Este é um factor que permite um relançamento do cresci-
mento sem custos excessivos de novos investimentos,
devendo as políticas públicas favorecer a retoma dos níveis
de confiança do sector empresarial.
Quarta área, onde importa construir dinâmicas de con-
vergência em toda a sociedade portuguesa: o esforço para
a melhoria da empregabilidade da nossa população activa e
dos nossos jovens.
É essencial que, para tal, se intensifique o esforço de
requalificação da população activa empregada.
O Sr. José Sócrates (PS): — Muito bem!
O Orador: — Esta é uma área onde Portugal não tem
sabido aproveitar plenamente os recursos de que tem dis-
posto.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Sabemos
porquê!
O Orador: — Cabe à sociedade, e nomeadamente às
empresas, um papel fundamental neste domínio, mas
importa afirmar que não tenho sentido do Governo a sufi-
ciente atenção ao papel das políticas activas de apoio à
empregabilidade. Como cabe ao Estado melhorar a racio-
nalidade do nosso sistema de ensino e favorecer a profis-
sionalização dos jovens, particularmente em ambientes
empresariais.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Quinta área: o reforço do combate ao
desemprego.
Sabemos que existem já sinais preocupantes, mas sa-
bemos também que, neste domínio, os problemas mais
graves estão para vir, em função do abrandamento e da
crise económica.
É essencial uma atitude precoce e preventiva face ao
impacto social de agravamento do desemprego. E, aqui, as
políticas activas de emprego têm um papel insubstituível.
Esperamos que o Governo possa manter o grau de cobertu-
ra que os desempregados hoje têm por políticas activas
destinadas a facilitar a sua reinserção profissional. Sem
este esforço, poder-se-ão desenvolver fracturas sociais que
penalizarão a política social e a própria recuperação eco-
nómica.
Aplausos do PS.
Uma sexta área, em que o PS entende que o Parlamento
deve intensificar a sua acção e que exige um debate cons-
trutivo, mas permanente, diz respeito ao acompanhamento
da execução do Quadro Comunitário de Apoio. Aproxi-
mamo-nos de um momento crítico na execução deste QCA
e a ausência de responsabilidade política explícita e autó-
noma, ao nível desta área, no actual Governo, depois da
liquidação, pura e simples, do Ministério do Planeamento,
é um sinal muito inquietante para o exigente cumprimento
dos nossos compromissos nesta área.
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
O Orador: — Uma sétima área, que eu gostaria de re-
alçar, diz respeito à nossa vontade de contribuir para a
produção de consensos em torno dos grandes investimen-
tos estruturantes da nossa inserção geoeconómica. Eles
continuam a ser essenciais para a afirmação competitiva do
34
I SÉRIE — NÚMERO 30
País e não deverão ser penalizados por uma visão excessi-
vamente conjuntural ou localista destes problemas.
É a visão estratégica e a sua concretização em progra-
mas de médio prazo que dá segurança a investidores e que
garante o retorno dos investimentos concretizados.
Aplausos do PS.
Oitava área: a reforma da Administração Pública. Esta
é — todos o sabemos — uma reforma necessária ainda que
difícil.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Tanta
coisa que deixaram por fazer…!
O Orador: — Estamos disponíveis para, sobre ela,
procurar consensos, mas é imperativo que a política até
agora seguida pelo Governo, de medidas isoladas, incoe-
rentes e mal preparadas, seja substituída pela disponibili-
dade para a abordagem integrada e estratégica do futuro da
Administração Pública.
Aplausos do PS.
Uma nona área de alcance maior para o presente e o
futuro de Portugal: a política de imigração. Esta é uma área
onde não podemos aceitar que se aprofundem fracturas
sociais cujos efeitos serão de difícil reversão. E devo dizer,
Sr. Primeiro-Ministro — não o posso dizer olhos nos
olhos, porque está de costas e também não o posso obrigar
a fazer ginástica… —, que não gostei nada de o ouvir dizer
que tinha havido um abaixo-assinado de tanta gente na
Costa da Caparica. É que não sei até que ponto se trata de
um abaixo-assinado a favor da polícia ou se tem alguma
coisa a ver com a separação de comunidades na Costa da
Caparica… E nós não podemos aceitar esse tipo de lógica!
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional (Pau-
lo Portas): — Ó Sr. Deputado Ferro Rodrigues!…
O Orador: — Nós não podemos aceitar esse tipo de
lógica, temos de a saber combater!
Defendemos uma política activa de imigração séria,
justa e aplicável.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Não pa-
rece!
O Orador: — Daremos os passos necessários para que
ela possa ser construída, se encontrarmos quem os dê con-
nosco.
Finalmente, neste elenco de áreas-chave, importa valo-
rizar a reforma do sistema político. A Assembleia da
República tem-na como uma das suas prioridades da
Legislatura. Como já fizemos recentemente, continuare-
mos a contribuir para a sua valorização.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Deputados: Existem neste momento, no debate políti-
co e na situação do País, questões que estão a preocupar
diversos sectores da sociedade. Quero deixar bem claras as
posições do PS sobre essas questões.
Em primeiro lugar, as políticas com particular incidên-
cia sobre os jovens. Aqui, tem o Governo cometido alguns
dos seus maiores erros. É imperioso que o Governo e o
Primeiro-Ministro revejam a sua política para os jovens.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Não é verdade que o corte do crédito
bonificado possua um significado social irrelevante. Ao
contrário, ele é decisivo em muitas regiões do nosso País.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Repor este apoio para novos contratos é
possível, bem como é possível que o custo de tal medida
seja compensado, com vantagem, por um rigor reforçado
às bonificações agora existentes e pela reanimação econó-
mica que daí irá derivar.
Este é um combate que assumimos como simbólico
para o futuro da nossa juventude e do qual não estamos
dispostos a renunciar.
Aplausos do PS.
Em segundo lugar, apoiamos claramente o reforço da
consolidação orçamental, nomeadamente através da apro-
vação de uma boa lei de estabilidade orçamental. Mas,
naturalmente, só o poderemos fazer em face de uma inicia-
tiva legislativa que não sofra da tendência, que se repete,
de legislar não cumprindo a Constituição.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Como consideramos fundamental que a
futura lei de estabilidade orçamental contenha dispositivos
de diferenciação positiva em diferentes áreas da adminis-
tração do Estado. Não é justo nem aceitável tratar de forma
idêntica realidades distintas. Isto é verdade quando fala-
mos das regiões autónomas — a Região Autónoma dos
Açores tem problemas muito mais graves do que a Região
Autónoma da Madeira —,…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — É o que faz a dife-
rença entre os sociais democratas e os socialistas!
O Orador: — … mas também é verdade quando fala-
mos dos municípios. Há assimetrias de desenvolvimento
que têm de ser levadas em conta no esforço de consolida-
ção orçamental.
Aplausos do PS.
Uma lei de estabilidade orçamental sem cheques em
branco à acção discricionária e com diferenciação positiva
10 DE JULHO DE 2002
obrigatória a favor das regiões mais carenciadas é um
instrumento essencial para a eficácia e a equidade da con-
solidação orçamental. E peço-lhe, Sr. Primeiro-Ministro,
peço-lhe que não insista em fazer votar esta lei, na genera-
lidade, que permita que ela passe, sem votação, para a
especialidade, porque nós, Partido Socialista, não estamos
disponíveis para pactuar, nem mediante uma abstenção,
com uma lei que sofra de qualquer inconstitucionalidade e
estamos interessados em trabalhar com todos os grupos
parlamentares para termos uma boa lei de estabilidade
orçamental.
Aplausos do PS.
Está, igualmente, o Governo a legislar em matéria de
Lei de Bases da Segurança Social. Tem-no feito de forma
precipitada, com avanços e recuos — muito do que veio
em títulos de jornais parece já ter desaparecido —, e chega
ao ponto de apresentar uma lei de bases para debate, na
generalidade, cerca de uma semana depois de ela ter entra-
do na Assembleia.
Como já foi dito várias vezes, é uma proposta de lei
desnecessária e que introduz como tema fundamental os
limites contributivos, questão que não é central para uma
gestão reformista da Segurança Social.
Não estamos com esta forma de legislar, não estaremos
com propostas que, prometendo o céu na terra, oferecendo
futuros grandiosos a custo de quase nada, se arriscam a
abrir portas a aventuras bem perigosas para a sustentabili-
dade da Segurança Social em Portugal.
Não partilhamos qualquer responsabilidade para um
recuo «assistencialista» perante direitos sociais de cidada-
nia que muito respeitamos!
Aplausos do PS.
O Governo fica, assim, a saber claramente onde e como
pode contar connosco e quais são os limites dessa coope-
ração. Nunca alinharemos no «bota-abaixismo» permanen-
te com que fomos brindados pela actual maioria, então na
oposição.
O Sr. José Sócrates (PS): — Muito bem!
O Orador: — Nunca alinharemos numa conciliação
política que ponha em causa os princípios e valores pelos
quais sucessivas gerações de socialistas se bateram e
batem.
O Sr. José Sócrates (PS): — Muito bem!
O Orador: — Não temos a primeira nem a última pa-
lavra: essas cabem ao Governo!
Assumam as vossas responsabilidades; nós assumire-
Presidente Lino de Carvalho.
mos as nossas!
Aplausos do PS, de pé.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se, para pedir escla-
recimentos, os Srs. Deputados Diogo Feio e Machado
Rodrigues.
Tem a palavra o Sr. Deputado Diogo Feio.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.
Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, quero começar por
saudá-lo, desde logo por uma intervenção que não me
parece ter tido elementos muito entusiasmantes, sequer
inovadores, mas que demonstrou uma determinada posição
pela positiva, bem diferente daquela a que assistimos há
pouco na sua bancada por parte do Sr. Deputado José
Sócrates.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Continuo, então, a saudá-lo, porque
tem à sua frente uma difícil tarefa: a de liderar um parti-
do que demonstra uma instabilidade tremenda, um parti-
do — e fala um Deputado que dá os primeiros passos
nesta Assembleia — que parece ter-se especializado em
duas coisas, por um lado, em defesas da honra da banca-
da e, por outro lado, em levantar questões de natureza
procedimental.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues,
gostaria de referir directamente a questão da estabilização
orçamental. A sua intervenção relembrou-me ensinamentos
dos livros de Finanças Públicas, a importância que têm
estas políticas para o equilíbrio, para um crescimento sus-
tentável, sendo que para isso é obviamente necessário,
como V. Ex.ª sabe, coordenar os vários sectores do sector
público administrativo.
Parece-me, aliás, esta medida tão positiva que no Pro-
grama de Reforma da Despesa Pública, na oitava medida,
estava proposta a aprovação de uma lei de estabilidade
orçamental, que nas características ali referidas tem muito
que ver com a actual proposta de lei.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Quero falar também de um relatório que
VV. Ex.as pediram e cuja elaboração foi liderada pelo Sr.
Prof. Sousa Franco, o qual refere, desde logo, a necessida-
de desta política para a contenção da despesa pública e que
refere também, a páginas 48 e 49, a necessidade de cum-
prir o Pacto de Estabilidade e Crescimento.
Por isso, gostaria de fazer-lhe uma pergunta muito di-
recta e concreta: Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues,
quer V. Ex.ª contribuir para que Portugal cumpra o Pacto
de Estabilidade e Crescimento? Quer V. Ex.ª contribuir,
votando positivamente a proposta lei de estabilidade orça-
mental, para que possamos alcançar esse desiderato? A
resposta é «sim» ou «não» — é uma resposta muito rápida.
Sr. Deputado, quero falar-lhe ainda da crise orçamen-
tal. Sei que esta questão cria algumas dissonâncias dentro
do seu grupo parlamentar. Por exemplo, o líder da bancada
do PS disse em tempos que o problema do seu partido foi
decretar a existência de uma crise orçamental. Ora, se não
36
I SÉRIE — NÚMERO 30
a vivemos, qual será, para o Deputado António Costa, o
conceito de crise orçamental?
Sr. Deputado, gostaria também de pedir-lhe que disses-
se em concreto duas ou três medidas para a contenção da
despesa pública que V. Ex.ª tomaria.
O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): — Sr. Deputado,
peço-lhe que conclua, pois já esgotou o tempo de que
dispunha.
O Orador: — Estou a terminar, Sr. Presidente.
Será que definitivamente VV. Ex.as pretendem ter um
comportamento positivo como partido da oposição? É que
se assim não for vamos chegar rapidamente a uma conclu-
são e será possível dizer o seguinte: o governo do PS, que
tanto se preocupou com as sondagens, «afundou», a oposi-
ção do PS, que tanto continua a preocupar-se com as son-
dagens, definhou.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): — Também para
pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Ma-
chado Rodrigues.
O Sr. Machado Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente,
Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues, só lhe peço um
esclarecimento porque reiteradamente, depois de ontem o
seu partido ter dado uma conferência de imprensa intem-
pestiva, hoje também, V. Ex.ª, na sua intervenção, voltou a
mencionar o assunto dos anúncios feitos quanto a investi-
mentos nas obras públicas, parecendo que há alguma con-
fusão, quando não há confusão alguma!
Os senhores aproveitaram os números para lançar uma
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): — Publicidade enga-
confusão…
nosa!
O Orador: — Como o Sr. Deputado Eduardo Ferro
Rodrigues sabe, e a Sr.ª Deputada Maria Elisa Ferreira
sabe ainda melhor, o PIDDAC para 2002 previa exacta-
mente 1019 milhões de euros na rubrica Transportes e
Comunicações, para os programas Construção, Conserva-
ção, Segurança e Requalificação, Despesas Comuns e
Concessões. De toda esta verba, diz respeito a Construção
433 milhões de euros, sendo que dentro desta estão aloca-
dos ao EURO 2004 — feliz ou infelizmente — 41 milhões
de euros,…
Vozes do PS: — O Sr. Deputado é contra o EURO
2004?!
O Orador: — … estão alocados às estradas nacionais
(IP e IC) 370 milhões de euros.
O Sr. António Costa (PS): — Podia fazer um pedido
de esclarecimento directamente ao Sr. Primeiro-Ministro,
que era mais simples! Escusava de ter intermediário!
O Orador: — Estou a pedir esclarecimentos ao Sr.
Deputado Eduardo Ferro Rodrigues!
Está dito que o investimento será de 355 milhões de
euros, o que é uma demonstração da confiança que o
Governo tem na recuperação das finanças públicas, de
molde a poder manter o nível de investimento público, a
fim de que o apoio ou suporte do desenvolvimento da
economia e o seu relançamento possa manter-se constante.
Por isso, digo-lhe, Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodri-
gues, que não vale a pena continuar a mexer e a brincar
com os números,…
Vozes do PS: — Ah!!
O Orador: — … nem andar a marcar à pressa confe-
rências de imprensa para lançar a confusão, porque tudo é
muito claro, transparente e explicável, conforme acabei de
fazer!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): — Para respon-
der, no tempo regimental máximo de 5 minutos, tem a
palavra o Sr. Deputado Eduardo Ferro Rodrigues.
O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): — Sr. Presi-
dente, Sr. Deputado Diogo Feio, agradeço a sua pergunta.
Efectivamente, escusava de ter lido tantas referências
sobre a proposta de lei de estabilidade orçamental, pois
bastava ler o programa com que o PS se apresentou às
eleições,…
O Sr. Paulo Pedroso (PS): — Exactamente!
O Orador: — … em que esse diploma é um aspecto
essencial e constitutivo da política do PS em matéria de
despesa pública.
Assim, à pergunta que me fez respondo-lhe com um
«sim». Mas o «sim» não pode permitir que alinhemos em
inconstitucionalidades, que já foram admitidas hoje, em
comissão, por vários protagonistas de diferentes partidos,
inclusivamente que apoiam o Governo.
Portanto, a única coisa que faz sentido neste momento
— e apelei directamente ao Sr. Primeiro-Ministro — é
haver uma passagem directa do diploma para a comissão
para poder trabalhar-se em concreto, «varrer» as inconsti-
tucionalidades e aprovar uma boa lei de estabilidade orça-
mental.
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Podem fazê-lo na es-
pecialidade!
O Orador: — Porém, sermos «encostados à parede»,
no sentido de dizerem «ou votam algo que é inconstitucio-
nal ou não querem participar no esforço nacional», não
entramos neste jogo, não faz sentido!
Aplausos do PS.
10 DE JULHO DE 2002
Sr. Deputado, uma coisa que não faríamos de certeza
era aumentar a despesa corrente para controlar a Despesa,
como os senhores fizeram no orçamento rectificativo!
Vozes do PSD: — Foi o que fizeram sempre!
O Orador: — Sr. Deputado Machado Rodrigues, pen-
so que fez alguma confusão com os números, que lhe che-
garam à última hora…
O Sr. Machado Rodrigues (PSD): — Os senhores é
que baralham os números!
O Orador: — Como o mundo seria bom sem confe-
rências de imprensa do PS e, se possível, se o PS não falas-
se!… Mas infelizmente tem de ouvir-nos, em conferências
de imprensa e aqui!…
Sr. Deputado, o que quero dizer-lhe, também pela con-
sideração que tenho por si, é que, como sabe, o PIDDAC
foi cortado em cerca de 17% no Orçamento rectificativo.
Isso vai atingir de forma muito dura alguns dos principais
institutos que empreendem na área da rodovia, da ferrovia,
bem como noutras áreas. Portanto, os senhores estão a
querer esconder um corte muitíssimo maior com a apresen-
tação de um tal programa especial. Como eu disse há boca-
do, este Governo está a especializar-se em especialidades,
mas não passa de um discurso muito generalista!
Aplausos do PS.
O Sr. Machado Rodrigues (PSD): — O valor é o
mesmo do PIDDAC!
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, peço a
palavra para interpelar a Mesa.
O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): — Qual o aspec-
to da ordem de trabalhos a que se refere a interpelação, Sr.
Deputado?
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero
mencionar que, certamente por lapso, o Sr. Deputado Edu-
ardo Ferro Rodrigues não respondeu à pergunta que lhe
coloquei quanto às medidas em concreto que tomaria para
a contenção da despesa pública.
O Sr. João Pinho de Almeida (CDS-PP): — Não sabe
responder!
O Sr. Presidente (Lino de Carvalho): — Como sabe,
cada Deputado é livre de responder nos termos que en-
tender.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, Srs.
Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Permitam-
me que inicie esta minha intervenção salientando um regis-
to que me parece particularmente significativo e formulan-
do um voto que encerra a mais sentida preocupação de
dignificar a Assembleia da República e de valorizar os
debates parlamentares. O registo é o de que nunca ante-
riormente, na história da nossa democracia, em três meses
de exercício de funções, qualquer outro Primeiro-Ministro
e um tão elevado número de Membros do Governo se
deslocaram tantas vezes à Assembleia da República, quer
ao Plenário quer às comissões.
O Sr. António Costa (PS): — E o Ministro Morais
Sarmento ainda volta cá!
O Orador: — Bem-haja, pois, V. Ex.ª, Sr. Primeiro-
Ministro, e os demais Membros do Governo, pelo respeito
e pela consideração que o Parlamento vos merece e pelo
elevado sentido de cooperação institucional que vêm tendo
para com a Assembleia da República.
O voto ou desejo que pretendo formular, e a que fiz ini-
cialmente referência, é quase também um apelo ou desafio
que daqui quero fazer aos partidos da oposição.
O País tem os olhos postos em nós e quer, naturalmen-
te, rever-se nos seus eleitos. Impõe-se, pois, e é de todo
exigível, que estas oportunidades de debate com o Gover-
no sejam aproveitadas por todos para uma discussão séria
e aprofundada das grandes questões nacionais.
É importante que, com a riqueza própria da diversidade
de opiniões que representamos, nos ocupemos da substân-
cia, do cerne, dos principais problemas que interessam aos
portugueses e não de questões menores, de fait-divers ou
da mera espuma das coisas. Digo isto porquanto, ainda
recentemente, o último debate mensal que aqui tivemos
com o Sr. Primeiro-Ministro, lamentavelmente, e no que à
oposição diz respeito, foi mais uma oportunidade perdida.
Na verdade, naquele debate, por parte dos partidos da
oposição, tudo se resumiu aos incidentes que haviam ocor-
rido, a propósito da Cimeira de Sevilha, na fronteira espa-
nhola e à questão da transferência de um embaixador,
efectuada no âmbito de um normal movimento diplomáti-
co, cujo currículo o líder do maior partido da oposição,
qual biógrafo oficioso das «Necessidades», entendeu,
então, ler-nos longa e exaustivamente.
O Sr. Paulo Pedroso (PS): — E era bom!
O Orador: — Compreende-se, pois, que face a prece-
dente recente tão elucidativo expresse aqui a minha mais
profunda preocupação e o desejo de que, desta vez, a opo-
sição discuta o fundo das questões, a substância dos pro-
blemas nacionais e as suas soluções, dignificando o debate
e o Parlamento.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Estes
três meses que o Executivo leva de exercício do seu man-
dato revelam bem que estamos perante um Governo total-
mente diferente dos governos socialistas, que estiveram à
frente do País até Março último.
Desde logo, este Governo assenta a sua acção política
numa estratégia de verdade, entendendo não dever ocultar
ao País a realidade da grave situação em que os socialistas
deixaram as finanças públicas e a nossa economia. Não se
trata de procurar culpados pelo estado a que a Nação che-
gou. Na verdade, o Governo está, acima de tudo, preocu-
pado com o futuro dos Portugueses. Quanto ao passado,
38
I SÉRIE — NÚMERO 30
sabe que a História, com o distanciamento que lhe é pró-
prio, não deixará de atribuir a seu tempo, sem qualquer
desvirtuamento conjuntural, as responsabilidades a quem
efectivamente as tem.
O Governo tem deixado claro que não perfilha nem
aceita o estilo de governação que imperou nos últimos seis
anos, em que se ocultou a verdade aos portugueses e se
simulou que tudo ia bem para, de repente, se passar de um
«mar de rosas» para «o pântano» em que nos deixaram.
Não é possível restabelecer o clima de confiança indis-
pensável à retoma económica nem mobilizar os portugue-
ses para o esforço colectivo que lhes é exigido sem lhes
dizer a verdade. É natural, pois, que os que sempre pensa-
ram e agiram de forma diversa, ou seja, os que durante
anos mentiram aos portugueses, se tenham agora incomo-
dado por se haver revelado ao País a indicação do Banco
Central Europeu de que o défice de 2001 se situa em 3,9%.
Não deixa de ser curioso, mas também significativo,
vê-los inventar argumentos para persistirem na ocultação
da verdade aos portugueses. A verdade que lhes dói e que
impede o branqueamento, que tanto desejam, do desastre
do desgoverno dos últimos seis anos. Argumentos esses
que vão desde a falsa confidencialidade de tais informa-
ções até à alegada repercussão negativa que essa divulga-
ção, bem como a de outros dados económicos e financei-
ros, teria junto dos agentes económicos. Porém, as reais
razões e a conveniência dessa estratégia de ocultação e
manipulação da verdade em que os socialistas persistem
vieram rapidamente ao de cima, como se verá.
Como é sabido, o Governador do Banco de Portugal
declarou recentemente indiciarem-se sinais de recessão,
tendo adiantado algumas reservas quanto ao crescimento
económico. Tanto bastou para que logo o líder do maior
partido da oposição tivesse deixado ficar bem patente as
razões do seu incómodo pela revelação aos portugueses da
verdade da situação em que os governos a que pertenceu
conduziram o País.
Apressou-se o líder do Partido Socialista, com o maior
despudor e como se nada tivesse que ver com os erros da
governação em que participou, a proclamar que os sinais
de recessão e algumas reservas quanto ao crescimento
económico imediato se ficavam a dever — imagine-se! —
aos três meses de mandato do actual Governo.
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Con-
firma-se, assim, que os socialistas (e eles são os mes-
mos), depois de se terem habituado a governar mentindo
aos portugueses, continuam agora a fazer oposição afi-
nando pelo mesmo diapasão, ou seja, continuam a faltar à
verdade.
Bem-haja, pois, Sr. Primeiro-Ministro, por optar pela
diferença e fazer questão de assentar intransigentemente a
sua relação, e a do seu Governo, com os portugueses na
verdade.
Há ainda uma outra característica que distingue bem
este Governo daqueles que tivemos nos últimos seis anos.
Refiro-me à sua coragem política:
Coragem para assumir, sem hesitação, as medidas ne-
cessárias para o saneamento das finanças públicas e para
atingirmos as metas europeias em matéria de défice. Ape-
sar de penosas e de não serem facilmente compreendidas e
aceites, como aconteceu com o aumento da taxa do IVA, o
Governo não hesitou em fazê-lo.
Coragem ainda para fundir e extinguir serviços e insti-
tutos que proliferaram nos últimos seis anos como verda-
deiras agências de colocação clientelar e fonte de elevado
desperdício de dinheiros públicos.
Coragem também para levar por diante inadiáveis
medidas de racionalização e mobilidade na função pública.
Agigantar a Administração Pública, multiplicar os ins-
titutos, as comissões e os grupos de trabalho, duplicando
estruturas e aumentando desmesuradamente as despesas
correntes foi o rumo seguido nos últimos seis anos, que o
actual Governo não hesitou em travar e mesmo inverter.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do
Governo, Sr.as e Srs. Deputados: A par de uma estratégia
política assente na verdade, aliada a uma coragem política
para adopção de medidas indispensáveis para travar o
descalabro com que se deparou, o Governo revelou, nestes
três meses de mandato, que se distingue e caracteriza ainda
por um profundo propósito reformador.
O impulso reformador do Governo é algo que o mar-
ca e o diferencia, de forma particular, dos Governos
anteriores.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — O tempo do adiamento das reformas, das
hesitações, das cedências aos lobbies, às corporações e aos
interesses instalados, do recuo face às pressões, às mani-
festações de rua e aos que se apresentam com maior poder
reivindicativo, com preterição dos mais fracos e dos que
não têm voz, acabou definitivamente.
O impulso reformador do Governo está bem patente na
circunstância de, em apenas três meses, ter levado a cabo
mais reformas do que os socialistas em três anos.
São já tantas as leis estruturantes que o Governo apre-
sentou na Assembleia da República que não é possível
deter-me e ocupar-me de todas elas. Em todo o caso, per-
mitam-me que refira, pela sua importância, pelos sectores
sensíveis em que se inserem, pela urgência de que se
revestem e pelo seu profundo alcance, três ou quatro das
reformas em causa.
Refiro-me à Lei de Bases da Segurança Social, à Lei
da Gestão Hospitalar, às reformas da educação, tanto a
nível do ensino superior como do ensino secundário e,
ainda, à Lei da Imigração, questão da maior premência,
que esteve tão justificadamente presente na recente
Cimeira de Sevilha.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do
Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Não é mais possível, nos
dias de hoje, manter do Estado uma visão fechada e estan-
que, fazendo-o prosseguir anquilosado nos seus métodos,
lento nas suas decisões e perdulário na sua gestão.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Bem
lembrado!
10 DE JULHO DE 2002
O Orador: — Por isso defendemos um sistema de
segurança social que, sem perda de direitos, permita o
recurso voluntário a novas vias de protecção e de reforma,
como defendemos uma gestão hospitalar aberta a formas
privadas de intervenção e a parcerias.
A dialéctica entre público e privado perde sentido
quando tal constitui um travão à adopção de medidas que
se traduzam em melhoria da qualidade, da eficiência e da
economia de meios na prestação de serviços que a comu-
nidade tem de assegurar aos cidadãos.
O Estado não deve abdicar do seu papel regulador e
fiscalizador, mas tem a obrigação de ceder espaço à socie-
dade civil e de se abrir a formas privadas de intervenção e
de gestão que assegurem uma melhor realização dos servi-
ços a que todos têm direito.
As reformas na educação aí estão, sem que tenham sido
necessários anúncios pomposos ou a exaltação de paixões
frustradas ou traídas.
Com serenidade e firmeza, começa a introduzir-se uma
cultura de qualidade, de rigor, de exigência e de responsa-
bilidade, que têm andado arredados de muitos sectores e
áreas do nosso ensino.
O Sr. José Magalhães (PS): — Que paraíso!…
O Orador: — É fundamental que a escola transmita
conhecimentos, mas também valores e princípios.
É indispensável assegurar a avaliação regular e idónea
dos nossos estabelecimentos de ensino, a todos os ní-
veis,…
O Sr. José Magalhães (PS): — Sem dúvida!
O Orador: — … fazendo do aluno o principal centro
das nossas preocupações e mobilizando os agentes educa-
tivos, incluindo os pais e as famílias, para uma tarefa que é
de todos.
Foi com este sentido e com preocupações de assegurar
a igualdade de oportunidades, fomentar a cidadania, garan-
tir o acesso à inovação, às mais modernas tecnologias,
combatendo, ao mesmo tempo, os desperdícios, que o
Governo apresentou, nas últimas semanas, um importante
conjunto de diplomas, na área da educação, à Assembleia
da República.
Igualmente da maior relevância e urgência é a reforma
introduzida pela nova lei que regula a entrada e permanên-
cia de imigrantes, que, sem pôr em causa a nossa tradição
humanista, não pode deixar de introduzir regras e de fixar
exigências indispensáveis à protecção dos imigrantes.
O laxismo, o facilitismo e a permissividade em matéria
de imigração tornam os próprios imigrantes as primeiras
vítimas dessa política de «fechar de olhos» e de «deixa
andar».
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — No Boletim de Maio de 2001 do Alto
Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas, lia-se,
como notícia oficial: «Estrangeiros vendidos em Portugal
como escravos».
Que fizeram os Governos anteriores para combater as
mafias e os patrões sem escrúpulos? Nada, absolutamente
nada!
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Orador: — Eram, pois, urgentes medidas de carác-
ter social, já que a integração das comunidades imigrantes
é um imperativo nacional com que estamos confrontados e
que se não pode deixar agravar, permitindo que se alastrem
focos de criminalidade e fenómenos de xenofobia e de
exclusão social, que mais do que combater é necessário
prevenir e evitar.
O laxismo é tão prejudicial à sociedade portuguesa
como aos imigrantes que nos demandam, se responsavel-
mente e, por consequência, com peso e medida, não lhes
proporcionarmos as condições de integração e de dignida-
de humana a que têm direito.
A este estado de coisas contrapomos uma política de
imigração controlada, rigorosa, responsável e solidária.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo e Srs. Depu-
tados: Ciente da situação a que se deixou chegar a nossa
economia, a par de uma conjuntura europeia e mundial
preocupante, o Governo, ao mesmo tempo que vem adop-
tando as reformas já referidas, aprovou um programa para
a produtividade e o crescimento da economia, que está a
ser implementado e que visa constituir um estímulo aos
agentes económicos e criar condições de competitividade
às nossas empresas.
É preciso assegurar maior produtividade, é preciso
aumentar as nossas exportações.
Passados três meses de Governo da actual coligação no
poder, na sequência das eleições de 17 de Março, e porque
estamos num debate sobre o estado da Nação, pareceu-me
interessante reproduzir aqui o depoimento do Prof. Freitas
do Amaral à revista Visão, sobre o estado em que os socia-
listas receberam o País, em 1995, e a situação em que o
deixaram, em Março último. E passo a citar: «Quando o
Eng.º António Guterres iniciou as funções de Primeiro-
Ministro, em Outubro de 1995, recebeu das mãos de Cava-
co Silva uma boa herança: Portugal, apesar dos seus atra-
sos estruturais e dos seus problemas crónicos, estava numa
boa situação económica e financeira e a autoridade do
Estado era respeitada no interior do País e na comunidade
internacional.»
Seis anos depois, não podemos deixar de verificar, com
mágoa e apreensão, que a herança foi desbaratada: há uma
crise de autoridade do Estado (por exemplo, a insegurança
nas ruas, a indisciplina nas escolas e os homicídios e suicí-
dios nas prisões), há um grave desequilíbrio orçamental, há
uma economia quase estagnada, há fugas de capitais e
salários em atraso e quase todos os grandes serviços públi-
cos — as Forças Armadas, a Justiça, a Educação, a Saúde
e a Administração Pública, sem falar já na grave crise
financeira das grandes empresas do Estado, tais como a
RTP, a TAP e a CP — estão no «vermelho».
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — É um verdadeiro descalabro!…
40
I SÉRIE — NÚMERO 30
A Comissão Europeia não se equivocou quando detec-
tou os sinais de crise na economia portuguesa e emitiu um
«alerta rápido» em direcção a Portugal.
Porque, no fundo, a crise económica e financeira exis-
te, tal como a Comissão Europeia a detectou: «com ou sem
condenação formal, o diagnóstico estava certo e o doente
não vai poder escapar à terapêutica adequada».
Apesar de ser assim e das responsabilidades que cabem
aos socialistas, qual tem sido o comportamento do PS até
agora, como maior partido da oposição?
Pois bem, enquanto, de um lado, temos um Governo
que faz, que decide, corajoso e com manifesto ímpeto
reformador, do outro lado temos uma oposição que procu-
ra, por todos os meios, destruir a acção do Governo e
«obstaculizar» a adopção de medidas, mesmo as mais
urgentes…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
… e indispensáveis para corrigir e reparar o mal que fize-
ram enquanto Governo.
Se tivermos presente o que tem sido a actuação do Par-
tido Socialista nestes três meses de oposição, deparamos
com um partido errático, sem identidade, que tem feito da
chicana política a sua principal arma e a sua actuação pre-
dilecta.
O PS tem sido o verdadeiro campeão dos incidentes
regimentais e dos expedientes dilatórios, atolado nas ques-
tões processuais e de forma, mas totalmente ausente nas
questões de substância.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Num frentismo subordinado à estratégia
de um pequeno partido, que era suposto estar à sua esquer-
da, o Partido Socialista não tem iniciativa, não tem uma
ideia e demite-se de constituir uma alternativa minimamen-
te credível.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Li algures que o Sr. Deputado Augusto Santos Silva
está incumbido de redigir um documento que constituirá a
«cartilha» dos novos princípios do PS.
Protestos do PS.
Talvez agora se compreenda melhor as actuais dificul-
dades do Partido Socialista!… Procura descartar-se dos
velhos princípios e ainda não encontrou os novos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Deputado Augusto Santos Silva, a
bem da democracia, apresse o seu trabalho e veja se impe-
de que, mais uma vez, o seu partido chegue tarde, dema-
siadamente tarde, à História.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do
Governo e Sr.as e Srs. Deputados, o País, felizmente, tem
agora o que lhe faltou durante demasiado tempo: um
Governo que não hesita em enfrentar os lobbies e os inte-
resses instalados, um Governo com coragem, um Governo
que não adia, um Governo que reforma, um Governo que
decide, um Governo que governa.
Ao País falta, agora, uma oposição séria, responsável,
capaz de dar um contributo construtivo ao Estado demo-
crático.
Naturalmente, como é próprio de quem prefere a ac-
ção ao imobilismo, de quem opta por decidir em vez de
adiar, tem o Governo cometido algumas falhas, que res-
ponsavelmente assumimos, sem a menor quebra de soli-
dariedade.
Mas, Sr.as e Srs. Deputados, no estado em que os socia-
listas deixaram o País não poderia haver falha ou erro
maior do que continuar a adiar as reformas e a protelar as
decisões. E esse erro o Governo não cometeu e os três
meses que leva de exercício confirmam bem que jamais o
cometerá.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Primeiro-Ministro, afirmou V. Ex.ª nesta Assem-
bleia, aquando da apresentação do Programa do Governo:
«não propomos o caminho mais fácil, mas o caminho mais
seguro», «não vendemos ilusões, mas garantimos solidez e
confiança», «estamos preparados para tomar medidas difí-
ceis que há muito deveriam ser tomadas».
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Disse V. Ex.ª a verdade aos portugueses
e não lhes ocultou as dificuldades e os sacrifícios. Mas o
certo é que V. Ex.ª e o seu Governo, com as medidas já
adoptadas e com as que vem anunciando, transmite-lhes
também confiança e esperança.
De uma coisa estamos certos: por mais sondagens,
pressões mediáticas ou outras que se registem, este Gover-
no continuará a subordinar a sua acção e as suas decisões
exclusivamente ao interesse nacional.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro,
Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs. Deputados: Permi-
tam-me que termine salientando uma diferença fundamen-
tal deste Governo relativamente aos governos das duas
anteriores legislaturas.
É que este Governo tem outro Primeiro-Ministro: tem
um Primeiro-Ministro que cumpre os compromissos assu-
midos, um Primeiro-Ministro que não abdica das suas
responsabilidades, um Primeiro-Ministro que não volta
costas às dificuldades, um Primeiro-Ministro que não se
põe em fuga perante as contrariedades!
Os portugueses podem contar com este Primeiro-
Ministro e com este Governo.
Daqui a quatro anos, para além e acima das sondagens
de percurso, V. Ex.ª, Sr. Primeiro-Ministro, verá, no
momento próprio, que também conta com os portugueses!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
10 DE JULHO DE 2002
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente
Mota Amaral.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a pala-
vra o Sr. Deputado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.
Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e Srs.
Deputados: Começo por registar, nas reflexões que gosta-
ria de fazer, o dado curioso de o Sr. Deputado José Sócra-
tes, naquela que terá sido a tirada com mais graça de toda a
tarde, ter dito há pouco que o Partido Socialista tinha ga-
nho este debate.
Esse foi, certamente, o momento mais hilariante de
toda a tarde.
Risos do CDS-PP e do PSD.
Mas ainda que fosse verdade, curiosamente eu nunca
tinha visto ganhar e debandar a seguir! Debandaram com-
pletamente!… Acham que ganharam, mas debandaram.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — É sempre
assim!…
O Orador: — Quero depois assinalar que este é um
debate interessante e muito centrado nas questões econó-
micas. E eu sublinharia, nesta matéria, um dado que me
parece muito importante.
O Primeiro-Ministro deixou um programa claríssimo
para o País: disse que a primeira prioridade era controlar a
despesa pública, que a segunda era relançar a economia e
que a terceira era realizar as reformas estruturais.
Foi muito claro quanto a isto e trouxe-nos um pro-
grama definido, claríssimo, que todos, certamente, per-
cebemos.
A novidade veio da oposição, designadamente do mai-
or partido da oposição. E a novidade fundamental que
registei foi o facto de o Partido Socialista ter chegado a
este debate com uma nova estratégia, diferente da que
seguiu até agora.
Até hoje, o Partido Socialista seguiu a lógica de negar
sempre, repetindo frases como «não é verdade», «não nos
enganámos», «o défice não é esse», «nós não estivemos
lá». O importante era negar tudo, negar as coisas mais
evidentes do mundo, mas negar sempre e atacar sempre.
Agora iniciou uma segunda fase estratégica, diferen-
te, a de dizer «agora acabou», «agora não falem mais do
PS», «a partir daqui a culpa não é mais do PS, a culpa
agora é deste Governo, nós já não temos nada a ver com
o assunto».
O Sr. Paulo Pedroso (PS): — Pode custar, mas é ver-
dade!…
O Orador: — Ou seja, agarram na «batata quente», a
ferver, e tentam passá-la rapidamente para outras mãos.
Mas essa é uma estratégia muito pouco sustentável,
logo à partida, por um questão económica e financeira. E
não vou repetir-lhe os números porque sabem, tão bem
como eu, que o défice de 2001 será de 3,9%.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É uma vergo-
nha!…
O Orador: — Só falta fazer um desenho para que os
senhores percebam o défice de 2001!…
Assim, e apesar de não ter uma grande plateia, vou
apenas ler à bancada do Partido Socialista uma frase que
certamente compreenderá e que vem na sequência de
uma intervenção aqui feita, hoje, pelo Sr. Primeiro-
Ministro. Diz essa frase: «Herdámos, há alguns meses,
uma economia que não só estava muito degradada como
também em estado de degradação.» E agora, a parte mais
importante: «Como se sabe, na economia há leis e uma
delas é a de que leva tempo a ver-se os efeitos da concre-
tização das medidas».
Vou repetir, dispensando-me de fazer o desenho, para
já: «Como se sabe, na economia há leis e uma delas é a de
que leva tempo a ver-se os efeitos da concretização das
medidas».
De quem é a frase? Foi, nem mais nem menos, proferi-
da, no debate do estado da Nação aqui realizado há um ano
atrás, pelo Eng.º António Guterres.
Vozes do CDS-PP: — Ah!…
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Já se es-
queceram!… Não sabem mesmo quem ele é!…
O Orador: — É claríssimo!.
Portanto, os senhores não têm qualquer legitimidade
para usar esse tipo de discurso.
Porquê? Respondo-vos com uma outra pergunta:
naquilo em que os senhores podem responsabilizar o
Governo, quanto tempo vai de execução dessas mesmas
medidas? Vai um mês no máximo!… Não são sequer três
meses de governação; é um mês!…Um mês a partir da
alteração orçamental!… Não há mais tempo do que
esse!… É aí que os senhores podem responsabilizar. E
estão à espera que num mês se inverta uma situação desta
gravidade?!… É evidente que não é possível!… Os senho-
res sabem que não é possível e é por isso que, como foi
dito — e bem! —, pelo Sr. Primeiro-Ministro o que o PS
aqui hoje fez foi, claramente, um exercício de desonestida-
de intelectual.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Orador: — E registo também que não foram capa-
zes de responder, designadamente ao Sr. Deputado Diogo
Feio, ao desafio que vos foi feito no sentido da apresenta-
ção de uma medida de contenção da despesa pública. O
vosso Secretário-Geral não referiu uma única medida!…
No entanto, temos de fazer justiça: o PS não foi sempre
completamente insensível à possibilidade da contenção
orçamental!… Houve pessoas no Partido Socialista que,
em dado momento, perceberam que tudo ia por muito mau
caminho!… O Dr. Pina Moura chegou a fazer no papel,
como é hábito do Partido Socialista, um elenco detalhado
42
I SÉRIE — NÚMERO 30
de medidas de contenção orçamental!… E algumas delas
até eram boas medidas!…
O Sr. Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP): — Mas fica-
ram todas no papel.
O Orador: — O que é que aconteceu ao Dr. Pina Mou-
ra, no Partido Socialista quando avançou com essa maté-
ria? Perdeu, além do mais, o seu papel e ouviu o agora
rejuvenescido filósofo da oposição socialista, Manuel
Maria Carrilho, dizer: «O Dr. Pina Moura é o coveiro da
maioria do Partido Socialista.»
Portanto, nessa matéria os senhores não têm legitimi-
dade alguma, como não têm legitimidade em acusar o
Governo ou a maioria de não proceder a reformas. Porque
há dois estilos de críticas: o primeiro é o ruidoso, praticado
pelo Dr. José Magalhães, que nunca se cala, que está sem-
pre a dizer coisas, a fazer barulho, por estar convencido
que fazer oposição é fazer muito barulho e muitos gestos.
O Sr. José Magalhães (PS): — Então calado é me-
lhor?!…
O Orador: — O segundo é o daqueles que pensam
«está bem, eles até tomam as medidas, mas não as expli-
cam.
O Sr. José Magalhães (PS): — Isso é o PSD, é o Dr.
Marcelo Rebelo de Sousa.
O Orador: — Ó Sr. Deputado José Magalhães, deixe
que faça a minha intervenção!…
Protestos do Deputado do PS José Magalhães.
Sr. Deputado José Magalhães, acredite no que vou di-
zer-lhe…
O Sr. José Magalhães (PS): — Vou fazer o possível.
O Orador: — Quer ouvir-me?
O Sr. José Magalhães (PS): — Quero.
O Orador: — Sr. Deputado, a melhor forma de fazer
oposição não é fazendo muito ruído. Acredite, é um conse-
lho de amigo. É um conselho e é de amigo!… Repito: não
é fazendo muito ruído que se faz boa oposição.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Srs. Deputados, já aqui foram elencadas as medidas
que o Governo tomou. Já falámos no rendimento mínimo
— e lembram-se do que os senhores diziam na altura? —,
já falámos na Lei de Bases da Segurança Social, no maior
esforço de solidariedade para com os mais pobres feito
desde a criação do 14.º mês, como aqui foi dito hoje à
tarde — e bem! — pelo Sr. Primeiro-Ministro,…
O Sr. Diogo Feio (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — … já falámos no exemplo da educação,
onde estava tudo bem, onde era tudo «tecnocratês», mas
onde, a partir de agora, vai haver rigor e exigência e vai
acabar-se aquele tempo em que, com o Partido Socialista
de olhos fechados, era completamente normal um aluno
agredir um professor. Esse tempo vai acabar e já o perce-
bemos.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Já falámos, também, em segurança dos
cidadãos. Aliás, a este propósito, devo dizer que não tem
razão o Sr. Deputado António Filipe, pois também esse
tempo vai mudar.
É que acompanhei muitas vezes esta área, pelo que sa-
údo particularmente o Sr. Ministro Figueiredo Lopes que
disse claramente que não permitiremos a banalização da
desordem social, que o Governo, na dúvida, estará sempre
ao lado das forças de segurança.
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Muito bem, Sr. Ministro! É uma mudança fundamental.
Já falámos na Administração Pública. Já falámos na
imigração. Poderíamos falar também — lembram-se da
história das fragatas? — na dignificação das Forças Arma-
das. Poderíamos falar na saúde.
A propósito da saúde, recordo que eu próprio fui can-
didato autárquico, num concelho perto de Lisboa. Recor-
do-me de que, no tempo da campanha para as eleições
autárquicas em que o candidato do PS, naquele concelho,
era o Dr. António Costa — não tenho bem a certeza, mas
creio que foi desde essa altura —, o Partido Socialista
chegou ao ponto de montar uma tenda para ilustrar o hos-
pital de que o concelho carecia… Isto passou-se antes de o
PS chegar ao poder.
Protestos do Deputado do PS António Costa.
Posso provar-lhe isso, Sr. Dr. António Costa. Não
tenho a certeza se a iniciativa foi realizada por si pró-
prio,…
Vozes do PS: — Ah!
O Orador: — … mas sei que o foi pelo Partido Socia-
lista e que contou com a presença do Eng.º António Guter-
res. O senhor sabe que assim é, ainda que não se tenha
passado consigo.
Independentemente disso, falou muito no hospital du-
rante a campanha, inscreveu verbas no Orçamento do
Estado para a construção do hospital. Ora, o que é que está
lá feito? Está a primeira pedra, que foi lançada pelos se-
nhores, e um enorme terreno vazio. É isso que lá está e
mais nada! Aliás, como acontece com o novo hospital de
Vila Franca de Xira e com o hospital de Cascais.
Ora, o que o Governo vai fazer é uma parceria com pri-
vados e, finalmente, vai avançar a construção de 10 hospi-
tais que tanta falta fazem às populações. Essa é que é a
questão e, quanto a isso, não há dúvidas de espécie algu-
ma.
10 DE JULHO DE 2002
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
Falaram também — e falam sempre muito — na ques-
tão da RTP.
A este respeito, que fique claríssimo que, com ou sem
alterações, com ou sem mudanças, a empresa vai ser rees-
truturada, vai ser saneada e a RTP vai sair do «buraco» em
que o Partido Socialista indiscutivelmente a deixou. Não
tenham dúvidas sobre isso.
Eu pergunto: para além das muitas críticas, onde está a
tal «oposição construtiva» por parte do Partido Socialista?
Vozes do CDS-PP: — Não existe!
O Orador: — O que propôs o PS? Como é que o PS
propõe resolver os problemas e fazer oposição construtiva?
Nada vi!
Falam muito em questões incidentais. Levantam um
problema enorme se há um qualquer Deputado que não
pode participar nos trabalhos em determinado momento,
mas não consideram um problema enorme a questão da
saúde.
É um problema enorme a questão de uma determinada
decisão em relação ao Benfica, mas não é um problema
enorme o descalabro financeiro.
Parece ser um problema gigantesco a questão de uns
safanões no posto fronteiriço de Rosal de la Frontera, mas
não é um problema enorme a segurança dos cidadãos por-
tugueses.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — É este o estilo de oposição do PS.
Vejamos o que os senhores propuseram.
Quanto à questão da RTP, propunham a criação de uma
comissão eventual. Quanto à questão da taxa de alcoole-
mia, propunham uma comissão «qualquer coisa»… Em
relação à resolução de todas as matérias, o PS só tem uma
solução que é a de criar comissões.
Concluo citando mais uma frase do debate realizado
em 2001 a que já me referi: «A má consciência pode gerar
ou o arrependimento ou o ruído. No vosso caso, gera o
ruído». Esta frase assenta-vos que nem uma luva e, mais
uma vez, é de António Guterres.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente,
peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente,
é para uma interpelação à Mesa relativamente ao andamen-
to dos trabalhos desta sessão.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, mas peço-lhe que
seja breve.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Sr. Presidente,
sei que uma das suas preocupações, de resto comungada
pela generalidade das bancadas, é a do prestígio dos traba-
lhos parlamentares e do Parlamento.
Num debate com a relevância deste que estamos a efec-
tuar, o Governo tem respondido com a presença em força,
quer do Sr. Primeiro-Ministro quer da generalidade dos
Ministros. Assim, pergunto ao Sr. Presidente se não poderá
fazer alguma diligência, já não digo para «compor» a ban-
cada do maior partido da oposição, mas, pelo menos, para
que o seu líder possa participar neste debate sobre o estado
da Nação, frente a frente com o Sr. Primeiro-Ministro.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Marques Guedes,
como bem sabe, não compete ao Presidente da Assembleia
da República garantir a presença de um ou outro Deputado
na Sala. A sua interpelação fica registada.
Sr. Deputado António Costa, pediu a palavra para que
efeito?
O Sr. António Costa (PS): — Sr. Presidente, é para
uma interpelação à Mesa.
O Sr. Presidente: — Sobre que matéria, Sr. Deputado?
O Sr. António Costa (PS): — Sobre a matéria suscita-
da pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes.
O Sr. Presidente: — Então, tem a palavra.
O Sr. António Costa (PS): — Sr. Presidente, é para in-
formar a Mesa de que o Sr. Deputado Ferro Rodrigues
certamente reentrará em breve na Sala, de onde se ausen-
tou temporariamente.
Queria dizer, ainda, com toda a franqueza, que, de fac-
to, é preciso estar um debate a correr muito mal para que
uma questão de tão baixo nível seja suscitada a uma hora
destas.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — A Mesa regista a informação do
Sr. Deputado António Costa.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado
Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Sr. Presidente, Srs.
Deputados, Srs. Membros do Governo, Sr. Primeiro-
Ministro: O prosseguimento da política de submissão ao
Pacto de Estabilidade, de responsabilidade da PSD e do
PS, as declarações catastrofistas acerca da situação das
finanças e da economia, a dramatização com vista a criar a
psicologia de crise e aplainar o caminho para o aperto do
cinto aos mesmos de sempre, criaram um clima de maior
pessimismo e desconfiança que, hoje, é espelhado nos
diversos inquéritos, a consumidores, a empresários e a
cidadãos em geral.
É uma evidência que o País não inverteu, antes acen-
tuou, todas as tendências negativas que se vinham a mani-
festar na economia e que está, hoje, pior do que há três
meses atrás.
44
I SÉRIE — NÚMERO 30
O País terá este ano, segundo o Banco de Portugal,
uma evolução do Produto próximo do zero, em estagnação,
e está mesmo no horizonte a ameaça de uma recessão com
gravíssimas repercussões no tecido produtivo nacional e
social.
Portugal afasta-se da média da União Europeia, apesar
de o Sr. Primeiro-Ministro ter dito aqui, hoje, como tam-
bém disse durante a campanha eleitoral, que a sua preocu-
pação e a sua grande aposta era a de inverter aquela ten-
dência.
A quebra no crescimento vai reflectir-se, também, na
quebra de receitas no Orçamento e a política orçamental
contraccionista, cega e abrupta vai criar acrescidas dificul-
dades a muitas famílias sobreendividadas e a muitas em-
presas e sectores económicos, com o consequente aumento
do desemprego e a diminuição do nível de vida dos traba-
lhadores.
Pode ter a certeza, Sr. Primeiro-Ministro, que a política
orçamental e fiscal que está a ser seguida não vai contraba-
lançar ou estabilizar, vai, sim, intensificar todas as tendên-
cias recessivas e, com o grave endividamento externo,
colocar em risco importantes activos e empresas que, de
um dia para o outro, podem ficar nas mãos do estrangeiro,
como tem vindo a acontecer com as privatizações.
A pressa do Governo não foi no sentido de se preocu-
par com o aparelho produtivo, com a dinamização do in-
vestimento, com o endividamento externo e a substituição
crescente da produção nacional pela estrangeira, com a
deslocalização e encerramento de empresas, com as difi-
culdades de milhares de reformados e de trabalhadores a
perderem, dia a dia, o seu magro poder de compra com a
subida dos preços.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Também a forma como o Governo se
tem comportado em relação ao serviço público de televisão
ficará para a história como um dos exemplos mais elucida-
tivos da sua inépcia e irresponsabilidade com o objectivo
de satisfazer interesses ilegítimos.
Sem ter uma única ideia acerca do serviço público de
televisão que não seja a de ceder aos que irão beneficiar
com a sua destruição, o Governo, a pretexto de uma situa-
ção financeira da RTP, cuja gravidade não negamos e cuja
responsabilidade é assacável tanto ao PS como ao PSD,
decidiu lançar uma ofensiva insensata e sem precedentes
contra este serviço público.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Só que, para além disso, o Governo de-
cidiu enveredar pelo regresso à governamentalização pura
e simples da RTP, procurando arredar, de uma forma in-
constitucional, todos os mecanismos legais destinados a
assegurar, precisamente, a independência da estrutura e o
funcionamento do serviço público de televisão.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Também a desvalorização e a subalter-
nização da escola pública, a extinção a eito da única alter-
nativa de ensino existente no País para o público adulto, o
fim dos juros bonificados à compra de casa própria, a
desresponsabilização do Estado nas suas funções sociais e
a política do negócio da saúde enformam uma política que
é iníqua e injusta.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Na verdade, o Governo incluiu nos
objectivos da sua ofensiva anti-social a prioridade à priva-
tização da gestão dos hospitais e das áreas potencialmente
mais lucrativas da prestação de cuidados de saúde. Trata-se
de uma política que convém aos interesses privados: ga-
nhar mais dinheiro por conta e risco do erário público e
com a saúde dos portugueses.
Experimente o Governo acabar com a escolha, por no-
meação, da gestão e fazê-la por concurso entre equipas de
profissionais do Serviço Nacional de Saúde (SNS), expe-
rimente o Governo atacar os interesses dos lobbies dos
medicamentos, promovendo os genéricos e a prescrição
por princípio activo, experimente o Governo pôr a funcio-
nar serviços e equipamentos públicos de saúde com toda a
sua capacidade, e verá que o caminho para melhor gastar
os dinheiros públicos e para garantir a saúde a todos os
portugueses é o da modernização e da responsabilidade da
gestão pública e não o da sua entrega a gulosos interesses
privados.
Aplausos do PCP.
Daqui afirmamos que os portugueses não ouvirão do
PCP nem a desvalorização dos problemas e das reais difi-
culdades e insuficiências do SNS, nem a desvalorização do
SNS, na acentuada elevação dos índices sanitários do País,
desde o 25 de Abril, e na garantia de cuidados de saúde a
todos os portugueses.
Srs. Deputados, o Governo está a confundir o estado da
Nação com a situação dos privilegiados, dos senhores da
alta finança e da oligarquia, «fazendo ouvidos de merca-
dor» aos ecos que nos chegam de uma situação social
agravada pelo aumento das falências, do encerramento de
empresas, de deslocalizações cirúrgicas, do aumento do
desemprego, dos salários em atraso, da impunidade com
que se viola hoje o exercício de direitos, ameaçando de
repressão trabalhadores e sindicalistas.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Se quiséssemos trazer aqui exemplos,
eles seriam muitos: a OGMA, a Petrogal, a Vestus, a ex-
Quimigal, a indústria vidreira, o vestuário, a cerâmica,
exemplos estes expressos em muitos requerimentos feitos
ao Governo pelo nosso grupo parlamentar, mas, até hoje,
sem qualquer resposta.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — E nestas empresas, Sr. Primeiro-
Ministro, há muitas famílias e muitas mulheres que vêem
os seus direitos e perspectivas ameaçados.
10 DE JULHO DE 2002
Mas também é necessário que se saiba que não é só
no campo dos salários e dos direitos que o retrocesso está
em marcha; é também no campo dos valores. A matriz
política e ideológica expressa no Programa do Governo,
na lei de bases da família e nas declarações do Ministro
da Segurança Social e do Trabalho configuram uma ten-
tativa de fazer retroceder importantes valores e direitos
conquistados pelas mulheres com o 25 de Abril e consa-
grados na Constituição da República Portuguesa e em
vários instrumentos existentes no domínio da igualdade
de direitos das mulheres.
Aplausos do PCP.
A intervenção e luta organizada das mulheres em defe-
sa dos seus direitos, não permitindo que importantes direi-
tos conquistados sejam destruídos, é hoje de grande acui-
dade.
Este Governo também não está preocupado com o esta-
do de inquietação de milhares de trabalhadores da Admi-
nistração Pública, quando, indo ao baú das velharias do
consulado cavaquista, reapresenta uma retocada proposta
de lei dos disponíveis, titulada de «lei de supranumerá-
rios». Isto significa que estão em causa não apenas os
trabalhadores com vínculo precário mas também milhares
de professores e trabalhadores da função pública.
As preocupações do Governo são outras! Avança com
uma nova Lei de Bases da Segurança Social, que, descon-
tada que seja tal ou tal medida, apresenta como alteração
nuclear a eliminação do sistema público universal e solidá-
rio para facilitar a intervenção e o lucro dos privados,
particularmente das grandes seguradoras.
Trata-se, aproveitando também as ambiguidades do PS
nesta matéria, de arrombar a porta da segurança social
pública, por parte do Governo, ao serviço dos bancos e
seguradoras para, depois da porta arrombada, levarem
partes cada vez maiores para a gestão privada. Diga o
Ministro da Segurança Social e do Trabalho o que disser, o
que está em curso é a tentativa de iniciar um processo de
privatização do sistema público de segurança social, com a
redução do papel do Estado na garantia de protecção social
para todos os portugueses e portuguesas.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — O sistema público de segurança social é
um direito fundamental e uma conquista do 25 de Abril,
que tem de ser defendida e consolidada. É neste sentido
que se torna imperioso uma viva resposta por parte dos
portugueses.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Mas a ofensiva não fica por aqui. Agora,
anuncia, na esteira das velhas reivindicações das grandes
confederações patronais, que receberam a prestimosa ajuda
da chantagem de algumas multinacionais, a alteração retró-
grada e radical de todo o edifício jurídico-laboral.
Não ficaria quase nada de fora! Contrato individual de
trabalho, gestão e organização discricionária dos horários
de trabalho, por parte das empresas, com eliminação das
pausas tão duramente conquistadas, trabalho por turnos,
mobilidade geográfica e funcional, levando a polivalência
ao extremo, a facilitação dos despedimentos, o agravamen-
to do lay off, a perversão do direito de contratação colecti-
va, as alterações da lei de greve e das comissões de traba-
lhadores.
Queremos dizer-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que bem
pode manifestar a sua incomodidade pelo facto de o PCP
mobilizar vontades, despertar energias, alertar os trabalha-
dores e ser solidário com a sua luta. Fizemo-lo e fá-lo-
emos sempre que estiverem em causa os direitos e interes-
ses dos trabalhadores e das populações,…
Aplausos do PCP.
… e ao nosso lado estarão muitos, e muitos, trabalha-
dores (que, infelizmente, foram levados pelas suas pro-
messas e votaram no PSD), como já têm estado. E, Sr.
Primeiro-Ministro, conte naturalmente com a nossa luta,
porque vai tê-la, perante uma política retrógrada e de
retrocesso.
Aplausos do PCP.
O PCP nunca defendeu qualquer liberalização descon-
trolada dos fluxos migratórios, mas também não aceita,
nem aceitará, que sejam os imigrantes as vítimas da misé-
ria e de uma nova lei, que, em vez de resolver os proble-
mas que se vão agravar com o desemprego, é iníqua e
injusta.
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Deputados:
O balanço desta primeira parte da actual sessão legislativa
é marcado, sobretudo, pela vaga de decisões e iniciativas
do Governo de direita, que ameaça seriamente o quadro
político-constitucional que formata, hoje, o nosso regime
democrático. Na educação, na saúde, na segurança social,
na política de família, na legislação laboral, na administra-
ção pública, na política de imigração, na comunicação
social pública, nas medidas económicas, financeiras e
orçamentais, estão a ser postas em causa múltiplas solu-
ções progressistas conseguidas e, apesar de tudo, mantidas
ao longo das últimas duas décadas. A política neoliberal,
as concepções ideológicas mais conservadoras e os inte-
resses privatizadores saltam a cada passo da acção do PSD
e do CDS-PP — e ainda a procissão vai no adro! A partir
de Outubro, temos a ameaça de uma nova revisão constitu-
cional. Impõe-se, por isso, uma larga mobilização social
contra a descaracterização do regime democrático. Só ao
Governo podem ser imputadas responsabilidades pela
conflitualidade social que está a surgir e que, seguramente,
se vai agravar. Neste quadro, as forças de esquerda e, em
especial, as forças que se sentam à esquerda deste Hemici-
clo têm igualmente a responsabilidade de não hesitar na
convergência de esforços que impeçam a consumação dos
objectivos da direita. E não é com o verbalismo radical,
para disfarçar as sucessivas abstenções, que se dá um com-
bate sério a esta política.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — A colaboração com a estratégia do Go-
verno…
46
I SÉRIE — NÚMERO 30
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o tempo de que
dispunha está esgotado. Peço-lhe o favor de concluir.
O Orador: — Termino já, Sr. Presidente.
A colaboração com a estratégia do Governo de liquida-
ção de direitos sociais e de uma cada vez maior amputação
das funções sociais do Estado, em nome de um pretenso
pacto de regime (pacto de regime, já temos a Constituição)
ou de Estado, significaria ser-se cúmplice das políticas
mais gravosas deste Governo.
Da nossa parte, PCP, não nos demitiremos de intervir
na defesa das políticas de progresso. Contra medidas de
claro retrocesso económico e social, assumimos as nossas
responsabilidades. Que cada um saiba assumir as suas!
Como já afirmei, dirão alguns que três meses são pouco
na vida de um governo e ainda menos na vida de um país.
Mas os golpes já dados, em três meses, pela política do
Governo nos interesses de tantos portugueses e as ameaças
que desenvolve para o futuro são suficientes para colocar
na ordem do dia a necessidade de uma ampla e decidida
resistência contra uma política de injustiça e de retrocesso
social.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a pala-
vra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presiden-
te, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Governo
está descredibilizado aos olhos dos portugueses — e não
me baseio em sondagens para fazer esta afirmação. Será
fácil concluí-lo pelo que ouvimos, no dia-a-dia, nos trans-
portes, no mercado, no café, na rua, nas deslocações par-
lamentares que efectuamos ou nas audiências que realiza-
mos nesta Casa.
Para isso, contribuiu certamente o facto de o Governo
fazer o que não disse e não fazer o que disse, como, por
exemplo, quando prometeu baixar os impostos e, afinal,
após a tomada de posse, uma das suas primeiras medidas
foi a do aumento do IVA.
Por outro lado, parece que o Governo só não privatiza
o País porque ainda não entendeu como fazê-lo. Dos meios
de comunicação social, aos transportes, ao ensino, às uni-
dades hospitalares e a sectores tão fundamentais para o
desenvolvimento, como a água, o Governo quer privatizar
tudo, desresponsabilizando-se de sectores estratégicos,
deixando de geri-los, passando o seu controlo para os
privados e passando-os para uma lógica de mercado, onde
o objectivo da obtenção do lucro se sobrepõe claramente à
qualidade e ao bom serviço à população e se opõe clara-
mente a baixos custos para os utentes desses serviços.
Os Verdes consideram que, nesta lógica, o Governo
está a hipotecar o futuro do País, não só com esta onda de
desresponsabilização de áreas vitais para o desenvolvimen-
to mas também comprometendo, desde logo, as gerações
mais novas. Só para dar alguns exemplos: afasta os jovens
da titularidade do rendimento social de inserção, mesmo
aos que, com prova provada, necessitam dele; retira aos
jovens o crédito bonificado à habitação, dificultando-lhes a
aquisição de casa própria; retira aos, hoje, jovens garantias
de reforma no futuro, quando põe em causa a estabilidade
financeira da segurança social; e a resposta que dá às desi-
gualdades de acesso e sucesso no ensino é excluir os
jovens em circunstâncias diversas.
O Governo hipoteca ainda o futuro, quando parece fa-
zer uma clara opção pela dispensabilidade da educação
ambiental. É que, da fusão da Direcção-Geral de Ambiente
com o IPAMB (entidade que, ainda assim, promovia ac-
ções de educação ambiental), ninguém percebeu ainda o
que vai resultar. Por outro lado, a extinção do Instituto de
Inovação Educativa, que, na área da educação, promovia e
apoiava projectos de educação ambiental, deixa uma lacu-
na que o Governo ainda não explicou como ou se vai col-
matar.
Esperemos que a Conferência de Joanesburgo consiga
influenciar o nosso Governo, relativamente à importância
da aposta na educação para prosseguir um desenvolvimen-
to sustentável.
Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Depu-
tados: Para falar sobre o estado da Nação, podíamos falar
de como, neste país, alguns continuam a assistir, impávi-
dos e serenos, à realidade cruel do aborto clandestino, ao
qual tantas mulheres portuguesas se sujeitam.
Ou podíamos falar da opção de exclusão e de segrega-
ção, que se prossegue na política de imigração, com as
quotas de imigrantes ou a restrição ao seu reagrupamento
familiar.
Ou podíamos falar do desequilíbrio e da desestabiliza-
ção de qualquer organização familiar, quando a iminência
do desemprego e da insegurança quanto ao futuro profis-
sional é o que resulta do quadro de disponíveis da função
pública ou quando a flexibilidade é o ponto de honra de
inclusão nas leis do trabalho.
Ou podíamos falar das assimetrias regionais deste país,
onde dois terços da população se concentra no litoral e
onde, no interior, a deslocação para as sedes de concelho
se torna imperativa, porque, ainda assim, é onde existem
equipamentos. E daqui podemos continuar sem perceber
como é que se encerram escolas, como é que a carência de
médicos no interior é tão relevante e por que é que faltam
enfermeiros, faltam equipamentos e faltam transportes. E,
claro, as pessoas fogem do isolamento.
Ou podíamos falar de um País cada vez mais depen-
dente do exterior em tanta coisa, desde a energia, quando
temos tantas condições climatéricas para apostar em ener-
gias alternativas, até à produção ou à alimentação, com a
política agrícola comum ou a política comum de pescas,
definidas por órgãos de uma União Europeia que os suces-
sivos governos ajudaram a construir e que hoje não os
ouve e insiste em não respeitar a diversidade e a especifi-
cidade de cada país.
Sr. Primeiro-Ministro, quero dizer-lhe que, se já estava
preocupada pelo facto de um Governo que se diz tão activo
nada ter feito em relação a matérias dramáticas como a
extracção de inertes ou o destino de toneladas e toneladas
de farinha de animais que constituem um verdadeiro peri-
go para a segurança e para a saúde pública, fiquei ainda
mais preocupada com a sua resposta ao meu pedido de
esclarecimento. Isto é, demonstrou que não têm medidas
pensadas para resolver estes atentados.
10 DE JULHO DE 2002
Enquanto oposição, os senhores exigiam acção imedia-
ta, acção urgente, sem mais demoras, e subscreviam as
preocupações e as exigências de Os Verdes sobre a extrac-
ção de inertes; actualmente, no Governo, calam-se e nada
fazem! A vossa inacção nestas questões, nesta altura, já
vos torna co-responsáveis por situações de risco que daí
decorram e pelo agravamento da situação!
É esta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, uma parte do
estado da nossa Nação que este Governo não mudará,
porque tal só aconteceria, na perspectiva de Os Verdes, se,
na verdade, se alterassem políticas que, em vez de hipote-
carem o futuro, trabalhassem para melhorar o presente,
garantindo o futuro, um futuro com direitos adquiridos,
reforçados, onde a qualidade de vida fosse uma realidade.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a pala-
vra o Sr. Deputado Machado Rodrigues.
O Sr. Machado Rodrigues (PSD): — Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, Sr.as e
Srs. Deputados: Os elementos divulgados recentemente
sobre as contas públicas nacionais em 2001 e sobre a situa-
ção e previsões para a economia portuguesa no horizonte
próximo não constituíram verdadeiramente uma completa
surpresa, depois do que se foi conhecendo, ao longo deste
ano de 2002, sobre como a nossa vida colectiva estava, de
facto.
Nem o défice de 2001 a rondar os 4%, nem a previsão
da quase estagnação do PIB em 2002 eram, desde há al-
guns meses, completamente impensáveis. E já em Abril
passado o FMI apontava para Portugal um crescimento de
0,8% em 2002, em clara divergência com o da zona do
euro.
Havia quem, com cada vez menor convicção, conti-
nuasse a recusar a realidade só porque ela não é agradável
e aponta para responsáveis, e quem não hesitasse em quali-
ficar de alarmistas os que insistiam em que se falasse ver-
dade, já que a vida dos países não se pode construir em
cima de ficções nem os problemas se resolvem só por se
dizer que não existem.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Entre as entidades para quem as previsões agora torna-
das públicas pelo Banco de Portugal foram apenas a con-
firmação dos receios há muito manifestados e dos avisos
sucessivamente feitos, está, certamente, o primeiro respon-
sável dessa instituição, o seu governador.
De facto, o Governador do Banco de Portugal, já no
início de 2000, sublinhava que o País tinha de «mudar de
vida», porque se o não fizesse o crescimento da economia
seria progressivamente menor e, em vez de nos aproxi-
marmos do nível de vida dos outros países da União, fica-
ríamos progressivamente mais longe.
Nos dois anos que se seguiram a este aviso de Feverei-
ro de 2000, «não mudámos de vida». O governo do PS não
quis ouvir ou não teve coragem para enfrentar as dificul-
dades que o «mudar de vida» acarreta e, em mais de dois
anos de lamentável inépcia polvilhada de pretensas habili-
dades, conduziu o País à situação correspondente aos re-
ceios e perigos que o Governador do Banco de Portugal
tinha antecipado.
A situação herdada é a de estagnação, com riscos de
recessão neste ano de 2002. E isto seria dramático e sem
esperança se, entretanto, não tivéssemos decidido que
íamos «mudar de vida». O País decidiu mudar de Governo
para poder mudar as nossas vidas para melhor.
Os responsáveis pelas dificuldades que enfrentamos
estão agora sentados aqui ao lado e, tal como foram inca-
pazes de «mudar de vida» enquanto estiveram no poder,
também não se mostram capazes, na oposição, de assumir
os seus erros com humildade, de distinguir o que são os
interesses vitais do País das efémeras obstaculizações e
buscas de oportunidades mediáticas com que tentam inu-
tilmente fazer esquecer um passado recente de incapacida-
des e de erros.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas isso pouco interessa. Apenas fará consumir algum
tempo adicional, tornando um pouco menos rápido o apa-
recimento dos resultados das acções que é necessário to-
mar e que estão a ser tomadas.
O que interessa, o que o País precisa é que o novo Go-
verno continue a tomar as medidas e a equacionar e a
adoptar as reformas que vão restaurar a confiança dos
portugueses, dos empresários, dos investidores e dos traba-
lhadores, que vão fazer regressar o investimento estrangei-
ro, que vão propiciar o aumento da nossa produtividade e
competitividade, bases essenciais para o relançamento da
economia, o aumento das exportações e o equilíbrio das
nossas contas externas.
O saneamento das finanças públicas, com a travagem
da espiral de aumento das despesas e a limitação do défice
a valores compatíveis com os compromissos perante a
União Europeia e com a salvaguarda da continuação da
vinda das transferências financeiras, que nos são impres-
cindíveis e, portanto, não podem ser postas em risco, era
claramente — como o défice agora apontado de 3,9% do
PIB, em 2001, veio demonstrar — não só uma prioridade
como uma emergência.
Com rigor e determinação, o Governo não hesitou em
tomar as medidas necessárias, algumas delas desagradáveis
e até mesmo impopulares, mas indiscutivelmente indispen-
sáveis para fazer face à dimensão do problema herdado.
A decisão anunciada pelo Governo, no fim-de-semana
passado, do lançamento de um significativo programa de
investimentos públicos na área das acessibilidades e a
declaração da Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças admi-
tindo uma curta transitoriedade para a vigência do acrés-
cimo de 2% na taxa do IVA são lidas por mim como sinais
de optimismo e confiança no sucesso das medidas de
saneamento das finanças públicas e de relançamento da
nossa economia.
Mas exactamente porque leio como referi, quero deixar
uma nota sobre a incidência territorial que veio a público
do programa de investimentos que mencionei, nota que
bem compreendida será, estou certo, Sr. Primeiro-
Ministro, se mencionar que, como sabe, sou Deputado
eleito por um dos distritos menos desenvolvidos do País, o
de Bragança.
48
I SÉRIE — NÚMERO 30
Sei que o efeito de um investimento em acessibilidades
é, na altura em que é feito (principalmente este tipo de
investimentos), independente da zona em que se realiza
mas que, em termos de produtividade, provavelmente a
produtividade induzida será maior se for feito em zonas
mais populosas. Mas esse critério da produtividade não
pode ser o único critério seguido quando o que está em
causa é a necessidade de recuperar terríveis desequilíbrios
que existem no nosso país. E as medidas a tomar não po-
dem acentuar essas assimetrias.
As preocupações que o Sr. Primeiro-Ministro sempre
tem manifestado sobre esta matéria são, para mim, a garan-
tia de que o Governo terá sempre presentes os objectivos
primordiais da coesão nacional e que esses objectivos terão
tradução nas decisões.
Fechada esta nota, quero sublinhar que, no que respeita
ao saneamento das contas públicas, o País já está a «mudar
de vida», o rigor e a verdade voltaram e com eles a credibi-
lidade interna e externa.
O aumento da competitividade da nossa economia é
condição essencial e padrão de medida para o retomar da
convergência com a União Europeia. Esse indispensável
aumento da competitividade está indissociavelmente liga-
do às condições em que operam as empresas localizadas
em Portugal e às condições que possam ser proporcionadas
a investidores, nacionais e estrangeiros, que se disponham
a tomar novas iniciativas em Portugal.
Sem investimento não há aumento da competitividade
nem aumento de produção e, por isso, o apoio ao inves-
timento produtivo é essencial. O País tem de ser capaz de
suprir com maiores quotas de produção nacional o seu
consumo interno e tem de ser capaz de ampliar as expor-
tações.
Tem de ser capaz e vai ser capaz!
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — As condições em que operam as empre-
sas localizadas e que venham a localizar-se em Portugal
vão ser melhoradas; o Programa para a Produtividade e
Crescimento da Economia traduz uma política determinada
e realista de revitalização da actividade económica e inclui
medidas que constituem um conjunto coerente e realista
que vai fazer relançar o crescimento económico do País.
No decorrer da execução alguns aspectos serão certa-
mente aprofundados. E, por mim, Sr. Primeiro-Ministro e
Sr. Ministro da Economia, gostaria, por um lado, que a
problemática específica das PME pudesse ser mais siste-
matizada e identificada, dada a maior dificuldade dos des-
tinatários em percepcionarem as vias de que podem socor-
rer-se para ajudar a resolver as dificuldades e a pôr em
prática ideias e iniciativas, e, por outro lado, que, além do
projecto «Marcas Portuguesas», se encontrasse uma fór-
mula indutora de os portugueses privilegiarem as marcas e
os produtos portugueses, tornando claro que, ao comprar-
mos português, estamos a apoiar a economia portuguesa,
estamos a ajudar-nos a nós próprios.
O País está, finalmente, a «mudar de vida». O Governo
lançou mãos à obra e o País vai acompanhá-lo. Há dificul-
dades a vencer, mas o caminho está aberto para as ultra-
passarmos.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — Muito bem!
O Orador: — O País já está a mudar para melhor.
O País vai criar riqueza, para que possamos viver
melhor, para que possamos distribuir melhor, para que
possamos acorrer aos que mais precisam.
Queremos ter e vamos ter um Portugal mais próspero
para poder ser um Portugal mais justo e mais solidário.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a pala-
vra a Sr.ª Deputada Clara Carneiro.
A Sr.ª Clara Carneiro (PSD): — Sr. Presidente, Sr.
Primeiro-Ministro, Srs. Ministros, Srs. Deputados: Esta-
mos a discutir o futuro, quando analisamos o presente.
Um país confiante, uma população motivada e um go-
verno firme, empenhado, rigoroso e trabalhador são os
ingredientes de alma e de acção necessários ao momento
presente.
A saúde é a primeira preocupação dos portugueses, à
frente da educação, da segurança, da justiça e da economia
— revela-nos o estudo hoje divulgado.
Como prioridade para a intervenção na sociedade por-
tuguesa, a saúde também vem em primeiro lugar.
É com grandes críticas para as listas de espera, para os
preços dos medicamentos, para o modo como são tratados
e atendidos os cidadãos nos centros de saúde e hospitais
que os portugueses avaliam a realidade social que os en-
volve.
Quero acrescentar, à lógica desta primeira preocupação
dos portugueses, que a saúde não são só direitos mas tam-
bém, e igualmente, deveres. Ela depende de todos nós. Os
primeiros responsáveis pela nossa saúde e pela saúde da
comunidade somos nós próprios.
Numa sociedade materialista e individualista como a
que vivemos, a responsabilidade individual e a solidarie-
dade colectiva são o primeiro garante à manutenção dos
princípios de universalidade e de equidade, inabaláveis
nesta vertente de políticas sociais.
Quanto às listas de espera, este Governo já aprovou em
Conselho de Ministros uma resolução que enquadra o
Programa Especial de Combate às Listas de Espera Cirúr-
gicas, a executar em dois anos, onde é concedida priorida-
de a quadros clínicos considerados urgentes e onde se
estabelece um regime de atendimento dos doentes em
correspondência inversa dos tempos de espera.
O Governo apresentou também a nova lei de gestão
hospitalar. Com ela, deixamos de ter um qualquer serviço,
seja médico ou cirúrgico, governado e administrado de
forma colegial e fragmentada, em que a responsabilidade
está diluída e a culpa morre solteira. Com esta lei de gestão
hospitalar, os profissionais vão deixar de receber o mesmo,
quer trabalhem muito ou pouco, e vão passar a ter incenti-
vos e prémios ao desempenho.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
10 DE JULHO DE 2002
A Oradora: — Acresce, ainda, que, com esta lei, o fi-
nanciamento dos serviços será assegurado pelo trabalho
efectivamente prestado, acabando, em definitivo, a velha
prática do «paga-se gastando…». O sistema passa a respei-
tar a sua vocação de prestador de serviços ao utente, em
vez de cumprir interesses próprios, individuais ou de estru-
tura.
É neste contexto que o poder da influência social da
«via verde» — que hoje beneficia quem melhor se move
no sistema, ou seja, os mais fortes — dá lugar a que os
mais fracos e desfavorecidos tenham maior oportunidade
de escolha.
Mais do que a vontade política de mudar de modelo, é
o cidadão que actualmente exige que o façamos, não como
uma medida isolada, mas como um passo decisivo num
projecto mais vasto de mudança.
O Governo vai também responder à preocupação dos
doentes com o preço dos medicamentos, garantindo que as
doenças mais incapacitantes e os doentes de menores
recursos tenham acesso privilegiado ao medicamento.
Na área da toxicodependência, a integração do SPTT
(Serviço de Prevenção e Tratamento de Toxicodependen-
tes) no IPDT (Instituto Português da Droga e Toxicode-
pendência) é sinal de uma política articulada, de controlo
financeiro e de resultados, de racionalização de meios e de
melhor aproveitamento de recursos humanos. É uma polí-
tica de implementação de indicadores e linhas de orienta-
ção em todas as áreas relacionadas com o fenómeno da
toxicodependência.
Há que dar, com urgência, particular atenção aos esta-
belecimentos prisionais, onde os dados nos apontam para
consumos elevadíssimos de estupefacientes e consequente
propagação de doenças infecto-contagiosas. É urgente que
em cada estabelecimento prisional se desenvolvam os
núcleos de acompanhamento médico ao toxicodependente.
É urgente uma política de saúde alargada aos estabeleci-
mentos prisionais, sob a responsabilidade do Ministério da
Saúde.
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, o tempo de que
dispunha esgotou-se. Peço-lhe para concluir.
A Oradora: — Vou concluir, Sr. Presidente.
Já que não posso falar das políticas sociais, gostaria de
acrescentar apenas o seguinte: este Governo não está com
tempo nem com margem para errar. Este Governo não
pode governar para as sondagens nem pode deixar influen-
ciar-se por elas, sejam boas ou más. Deve, sim, ser capaz
de interpretá-las. E a minha interpretação é a de que este
Governo, de facto, agitou, e as sondagens mostram-no.
Se pensarmos bem, quem é que gosta de ser acordado
quando está a dormir profundamente? Só quando nos aper-
cebemos de que valeu a pena estarmos acordados é que
nos passa a zanga e damos valor a quem nos acordou.
Os portugueses julgar-nos-ão!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a pala-
vra a Sr.ª Deputada Elisa Ferreira.
O Sr. António Costa (PS): — Sr. Presidente, peço a
palavra.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. António Costa (PS): — Para fazer uma interpe-
lação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sobre que matéria, Sr. Deputado?
O Sr. António Costa (PS): — Sr. Presidente, na inter-
venção do Sr. Deputado Ferro Rodrigues foi feito um
apelo ao Governo em matéria de lei da estabilidade orça-
mental.
O Sr. Presidente acaba de distribuir os dois pareceres
das Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da
Madeira, aprovados por unanimidade, que suscitam, desig-
nadamente, a questão da inconstitucionalidade da proposta
de lei n.º 16/IX. Sublinho que um dos pareceres é da
Assembleia Legislativa Regional da Madeira para que o
Sr. Deputado Guilherme Silva não considere que é mais
uma manobra do PS, porque, creio, não podemos ser sus-
peitos de controlar os Deputados do PSD na Assembleia
Legislativa Regional da Madeira, que votaram favoravel-
mente este parecer!
Portanto, Sr. Presidente, gostaria de saber se, neste
momento, está algum membro do Governo inscrito para
que, ainda na fase de debate do estado da Nação, possa
responder ao apelo que lançámos, visto que esta questão é
determinante para saber como é que os trabalhos de ama-
nhã poderão decorrer, tendo em conta a generalização da
ideia de que estamos perante uma proposta de lei grossei-
ramente inconstitucional.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Peço a palavra, Sr.
Presidente.
O Sr. Presidente: — É sobre a mesma matéria?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, quan-
to à questão que o Sr. Deputado António Costa está a colo-
car, já é conhecida a posição do Governo.
A Sr.ª Ministra das Finanças já fez declarações no sen-
tido de que, relativamente à lei da estabilidade orçamental,
que considera da maior importância, não se discutam ques-
tões de constitucionalidade…
O Sr. José Magalhães (PS): — Isso é impossível!
O Orador: — … e de que há abertura para, na especia-
lidade, ponderar-se as questões que possam ser levantadas
em relação a essa matéria e introduzir-se as alterações que
afastem quaisquer dúvidas de constitucionalidade. É tão
simples quanto isto!
50
I SÉRIE — NÚMERO 30
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Guilherme Silva,
julgo que já explanou a sua posição, que é muito clara,
pelo que vou dar a palavra ao Sr. Ministro dos Assuntos
Parlamentares, que a pediu.
O Orador: — Vou já terminar, Sr. Presidente.
Os Srs. Deputados do Partido Socialista interpuseram
recurso da admissão deste diploma pelo Sr. Presidente da
Assembleia da República. É sabido que, quando é admiti-
do um diploma, o problema da constitucionalidade levan-
ta-se para inconstitucionalidades que são incontornáveis,
inultrapassáveis e grosseiras…
O Sr. José Sócrates (PS): — «Incontornáveis»?!
O Orador: — Desculpe, Sr. Deputado, mas é evidente
que, quando as questões podem ser perfeitamente ultrapas-
sadas e corrigidas na especialidade, é nesse sede que isso
deve ser feito.
Vozes do PSD: — Claro!
O Orador: — E há total abertura, quer do Governo
quer dos partidos que integram a coligação que apoia o
Governo, no sentido de, na especialidade, ultrapassar essas
questões. Os Srs. Deputados têm de dizer claramente ao
País se o Partido Socialista está de acordo com as soluções
substantivas da lei da estabilidade orçamental ou se não
está, se vota a favor das questões substantivas ou se vai
apelar para questões incidentais e regimentais para votar
contra.
É esta questão que está em causa e não outra. Se o pro-
blema é das inconstitucionalidades, pode ser ultrapassado.
O Sr. Presidente: — Para uma interpelação à Mesa,
tem a palavra o Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, na
minha bancada não conhecemos a diferença entre inconsti-
tucionalidades grosseiras e inconstitucionalidades subtis e
o que constatamos é que o Sr. Deputado Guilherme Silva
acabou de colocar o Parlamento perante uma situação
única: é que, estando a ser considerado um recurso sobre a
admissão da proposta de lei da estabilidade orçamental por
inconstitucionalidade, o Sr. Deputado Guilherme Silva
acabou de confirmar que a bancada maioritária considera
que a lei é inconstitucional, tanto que, nessa matéria, tem
de ser corrigida,…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Eu não disse nada
disso!
O Orador: — … mas isso não é razão suficiente para
que ela não seja aceite. Creio que, deste ponto de vista,
este esclarecimento é precioso, porque termina qualquer
debate acerca da aceitabilidade da lei, que, naturalmente,
só pode ser recusada.
Vozes do BE: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Francisco Louçã, V.
Ex.ª sabe tão bem como eu qual é o procedimento a cum-
prir quando há impugnação por inconstitucionalidade. Esse
procedimento está a ser cumprido, aguardamos um parecer
da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liber-
dades e Garantias e votaremos esse parecer no momento
oportuno.
Vou agora dar a palavra ao Sr. Ministro dos Assuntos
Parlamentares que, com a sua intervenção, talvez esclareça
tudo e dispense as intervenções suplementares. Chamo,
contudo, a atenção da Câmara de que estamos a afastar-nos
do tema do debate de hoje.
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, pede a pala-
vra para que efeito?
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís
Marques Mendes): — Sr. Presidente, pretendo interpelar a
Mesa porque a interpelação do Sr. Deputado António Cos-
ta foi dirigida ao Governo e o Governo não quereria deixar
de responder, ainda que de uma forma breve.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.
Presidente, sobre a questão que o Sr. Deputado António
Costa coloca acerca da lei da estabilidade orçamental, a
posição do Governo é muito clara: o Sr. Primeiro-Ministro
acabou de dizer, em resposta a uma pergunta do Sr. Depu-
tado Ferro Rodrigues, de uma forma muito simples e clara,
que, se existirem dúvidas sobre a constitucionalidade de
algumas das disposições desta lei, o Governo dá total aber-
tura para que, em sede de comissão, essas questões de
eventuais dúvidas sejam resolvidas, designadamente pelas
alterações que se tornem indispensáveis, com a condição
de que essas alterações, se as dúvidas persistirem, não
toquem na questão essencial, que é o conteúdo do diploma.
O Sr. José Magalhães (PS): — E como é que se faz a
quadratura do círculo?!
O Orador: — Uma coisa é a questão de fundo, outra é
a substância da matéria. E, a esse respeito, devemos tam-
bém acrescentar o seguinte: não venham os Srs. Deputados
do Partido Socialista desculpar-se com questões de nature-
za formal para depois, ao cabo e ao resto, pretenderem
fazer alterações na substância do diploma.
O Sr. José Magalhães (PS): — Não se trata de ques-
tões de ordem formal!
O Orador: — Se forem alterações quanto à substân-
cia do diploma, então, o Governo, desde já, tem de con-
cluir que o que o Sr. Deputado Ferro Rodrigues disse, da
tribuna,…
O Sr. António Costa (PS): — Cuidado com o que diz!
O Orador: — … é um exercício de hipocrisia política.
Porque uma coisa é fazer alterações para que não haja
dúvidas de constitucionalidade; outra coisa, bem diferente,
é alterar a substância da lei. Temos de ser sérios e coeren-
10 DE JULHO DE 2002
tes! O espírito de abertura do Governo é total, mas alterar a
lei, na sua substância, é um exercício de hipocrisia política,
Sr. Deputado Ferro Rodrigues. É mesmo assim!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Presidente, uma última nota: como todos sabemos,
qualquer lei que entra nesta Assembleia, de um modo
geral, tem sempre alterações em sede de especialidade. E
mesmo as questões de constitucionalidade, Sr. Deputado
José Magalhães, nunca são, de um modo geral, questões
líquidas, podem ser sempre discutidas e ultrapassadas em
sede de comissão. O senhor está farto de saber isso!
O Sr. José Magalhães (PS): — Mas as inconstitucio-
nais não podem ser admitidas!
O Orador: — Mas há uma coisa essencial, como o Sr.
Deputado Ferro Rodrigues sabe: na quinta e na sexta-feiras
próximas, há uma reunião do ECOFIN absolutamente
essencial. A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças, em
nome do Governo, comprometeu-se, na última reunião do
ECOFIN, a apresentar a lei da estabilidade orçamental. É
absolutamente essencial, do ponto de vista dos compro-
missos de Portugal no seio da União Europeia.
Protestos do PS.
Querer agora introduzir um expediente para que esta lei
não seja votada na generalidade, com este compromisso de
eventuais alterações na especialidade… Srs. Deputados e
Sr. Deputado Ferro Rodrigues, sejamos francos: uma ques-
tão dessa natureza não é um bom serviço prestado a Portu-
gal, à imagem de Portugal e à credibilidade de Portugal
junto da União Europeia.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — A lista dos oradores inscritos para
esta questão incidental — já cá faltava uma questão inci-
dental para prolongar os nossos trabalhos, infelizmente! —
é longa. Constam dela os Srs. Deputados António Costa,
Guilherme Silva e Bernardino Soares.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Costa.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, eu ti-
nha-me inscrito ainda antes do Sr. Ministro Luís Marques
Mendes para defesa da honra da minha bancada face a uma
afirmação do Sr. Deputado Francisco Louçã.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, qual foi a afirma-
ção que considera ofensiva?
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, o Sr.
Deputado Francisco Louçã imputou-me uma afirmação
que eu, como líder da bancada, fiz relativamente a esta
questão e que não corresponde à verdade.
O Sr. Presidente: — Bom, eu não a reputo muito ofen-
siva. Em todo o caso, Sr. Deputado, peço-lhe que seja
breve na sua defesa da honra.
Tem a palavra.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, Sr.
Deputado Francisco Louçã, ou não esteve atento ou, inten-
cionalmente, deturpou aquilo que eu afirmei.
Eu não fiz, em nenhuma parte da minha intervenção, a
afirmação e o reconhecimento de que a lei em questão
enfermava de inconstitucionalidades. Eu disse apenas duas
coisas: primeira, se, eventualmente, a proposta de lei en-
fermar das inconstitucionalidades que lhe imputam, não é
razão para procedência do recurso interposto da decisão do
Sr. Presidente de a admitir (não é!);…
O Sr. José Magalhães (PS): — Ai não?!
O Orador: — … segunda, se se colocarem dúvidas
sobre a constitucionalidade, há abertura, quer do Governo,
aqui reafirmada pelo Sr. Ministro dos Assuntos Parlamen-
tares, quer das bancadas da coligação que apoia o Gover-
no, para as ponderar na especialidade e ultrapassá-las,
fazendo, designadamente, se for caso disso, alterações.
São afirmações completamente distintas daquelas que
V. Ex.ª referiu ao dizer que eu afirmei, e reconheci, que
havia inconstitucionalidades e que, mesmo assim, estava
insensível à sua solução e a ultrapassá-las. Desculpe que
lhe diga, Sr. Deputado Francisco Louçã, mas não é honesto
proceder desta forma.
O Sr. Presidente: — Para dar explicações, tem a pala-
vra o Sr. Deputado Francisco Louçã, a quem peço também
que seja curto.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, serei
curto, sobretudo porque a ofensa foi muito curta! Aliás,
devo dizer que, a respeito de incidentes e de multiplicação
de defesas da honra sem justificação, tivemos agora o
melhor exemplo que a Câmara podia ter. Eu ofendi o Sr.
Deputado Guilherme Silva porque não concordei com as
suas palavras e não concordei com a sua interpretação.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Porque as deturpou!
É bem diferente!
O Orador: — Entendo que para a sua maioria isto seja
ofensivo! Aliás, devo dizer-lhe, Sr. Deputado Guilherme
Silva, do alto da nossa experiência de pessoas mais velhas
do que o Primeiro-Ministro, que esta questão da inconsti-
tucionalidade não pode ser tratada com leveza, e o senhor
tratou-a com uma leveza extraordinária!
Apresentou-nos dois argumentos, duas declarações
peremptórias: uma, é a de que, se a proposta de lei for
inconstitucional, admite-se à mesma! Está errado, Sr.
Deputado! Se for inconstitucional — essa é a função do
Presidente e de um dispositivo regimental que passa pela
audição da 1.ª Comissão —, não se admite! A segunda é a
de que, se for inconstitucional, corrige-se. Voltamos exac-
tamente ao mesmo.
O que o senhor está a dizer-nos é que não toma posição
sobre a substância, apelando a uma posição sobre a subs-
tância! A Constituição é a lei das leis! E é justamente isso
que, lido com atenção, diz o parecer da Assembleia Legis-
lativa Regional da Madeira, que o senhor, desta vez, tam-
bém devia ler com algum cuidado.
52
I SÉRIE — NÚMERO 30
Portanto, a correcção da inconstitucionalidade far-se-á,
se a lei for aprovada, pelo Presidente da República e pelo
Tribunal Constitucional. E o Parlamento tem de ter a no-
ção muito clara que deve identificar os erros e impedir que
eles se verifiquem.
É extraordinário que, ao ser adiada, na 1.ª Comissão, a
discussão de hoje, a bancada do PSD tenha dado o sinal de
que percebia esta inconstitucionalidade e de que o Gover-
no a temia. Não nos queira argumentar que o vazio político
de um Governo tão mal preparado, tão precário e tão
demagógico sobre as questões da constitucionalidade é
meritório. Porque isso é que não é, Sr. Deputado Guilher-
me Silva!
O Sr. António Costa (PS): — Peço a palavra, Sr. Pre-
sidente.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
O que não faz sentido é a forma como se desvaloriza…
O Sr. Presidente: — É desejável que termine, Sr. De-
putado, porque já explicou tudo o que tinha a explicar. A
interpelação é devida à Mesa e já percebi perfeitamente o
raciocínio de V. Ex.ª, que para mim está explicadíssimo.
O Orador: — Vou já terminar, Sr. Presidente, mas
permitir-me-á admitir que sei melhor como é que o meu
raciocínio vai terminar do que V. Ex.ª, que o está a ante-
cipar.
O que me parece grave é esta tendência perigosa do
Governo de desvalorizar como mera formalidade o respei-
to pela Constituição.
O Sr. José Magalhães (PS): — Exacto!
O Orador: — Fê-lo agora o Sr. Ministro Marques
Mendes, como fez hoje de manhã, na 1.ª Comissão, o Sr.
Secretário de Estado do Orçamento, que disse que a pri-
meira preocupação do Governo não tinha sido olhar para a
Constituição, mas que estava disponível para se corrigir
aquilo que obviamente era inconstitucional.
Portanto, creio que, com toda a vantagem para o bom
andamento dos trabalhos e para a consolidação das finan-
ças públicas, deveria fazer-se o debate, na generalidade, da
proposta de lei n.º 16/IX, a qual baixaria à respectiva co-
missão, sem votação.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, se ainda não con-
cluiu, eu tenho que lhe tirar a palavra.
O Orador: — Termino já, Sr. Presidente.
A Sr.ª Ministra das Finanças chegaria ao ECOFIN di-
zendo que o processo legislativo estaria em andamento,
que estaríamos já a trabalhar na especialidade, que faría-
mos a votação final global em Setembro, porque não pode-
rá dizer outra coisa que não isto, na medida em que, mes-
mo que se vote amanhã a proposta de lei, a votação final
global não será antes de Setembro.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD e do CDS-PP.
Se assim for, ganha um argumento importante, que é o
do potencial consenso parlamentar alargado relativamente
a esta matéria. Caso contrário, creio que as notícias para o
ECOFIN podem ser más!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado António Costa,
devo dizer que tinha antecipado absolutamente a sua linha
de raciocínio.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. António Costa (PS): — Para fazer uma interpe-
lação à Mesa, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. António Costa (PS): — Sr. Presidente, creio que
coloquei uma questão muito concreta ao Governo, que era
a de saber qual era a resposta ao apelo que o Sr. Deputado
Ferro Rodrigues lançou ao Governo. E o apelo que foi
lançado era no sentido de saber se o Governo aceita ou não
que, no termos do debate na generalidade, a proposta de lei
n.º 16/IX baixe à comissão, sem votação, sendo esta uma
questão essencial, como o Sr. Presidente e todas as pessoas
compreendem.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — E foi respondido!
O Orador: — É que, nos termos do Regimento, não
pode ser admitida uma proposta de lei inconstitucional!
Creio que, compreendendo todos a importância desta
matéria legislativa, seria possível um consenso (pelo me-
nos, nós estaríamos disponíveis para isso) para que se
fizesse o debate na generalidade desta proposta de lei com
a condição de ela baixar à comissão, sem votação, para
expurgo das inconstitucionalidades. Não podemos é aceitar
nem associar-nos de forma alguma a um acto de votação
nesta Câmara de uma proposta de lei que todas as pessoas
sabem que é inconstitucional.
Portanto, manda o bom senso que, aproveitando esta
disponibilidade, o Governo corresponda, aceitando que a
proposta de lei baixe à comissão, sem votação, e que haja
um trabalho em sede de especialidade para expurgar as
inconstitucionalidades e as outras matérias de fundo que
têm de ser alteradas. Caso contrário, teremos um incidente
totalmente inútil, que é o de criar uma divisão artificial na
Câmara quanto a uma questão de fundo, quando podemos
ter um entendimento.
O Sr. Ministro Marques Mendes pode fazer os exercí-
cios que quiser sobre hipocrisia e tentar insultar o Sr. De-
putado Ferro Rodrigues, mas há-de perceber que tem ainda
de comer alguns bifes para conseguir fazê-lo…!
10 DE JULHO DE 2002
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares pediu a pa-
lavra para, suponho, dar uma resposta a esta pergunta que
efectivamente é dirigida ao Governo e não à Mesa.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sim,
Sr. Presidente, mas vou fazê-lo rapidamente.
Em primeiro lugar, gostaria de reafirmar a total abertu-
ra e disponibilidade do Governo para, existindo dúvidas
quanto à questão da constitucionalidade, elas serem dissi-
padas em sede de comissão no debate na especialidade. A
abertura foi manifestada pelo Governo nos últimos dias,
designadamente a partir de ontem pela Sr.ª Ministra de
Estado e das Finanças, e hoje foi, de uma forma categóri-
ca, evidenciada pelo Sr. Primeiro-Ministro.
A proposta feita pelo Governo é de uma total sensatez,
tentando conciliar aquilo que é fundamental para todos, em
particular para a credibilidade do Estado português perante
a União Europeia, que é fazer-se, como está previsto, o
debate na generalidade e a subsequente votação na genera-
lidade e procedendo, em sede de comissão, às alterações
que, eventualmente, se considerem indispensáveis para
dissipar todas as dúvidas.
Mas, como ficou patente implicitamente das palavras
do Sr. Deputado António Costa, sejamos também francos e
directos: uma coisa são alterações para que não haja dúvi-
das quanto à constitucionalidade, em particular numa lei
desta importância; outra coisa, bem diferente, são as alte-
rações quanto ao conteúdo das matérias e quanto a essas
não há, da nossa parte, naturalmente por razões de interes-
se nacional, qualquer motivo para proceder a alguma alte-
ração.
A terceira nota que quero dar é a seguinte: com coisas
sérias não se devia brincar.
Aplausos do PS, tendo o Deputado António Costa
Como eu estava a dizer, com coisas sérias não se devia
brincar e o Srs. Deputados António Costa e Ferro Rodri-
gues, que já estiveram no governo, sabem muito bem, em
particular o Sr. Deputado Ferro Rodrigues, o que são com-
promissos assumidos perante a União Europeia, particu-
larmente neste momento difícil — repito, difícil — do
controlo do défice orçamental.
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças já teve oca-
sião de explicar, designadamente em privado, estas ques-
tões, que são absolutamente essenciais. Por isso, a votação,
na generalidade, na próxima 5.ª feira, da proposta de lei,
com toda a abertura para a discussão na especialidade, não
é uma questão de birra, mas de defesa do interesse nacio-
nal, e isso está para nós em primeiro lugar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): — É, é! É uma
questão de birra!
O Sr. Presidente: — Devo pedir desculpa ao Sr. Depu-
tado Bernardino Soares, porque estava inscrito antes do Sr.
Ministro e, por lapso, não lhe dei a palavra.
aplaudido de pé.
a uns segundos!
Obrigado! Vou esperar também o vosso aplauso daqui
Tem agora a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente,
estou a estranhar o que estamos a fazer neste momento,…
A Sr.ª Ministra de Estado e das Finanças (Manuela
Ferreira Leite): — Exactamente!
O Orador: — … porque me parece que, estando ini-
cialmente marcada para hoje, foi adiada para amanhã —
por razões que desconheço, mas que certamente serão
relevantes! — a análise do recurso de admissibilidade da
proposta de lei n.º 16/IX. Se houver inconstitucionalida-
des, não há outro remédio que não seja não admiti-la e,
portanto, o recurso segue. Penso que esta Câmara não
pode tomar outra posição sobre esta matéria e, portanto,
no Plenário de amanhã à tarde, teremos que aferir dessa
decisão.
Não nos parece que qualquer invocação de uma reu-
nião na União Europeia, por muito importante que seja —
e certamente é! — sirva, neste momento, para justificar
qualquer outra atitude que não seja a do rigoroso escrutínio
da constitucionalidade, nesta como em todas as outras
matérias.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Nem vejo como é que a eventual apro-
vação na generalidade, que não vincula a Assembleia da
República de nenhuma forma, pode ter uma importância
diferente daquela que tem no momento em que agora esta-
mos.
Portanto, Sr. Presidente, a minha interpelação é no sen-
tido de continuarmos os nossos trabalhos e de amanhã
dirimirmos esta questão no sentido de afastar eventuais
inconstitucionalidades, e, acima de tudo, nunca fazermos
«vista grossa» às inconstitucionalidades que eventualmente
existam.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a interpelação do
Sr. Deputado Bernardino Soares vai no sentido do desejo
da Mesa, isto é, de retomarmos a ordem do dia, que, mani-
festamente, não é a discussão desta matéria.
O Sr. João Cravinho (PS): — Peço a palavra, Sr. Pre-
sidente.
O Sr. Presidente: — Para que efeito, Sr. Deputado?
O Sr. João Cravinho (PS): — Para interpelar a Mesa,
Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Cravinho (PS): — Sr. Presidente, falo na
qualidade de Presidente da Comissão de Economia e Fi-
nanças, onde, amanhã, deverá ser apreciado o relatório
referente à proposta de lei ora em discussão. Como sabe,
Sr. Presidente, os relatos desta natureza só são enviados
para Plenário se cumprirem as condições regimentais e
54
I SÉRIE — NÚMERO 30
constitucionais para o efeito. Tanto assim que, na última
página do relatório, menciona-se, sempre, especificamente,
que, estando cumpridas as condições regimentais e consti-
tucionais, o diploma está em condições de subir a Plenário
da Assembleia.
Ora, dado o teor deste debate e o facto de estar agenda-
da para amanhã às 9 horas uma reunião da Comissão —
pelo que não tenho outra oportunidade senão esta para
interpelar V. Ex.ª —, na minha qualidade de Presidente da
Comissão de Economia e Finanças gostaria de saber o
seguinte: não estando de forma alguma dirimida a questão
da constitucionalidade e estando a mesma pendente da
comissão competente para a matéria (que não é a Comis-
são de Economia e Finanças) e do próprio Plenário, posso
assinar o relatório confirmando que estão cumpridas as
condições regimentais e constitucionais, ficando, portanto,
em manifesta contradição ou, eventualmente até, traduzin-
do-se numa usurpação de poderes de outras comissões
competentes?
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, inscreveram-se
os Srs. Deputados Guilherme Silva e Telmo Correia, supo-
nho que para intervir sobre a questão agora suscitada pelo
Sr. Deputado João Cravinho e contribuir, assim, para
esclarecer a Câmara em relação a esta matéria.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, não
há qualquer dúvida de que estamos aqui a tecer esta ques-
tão, por uma razão muito simples: o debate correu mal ao
Partido Socialista, correu mal à oposição e, portanto, era
preciso arranjar um incidente. E ele aí está!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
O Sr. António Costa (PS): — É extraordinário!
O Orador: — Vamos lá ver se nos entendemos em
relação a este assunto, designadamente em relação às ques-
tões suscitadas pelo Sr. Deputado João Cravinho.
Todos sabemos que há uma norma no Regimento que
refere que o Sr. Presidente da Assembleia pode não admitir
propostas de lei ou projectos de lei por inconstitucionali-
dade. E todos sabemos também que essa prerrogativa não
transforma o Sr. Presidente da Assembleia numa espécie
de «tribunal constitucional prévio» e que deve ser usada
com a parcimónia devida, como usava o Sr. Presidente
Almeida Santos, por exemplo — e bem! —, no sentido de
que a rejeição liminar de uma iniciativa legislativa só tem a
ver com inconstitucionalidades perfeitamente incontorná-
veis, perfeitamente grosseiras, perfeitamente manifestas e
incorrigíveis! Se um Deputado apresenta um projecto de
lei a dizer que é proibida a greve, o Sr. Presidente tem pura
e simplesmente de o rejeitar, uma vez que o diploma não
tem «conserto» possível!
Agora, se eventualmente se levantam dúvidas quanto
à constitucionalidade de um determinado diploma e estas
podem perfeitamente ser supridas, na especialidade, ao
contrário do que disse agora o Sr. Deputado João Cravi-
nho, muitas vezes, dezenas de vezes, é o próprio relatório
que chama a atenção, referindo que há dúvidas quanto à
constitucionalidade e recomendando que, depois da dis-
cussão na generalidade, quando da discussão na especia-
lidade, se tenha em atenção, se pondere, se faça e aconte-
ça. Portanto, não há aqui qualquer impedimento à subida
a Plenário.
Ora, estamos a aqui a criar uma falsa questão, estamos
aqui a criar um incidente, porque o debate correu mal ao
Partido Socialista e à oposição.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Depu-
tado Telmo Correia.
O Sr. Telmo Correia (CSD-PP): — Sr. Presidente, de
forma muito breve e no mesmo sentido da intervenção do
Sr. Deputado Guilherme Silva, para dizer que, efectiva-
mente, este tipo de incidentes é lamentável e cansativo.
Estivemos aqui toda a tarde a discutir o estado da Na-
ção. Gostámos do debate, foi interessante e é lamentável
que os senhores venham com este incidente a esta hora,
com intervenções longuíssimas, fazendo perder tempo ao
Plenário e à Assembleia, sobre uma matéria que, como
disse o Sr. Deputado Bernardino Soares (e aí estou de
acordo com ele), tem de ser resolvida em procedimento
normal da Assembleia, amanhã!
Portanto, os senhores quiseram introduzir aqui um
minidebate, que lamento e não vou «ajudar mais a esta
festa!».
O Sr. José Magalhães (PS): — Festa!?
O Orador: — Vou só dizer que já percebi, pela quarta
vez, a explicação que foi dada. E agora — como dizia um
presidente dos Estados Unidos —, leiam os meus lábios, se
quiserem. O Governo não admitiu a existência de inconsti-
tucionalidades. O que disse foi que, perante dúvidas, esta-
va disposto a limar qualquer aresta em sede de especiali-
dade. É preciso repetir? Não é! Toda a gente percebeu! E
isto não devia dar lugar a uma intervenção longuíssima do
Sr. Deputado António Costa, que chega ao limite de entrar
na pré-linguagem de briga de rua numa questão deste tipo,
incidental! É lamentável e não é aceitável!
Aplausos do CDS-PP e do PSD.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está tudo dito
sobre esta matéria. O incidente está encerrado.
Tem a palavra a Sr. Deputada Elisa Ferreira.
A Sr.ª Elisa Ferreira (PS): — Sr. Presidente, Srs.
Membros do Governo, Srs. Deputados: Voltando ao debate
que estava a decorrer, gostaria de colocar algumas ques-
tões que me parecem relevantes para o País e para esta
Assembleia, neste momento.
Penso que há acordo quanto ao facto de que o País tem
dois tipos de problemas fundamentais: por um lado, um
10 DE JULHO DE 2002
problema de competitividade e, por outro, um problema de
equilíbrio de contas públicas, em particular do controle do
défice público. Como conciliar estes dois objectivos? Aqui
reside uma questão fundamental, que julgo que é bom que
fique esclarecida.
O Sr. Vicente Jorge Silva (PS): — Muito bem!
A Oradora: — Para a coligação que está no Governo
e, sobretudo, para o PSD, antes das eleições, durante a
campanha, este problema resolvia-se claramente a favor do
apoio à competitividade. De tal forma isto foi claro que a
grande medida para a convergência real do País era, apesar
de um défice público estimado de 5% — não era 2%, não
era 3%, não era 4%, era 5%! —, o PSD, na altura, garantia
que a medida emblemática da sua governação seria o cho-
que fiscal, e havia quem defendesse, clara e afincadamen-
te, que o efeito de relançamento da economia associado ao
choque fiscal valia bem a perda de receitas que no curto
prazo lhe estaria associado. Isto é, entre os dois objectivos,
havia um, o principal, que era o relançamento da econo-
mia, e, juntamente com este aspecto, garantia-se uma taxa
de crescimento para o País de 1,5 a 2 pontos percentuais
acima da média da União Europeia.
Foi com estes propósitos que o PSD se apresentou
aos eleitores e estes aceitaram, confiaram, acreditaram e
votaram.
No momento em que, das promessas, se passa ao Pro-
grama do Governo, tudo muda! Tudo muda e, imediata-
mente, do discurso e da prática política, desapareceu tudo
quanto tinha a ver com convergência real e manteve-se
apenas um objectivo para o País: o controlo do défice
público. Esse passou a ser o problema do País e o objecti-
vo para o País.
Acontece que as consequências desta acção, desta
actuação e desta atitude por parte do Governo são absolu-
tamente desastrosas para o País. E são desastrosas a vários
títulos: são desastrosas, primeiro, porque acabam por
transformar a questão do défice — que, sendo importante,
não é a questão fundamental — na questão cerne, na ques-
tão central de Portugal. Ao fazerem isto, ao não terem um
Programa de Governo claro (foi aqui denunciada a exis-
tência de um não-Programa do Governo) e ao terem criado
um ambiente e uma expectativa completamente desastro-
sos para a economia portuguesa para resolverem o défice,
não só não o controlam como arruínam as perspectivas de
desenvolvimento para o País.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Há vários exemplos de medidas deste
género. Primeiro, Sr. Primeiro-Ministro, não vale a pena
criar uma agenda para o desenvolvimento se o Primeiro-
Ministro de Portugal diz que o seu País está de «tanga» e à
beira da catástrofe. Pergunto: quem é o investidor que
investe num país de «tanga» e à beira da catástrofe?
Aplausos do PS.
Depois, não vale a pena, Sr. Primeiro-Ministro, estar
preocupado com as questões de desenvolvimento quando,
relativamente ao controlo do défice, os senhores não con-
seguem cortar nenhuma despesa e, pelo contrário, a única
política que fazem é de aumento das receitas através não
do controlo e fiscalização sobre os impostos mas do IVA,
dos dois pontos percentuais que introduziram na economia,
e isso não é despiciendo. E não é despiciendo a vários
títulos, porque, de facto, a subida da taxa do IVA provoca
inflação, provoca uma tendência para o acréscimo dos
salários. E não é despiciendo a vários títulos, porque, de
facto, a subida da taxa do IVA provoca inflação, provoca
uma tendência para o acréscimo dos salários. E aqui cito
apenas o que diz o relatório do Banco de Portugal, tantas
vezes aqui invocado: «A não se verificar a moderação
salarial incorporada nas projecções,…» — e essa modera-
ção é acentuada pelas perspectivas de desemprego — «…
o crescimento poderá ser menor,…» — menor do que
aquele que está projectado, que é praticamente zero — «…
por via da perda da competitividade da economia portu-
guesa, e a taxa de desemprego poderá vir a registar aumen-
tos claramente mais acentuados». É isto que diz o relatório
do Banco de Portugal.
Isto é, a consequência última da aposta no aumento de
receita no IVA é que há pressões inflacionistas que serão
corrigidas através de uma revisão em baixa dos salários
portugueses, em lugar de se fazer uma revisão em alta
associada a uma dinâmica de produtividade. Isto é grave
internacionalmente para a posição de Portugal, é grave
para a competitividade e é grave para o futuro do País
numa Europa alargada.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Primeiro-Ministro: — Quem é que disse isso?!
A Oradora: — Por último, incapazes de controlar a
despesa, porque é complicado, então, vão cortar no
investimento. É esse corte no investimento que está pre-
visto do Orçamento rectificativo para este ano que foi
aqui aprovado. Estão congelados, no PIDDAC, 387 mi-
lhões de euros precisamente para atacar o problema cen-
tral do défice. É isso que está no Orçamento rectificativo
que foi aqui aprovado pela maioria, e, num clima de pré-
recessão, o Governo adopta como medida fundamental
aumentar o IVA e cortar o investimento, em particular o
investimento público.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr.ª Depu-
tada.
A Oradora: — Termino já, Sr. Presidente.
É por isso, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do
Governo, Srs. Deputados, que há necessidade de haver um
acordo, para que haja esse tal pacto de desenvolvimento
para o País. É que o grande problema do nosso país neste
momento — desculpem-me! — não é o défice; o défice é
um problema, mas o grande problema para o nosso país é a
divergência em relação à Europa em termos de desenvol-
vimento.
Sr. Primeiro-Ministro, em 2001, Portugal cresceu
1,9% e a Europa 1,5%, por isso crescemos 0,4% acima
da Europa.
56
I SÉRIE — NÚMERO 30
O Sr. Presidente: — Tem mesmo de concluir, Sr.ª De-
putada.
A Oradora: — Vou mesmo concluir, Sr. Presidente.
Já em 2002 e em 2003 vamos divergir da Europa, por-
que, em 2002, vamos crescer quase 1% abaixo da média
europeia e, em 2003, vamos crescer 1,1% também abaixo
da média europeia.
Meus senhores, tem de inverter-se a lógica da interven-
ção! É a divergência e não o défice o problema nacional!
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a pala-
vra o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.
Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Não quero deixar de
fazer aqui uma breve intervenção, ainda no tempo de que o
Governo dispõe para este debate, suscitada sobretudo pela
intervenção da Sr.ª Deputada Elisa Ferreira.
Se a Sr.ª Deputada e os Srs. Deputados do Partido So-
cialista não respeitam o Governo, deviam, pelo menos,
respeitar a inteligência e o bom senso dos portugueses.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Porque, ao fim destes meses, os portugueses podem
gostar muito, pouco ou nada do Governo, podem concor-
dar ou discordar das suas medidas e da sua acção, mas
todos os portugueses já perceberam algumas evidências
elementares.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): — Exactamente!
O Orador: — Já perceberam, por exemplo, Sr.ª Depu-
tada, que, em 2001, no ano passado, quando V. Ex.ª per-
tencia ao governo, a previsão do défice orçamental era de
1,1%, no entanto, como todos os dados vindos a público
hoje não deixam margem para dúvidas, infelizmente, vai
ficar quase na ordem dos 4%. Um descalabro, um descon-
trolo desta natureza — e deixe-me que lhe diga, Sr.ª Depu-
tada, não no plano pessoal mas, sim, no plano político —,
repito, um descontrolo desta natureza é uma vergonha.
O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): — É um crime!
O Orador: — Os senhores deviam, ao menos, ter um
bocadinho de pudor e um pingo de vergonha para não
voltar a esta situação!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Mas não é apenas a evidência do défice do ano passado
que aqui está em questão. Nós também assistimos, no
Parlamento e fora dele, em dois Orçamentos rectificativos
e em várias declarações públicas, a este discurso do gover-
no anterior: «Correu mal a execução orçamental de 2001,
mas, finalmente, em 2002, as contas vão entrar na ordem».
E o que é que aconteceu? Realidade e verdade incontorná-
vel é que a previsão do défice para 2002, que era de 1,8%,
se não tivéssemos aprovado o Orçamento rectificativo,
como já foi demonstrado publicamente à saciedade, sem
qualquer desmentido, resultaria num défice da ordem de
4,5% ao longo deste ano.
O Sr. José Magalhães (PS): — Por que é que não fala
a Ministra de Estado e das Finanças?!
O Orador: — Ou seja, os senhores não têm emenda,
nem têm perdão. Depois do descontrolo em 2001 e da
promessa e compromisso de colocar as contas em ordem
em 2002, a execução orçamental foi esta. Isto é uma irres-
ponsabilidade, Sr.ª Deputada!
Pasmo mesmo como é que, ao fim deste tempo, ainda
têm a coragem de dizer que a questão do défice não é a
questão mais importante…
O Sr. António Costa (PS): — E não é!
O Orador: — … ou ainda de vir defender aquilo que é
verdadeiramente indefensável. Exigia-se um bocadinho
mais de honestidade política e de honestidade intelectual.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Srs. Deputados, a grande questão é esta: não estamos a
falar de números sem importância e consequência na vida
das pessoas, o problema é que ter em dois anos — dois
anos apenas! —, até 2004, a casa arrumada e em ordem, as
finanças com rigor e as contas públicas em ordem tem
sacrifícios. E hoje os portugueses sabem bem que alguns
sacrifícios que são necessários têm a ver com este descala-
bro e com este descontrole.
Sr.ª Deputada, todos nesta Câmara estamos de acordo…
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que termine, Sr. Ministro.
O Orador: — … de que é preciso investir mais no nos-
so desenvolvimento e em maior justiça social. Sem dúvida,
Sr.ª Deputada! Mas, como toda a gente sabe, não se pode
distribuir a riqueza que não se tem.
Primeiro é preciso ter a casa arrumada e em ordem e é
por isso que, até 2004, alguns sacrifícios são necessários,
mas, a partir de 2004, os portugueses vão perceber que há
mais investimento, que as contas públicas estão em ordem,
que a saúde vai melhorar e que há um conjunto de refor-
mas que dão os seus frutos. Esta é a razão por que, na
altura própria, os portugueses julgarão de uma forma sere-
na e sem precipitações.
Quanto à Sr.ª Deputada — é a segunda vez que a ouço
fazer este discurso nesta Câmara —, permita-me que lhe
diga o seguinte:…
O Sr. Presidente: — Tem mesmo de terminar, Sr. Mi-
nistro.
O Orador: — Termino, Sr. Presidente.
Como estava a dizer e como também qualquer portu-
guês de bom senso e de mediana inteligência sabe, uma
mentira não é por ser repetida muitas vezes que se trans-
forma em verdade.
10 DE JULHO DE 2002
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
A Sr.ª Elisa Ferreira (PS): — Sr. Presidente, peço a
palavra para defender a honra da minha bancada.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr.ª Deputada,
dispondo, para o efeito, de 3 minutos.
A Sr.ª Elisa Ferreira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Mi-
nistro dos Assuntos Parlamentares, sobre o défice e sobre
as suas projecções já hoje foi aqui dito o suficiente.
Quando, nas suas palavras, o governo português errou
nas suas projecções, errou ao mesmo tempo que a maior
parte dos países europeus, os Estados Unidos da América e
todos os organismos internacionais, nas respectivas pro-
jecções. Mais grave e mais incompreensível é que se errem
projecções quando, como acontece com o Governo actual,
se arvora uma competência espantosa em matéria previsio-
nal e, em dois meses, não se apresente, através da Sr.ª
Ministra de Estado e das Finanças, qualquer número rela-
tivamente ao crescimento, ao défice e ao investimento, à
formação bruta de capital fixo, que bata certo ou minima-
mente certo com aquilo que são as projecções do Banco de
Portugal.
O Sr. António Costa (PS): — Muito bem!
A Oradora: — Portanto, sobre previsões, julgo que
estamos conversados, e o vosso curriculum começa a ser
bastante mais negro do que aquele que nos queriam atri-
buir.
Vozes do PS: — Muito bem!
A Oradora: — Segunda nota, sobre o défice e sobre os
compromissos para 2004: deixe-me que lhe diga, Sr.
Ministro, que o défice dos países é absolutamente essen-
cial, porque representa a credibilidade do País relativamen-
te ao exterior. Outra coisa é o acordo político que foi feito
no contexto da moeda única no espaço europeu, porque
esse é um acordo político. A França — que, nomeadamen-
te, já deu sinais nesse sentido —, a Alemanha e todos os
países da União não sacrificam o seu crescimento real, que
está pressuposto no compromisso do equilíbrio do défice,
ao equilíbrio desse mesmo défice. Esta iniciativa já come-
çou a ser tomada e Portugal, sendo o mais pobre de todos,
é o único que considera que deve comprometer a sua con-
vergência real para respeitar um défice politicamente acor-
dado dentro do quadro da União Europeia.
Terceira nota sobre o défice, que também não posso
deixar de lhe fazer: o grande argumento, a mais, de Portu-
gal é que, sendo um País pobre, pode perder os fundos. Sr.
Ministro, o senhor e o seu Governo vão perder os fundos
comunitários, agora, em 2002, …
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — A estra-
tégia do PS é essa: a de prejudicar o País!
A Oradora: — … porque não é possível esgotar o
quadro comunitário com as políticas de desorganização da
administração que os senhores estão a realizar nem com os
cortes efectivos que estão a fazer, em termos de investi-
mentos em capital. Não é possível assumir a contrapartida
nacional e os senhores para não perderem, em 2004, vão
perder, em 2002, capacidade de investimento e, inclusiva-
mente, fundos comunitários. Aqui estaremos todos, espero,
para ver, se isso acontece ou não! Espero que não, mas
tenho quase a certeza de que vai acontecer. Isto é um ab-
surdo, para não perder fundos em 2004, quando eles já
estão a acabar e quando a Europa está num processo acele-
rado de alargamento, perdê-los já, em 2002,…
O Sr. Presidente: — Sr.ª Deputada, o seu tempo já se
esgotou. Tem de terminar.
A Oradora: — Termino já, Sr. Presidente.
É para isso que os senhores estão a caminhar, cortando
investimento público, quando o País está numa fase de pré-
recessão. Os senhores inverteram o problema e, ao inverte-
rem o problema, estão a levar o País à ruína.
Aplausos do PS.
Protestos do PSD.
O Sr. Fernando Pedro Moutinho (PSD): — Que falta
de sentido de Estado!
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço calma e si-
lêncio, sobretudo nas bancadas de trás.
Para dar explicações, tem a palavra o Sr. Ministro dos
Assuntos Parlamentares. Dispõe de 3 minutos.
O Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares: — Sr.
Presidente, podemos divergir, mas temos de manter a civi-
lidade e a serenidade. É um apelo à serenidade que faço
aos Srs. Deputados!
Sr.ª Deputada Elisa Ferreira, três questões muito rápi-
das, na sequência da sua defesa da honra para efeitos de
fazer uma segunda intervenção sobre a mesma matéria.
Quanto à primeira questão, sobre o défice, a Sr.ª Depu-
tada diz que a questão do défice não é uma das questões
mais importantes, o que já tinha ficado indiciado na sua
primeira intervenção, mas ouvindo, agora, esta segunda
temos a certeza.
Vozes do PS: — E não é!
O Orador: — Sr.ª Deputada, algumas das considera-
ções que fez quase poriam os cabelos em pé ao Sr. Gover-
nador do Banco de Portugal!
Mas se a Sr.ª Deputada considera que é importante,
então, permita-me que reafirme o que disse, referindo o
seguinte: Sr.ª Deputada, com o descontrolo de 2001 e
apesar do compromisso que assumiram de que as contas
entravam finalmente em ordem em 2002, chegámos pra-
ticamente ao fim de quatro meses — quatro meses, ape-
nas! —…
O Sr. António Costa (PS): — Foi o suficiente para es-
tragarem tudo!
58
I SÉRIE — NÚMERO 30
O Orador: — … da vossa responsabilidade e as contas
estavam descontroladas! Verdadeiramente, os portugueses
já perceberam que VV. Ex.as são óptimos a falar, óptimos a
projectar, óptimos a planear, só não são, de facto,…
O Sr. José Magalhães (PS): — A fazer?…
O Orador: — … minimamente competentes a realizar
e a cumprir aquilo que assumem como compromissos!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Deixe-me que lhe diga, Sr.ª Deputada, uma vez mais —
a questão não é pessoal, mas é política — …
O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!
O Orador: — … que V. Ex.ª, enquanto Ministra do
Planeamento, que foi no passado, é uma grande responsá-
vel por uma quota muito elevada e significativa deste des-
controlo e desta derrapagem orçamental!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
É a verdade!
Quanto à segunda questão, dos fundos comunitários e
da execução do quadro comunitário de apoio, apenas duas
notas, de uma forma breve, sendo a primeira é seguinte:
esteja certa e segura de que o Governo vai executar a sério,
recuperando…
A Sr.ª Elisa Ferreira (PS): — Recuperando?!
O Orador: — … um conjunto de atrasos significativos
em matéria de execução do quadro comunitário de apoio.
Mas não deixa de ser curioso…
Vozes do PS: — Já estávamos à frente de todos!
O Orador: — Dão-me licença?
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, têm de deixar
ouvir o Orador! Não pode ser assim! Sr. Deputado Antó-
nio Costa, Sr. Deputado José Magalhães, Sr.ª Deputada
Elisa Ferreira, têm de deixar ouvir o Sr. Ministro, para ele
acabar a sua intervenção.
O Orador: — Sr. Presidente, espero que me desconte o
tempo, estou sempre a ser interrompido!
Sei que VV. Ex.as adoram criticar, mas não suportam
ser criticados. Também é uma forma de arrogância e con-
vinha um bocadinho mais de humildade a esse respeito.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sobre a questão dos fundos comunitários, não deixa de
ser curioso que a Sr.ª Deputada diga «não vão executar o
quadro comunitário de apoio» e ontem mesmo tenha vindo
criticar o Governo — veja-se bem! — por querer acele-
rar…
Vozes do PS: — Acelerar?!
O Orador: — … um programa de obras públicas indis-
pensável para o desenvolvimento do País! Ninguém os
entende!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
Sr.ª Deputada, depois de a ouvir nestas duas interven-
ções, permita-me que diga o seguinte: o tom que usa pare-
ce verdadeiramente de ressentimento.
Vozes do PS: — Ah, pois!
O Orador: — A esse respeito, devo dizer o seguinte:
ganhar e perder eleições é a coisa mais normal em demo-
cracia. Há três meses, os portugueses votaram. Sr.ª Depu-
tada, dê o benefício da dúvida e deixe que os portugueses
na altura própria julgarão. E nós não fugiremos, não
«abandonaremos o barco», assumiremos por inteiro as
nossas responsabilidades!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, necessa-
riamente breve, inscreveu-se o Sr. Deputado Francisco
Louçã, que tem a palavra.
O Sr. Francisco Louçã (BE): — Sr. Presidente, Sr.
Ministro dos Assuntos Parlamentares, a sua intervenção é
uma marca do Governo neste debate e, certamente, será
lida com a mesma atenção pelo Sr. Ministro Paulo Portas
com que foi pelos grupos de oposição.
Devo dizer-lhe que me surpreendem duas das afirma-
ções fundamentais do Governo e tudo isso resumiria este
debate: o Governo veio aqui dizer que, havendo os «sus-
peitos do costume», é preciso olhar para eles e desculpar
aquilo que o Governo não faz ou aquilo que o Governo faz
mal. Mas há dois argumentos notáveis a este respeito, que
são os seguintes: que houve um défice extraordinário em
2001, para o qual o Governo convoca um texto de uma
instituição europeia que é confidencial,…
Protestos do PSD.
… e sobre o qual, aliás, já foi criticado pela União Euro-
peia, para fazer algo que eu nunca vi um governo fazer,
que é, quando a Comissão considera que as contas estão
consolidadas a um certo nível, insistir em que Portugal está
num nível que deveria exigir alguma penalização.
O Sr. José Sócrates (PS): — É o prestígio do País!
10 DE JULHO DE 2002
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o seu tempo esgo-
tou-se.
O Orador: — Não peço mais do que a tolerância que
deu aos outros, Sr. Presidente.
Em segundo lugar, para nos dizer que se nada fizessem,
quando tomaram o Governo com as eleições de 17 Março,
a situação seria muito má. Sr. Ministro, que argumento é
este? Se não fizessem nada, talvez os comboios não saís-
sem da gare, talvez os barcos não pudessem avançar, tal-
vez não se vendesse gasolina!… O problema é que o Go-
verno tem de mostrar, em nove meses, aquilo que é capaz
de fazer.
O Sr. Primeiro-Ministro: — Em quatro meses!
O Orador: — E este Governo, que foi eleito por uma
«escama», exactamente, por uma indiferença insignifi-
cante, não nos pode só dizer que «não quer abandonar o
barco»!…
Protestos do PSD.
Não nos pode só dizer que «não quer abandonar o bar-
co», tem de dizer-nos o que é que faz. E o que lhe dizemos
a si é que as medidas que tomou, até hoje — aumentar o
IVA, suborçamentação na saúde — prejudicam a política
económica nacional, agravam a crise económica e condu-
zem a uma suborçamentação, que é muito grave. E é nisso
que faz toda a diferença e é aí que está escolher governar
ou não governar!
Este Governo veio dizer que a culpa é de todos, mas
que não governa.
O Sr. Presidente: — Para encerramento do debate, tem
a palavra o Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): — Já tínhamos sauda-
des de o ouvir!
O Sr. Ministro de Estado e da Defesa Nacional: —
Sr. Presidente, Sr. Primeiro-Ministro, Sr.as e Srs. Deputa-
dos: O Governo termina este debate exactamente como
começou,…
Vozes do PS: — É verdade!
O Orador: — … firme nas suas opções, porque foi
eleito para corrigir, para decidir e para reformar.
O que os portugueses nos pedem é que façamos o que é
necessário a Portugal, não é que façamos o que dizem as
sondagens.
Vozes do CDS-PP: — Muito bem!
A Sr.ª Maria Celeste Correia (PS): — Olha quem
fala!
O Orador: — Firme nas opções, moderado nos objec-
Foi por isso que este Governo trouxe a este debate
uma proposta de consenso sobre a lei da estabilidade
tivos.
orçamental que nós sabemos, e os senhores sabem, ser
absolutamente determinante para a credibilidade externa
de Portugal.
Foi por isso que o Governo trouxe a este debate o pro-
pósito de estabelecer um acordo social que mobilize os
trabalhadores e os empresários para objectivos essenciais
de retoma do nosso crescimento económico e de um cami-
nho de prosperidade para Portugal.
Ao contrário, o Partido Socialista sai deste debate pior
do que começou: perplexo com a abertura do Governo ao
dialogo social, que não vos suscitou nem uma interrogação
nem uma saudação;…
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
… incomodado com as suas próprias contradições em
relação ao objectivo nacional de conseguirmos consensos
para a nossa estabilidade financeira.
O Sr. José Magalhães (PS): — Com esta atitude?
O Orador: — Pode olhar-se o debate sobre o estado da
Nação como um debate em que cada qual, Governo e opo-
sição, definiu as suas posições relativamente à essência das
políticas e à atitude com que encara o País.
Falemos, então, da essência das políticas.
Esteve em discussão o problema da nossa estabilidade
orçamental. É preciso recordar ao Partido Socialista a
imensa quota-parte de responsabilidade de que agora quer
fugir.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados do Partido
Socialista, que o Governo anterior se comprometeu a cum-
prir os critérios de convergência?
É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados do Partido
Socialista, que o Governo anterior subscreveu, em nome
de Portugal, o pacto de estabilidade?
O Sr. António Costa (PS): — É!
O Orador: — É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados
do Partido Socialista, que Portugal, durante o vosso gover-
no, entrou em divergência profunda com os objectivos da
União Europeia?
Vozes do PS: — Não!
O Sr. José Magalhães (PS): — O CDS-PP votou favo-
ravelmente orçamentos do PS!
O Orador: — É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados
do Partido Socialista, que o PS sabe, e se não sabe tem
obrigação de saber, conhece, e se não conhece tem obriga-
ção de conhecer, a importância de atingirmos objectivos
orçamentais próximos do equilíbrio no ano de 2004?
Vozes do PS: — É!
O Orador: — É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados
do Partido Socialista, que o vosso governo deixou ao País
60
I SÉRIE — NÚMERO 30
um défice do Estado que, em 2001, de acordo com previ-
sões preliminares do Banco Central Europeu, pode atingir
3,9%,…
Vozes do PS: — Não!
Vozes do CDS-PP: — Mas é verdade!
O Orador: — … mais do triplo do que o vosso gover-
no tinha prometido?
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados do Partido
Socialista, que o descontrolo do défice do Estado, na par-
cela do ano que ainda é da vossa responsabilidade política,
tinha atingido tais proporções que se nada fosse feito Por-
tugal poderia terminar o ano de 2002 com um défice do
Estado de 4,5% em relação ao produto?
Vozes do PS: — Não!
O Orador: — É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados
do Partido Socialista, que…
Protestos do PS.
O vosso ruído não apazigua a vossa memória.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PS: — Estamos a responder!
O Orador: — É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados
do Partido Socialista, que um documento produzido pela
estrutura de coordenação para a reforma da despesa públi-
ca, o ECORDEP, apontava para medidas indispensáveis no
saneamento financeiro do País, que esse documento foi
pedido por vós…
Vozes do PS: — É!
O Orador: — … e que o Ministro das Finanças que o
tinha solicitado acabou por ser despedido?
É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputados do Partido
Socialista, que o PS sabe perfeitamente quais são as con-
sequências que Portugal sofrerá se falharmos os objectivos
de estabilidade orçamental?
Vozes do PS: — Sabemos!
O Orador: — É ou não verdade, Sr.as e Srs. Deputa-
dos do Partido Socialista, que o PS tem a obrigação de
compreender que se não cumprirmos os objectivos de
estabilidade orçamental o nosso país poderá sofrer mul-
tas pesadas,…
Vozes do PS: — Sim!
O Orador: — … poderá ser encaminhado para uma
situação de perda de fundos comunitários, perderá credibi-
lidade externa?
E, se tudo isto é do vosso conhecimento, como é que
vos assalta uma dúvida sequer em ajudar Portugal a ultra-
passar a situação financeira em que se encontra?!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Vozes do PS: — Não assalta!
O Orador: — E, ainda mais, sendo do Partido Socia-
lista e do anterior Primeiro-Ministro a inteira responsabili-
dade de interromper a legislatura — foram-se embora
porque quiseram! —, não é por isso que deixam de ter a
obrigação de saber que em 2004 Portugal tem de enfrentar
um desafio difícil, que é o do equilíbrio orçamental, soma-
do a outro desafio importante, que é o do alargamento,
nomeadamente do ponto de vista económico, que a nós,
portugueses, nos traz reptos fundamentais!
Perante tudo isto, Srs. e Sr.as Deputadas do Partido
Socialista, ou o PS é um partido que aspira a governar
Portugal ou é um partido que aspira a satisfazer as cliente-
las de cada momento! Ou Partido Socialista é um partido
com responsabilidade de Estado, ou, então, prefere ficar
refém de uma agenda conjuntural de satisfação imediata de
clientelas ou de oposições, mas que em nada beneficia o
interesse de Portugal, e os senhores, pelo menos na vossa
consciência, sabem que este desafio que vos fazemos é
inteiramente verdadeiro!
Vozes do PSD e do CDS-PP: — Muito bem!
O Orador: — Essa opção, Dr. Ferro Rodrigues, tem o
senhor de a tomar,…
O Sr. José Magalhães (PS): — Está tomada!
O Orador: — … na certeza de que o País também está
a olhar para si.
O Sr. José Magalhães (PS): — Nós sabemos!
O Orador: — O País conhece a nossa disponibilidade
para expurgar de qualquer indício de inconstitucionalidade
uma lei que os senhores sabem que é indispensável para o
futuro de Portugal.
O País conhece a disponibilidade do Governo para, nas
questões estruturais, trabalhar no seio da concertação soci-
al, por forma a alcançarmos um acordo que obtenha a
solidariedade de todos na partilha de responsabilidades…
O Sr. Eduardo Ferro Rodrigues (PS): — Há 25 acor-
dos para cumprirem!
O Orador: — … e nos objectivos de retomarmos um
caminho para a prosperidade.
O Sr. Deputado Ferro Rodrigues tem de decidir, prova-
velmente sozinho, sem o barulho que se faz da sua banca-
da para o condicionar,…
10 DE JULHO DE 2002
Protestos do PS.
… se o Partido Socialista quer ser humilde e reconhecer
que a enorme derrapagem financeira do Estado português
aconteceu nos vossos governos, e, sobretudo, se quer ter a
elevação de compreender que o objectivo do saneamento
financeiro e da estabilidade financeira não é um objectivo
do Governo, é um objectivo de Portugal!
Pode V. Ex.ª responder que não à abertura e à modera-
ção do Governo, mas saiba que perderá credibilidade inter-
na e externa, que entrará na periferia da governabilidade e,
ainda mais, que ficará refém de uma agenda que não tem a
ver com o núcleo dos interesses de Portugal mas em que o
Partido Socialista parecerá, nos dias ímpares, um grande
«Partido Comunista» e, nos dias pares, um «Bloco de Es-
querda» relevante!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): — É fácil e ridículo!
O Orador: — Precisarei eu de lhe lembrar, Sr. Depu-
tado Ferro Rodrigues, a propósito da generosidade em
nome do interesse nacional que cada um teve em cada
momento, que é verdade que, em nome do euro, o partido
maioritário desta coligação votou os vossos orçamentos?
O Sr. Joel Hasse Ferreira (PS): — O senhor votou
mais vezes! Por acaso, o PP votou mais vezes!
O Orador: — O que o País vos pede é o sentido de
Estado e o sentido de responsabilidade de saberem que é
importante a votação de uma lei de estabilidade orçamen-
tal, para mais conhecendo a disponibilidade do Governo
em chegar aos consensos necessários.
Mas, Sr. Dr. Ferro Rodrigues, não nos peça vagar, de-
mora, adiamento, mais adiamento. Devagar, devagarinho,
convosco íamos chegando ao precipício! Este Governo não
tem pressa, é apenas rigoroso…
Protestos do PS.
… e temos rigorosamente que fazer a estabilidade orça-
mental a que nos comprometemos, se quisermos que o
nosso país volte a ser economicamente relevante.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
E, ainda mais, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, num ape-
lo que lhe faço como líder do maior partido da oposição,
uma de duas: ou o Partido Socialista tem um assomo de
responsabilidade, percebe o que aconteceu em termos
financeiros nos seus governos e, ainda mais importante do
que isso, percebe a vantagem para Portugal, o interesse e o
vital que é para o nosso país conseguirmos o saneamento
financeiro das finanças públicas e a estabilidade orçamen-
tal, ou, então, Sr. Deputado Ferro Rodrigues, a sua política
(que às vezes não parece ser a sua, mas uma política da sua
bancada, sob pressão)…
Vozes do PS: — Eh!
O Orador: — … é aquela que pretende ganhar na rua
o que perde no Parlamento e que, às vezes, no Parlamento,
se comporta como se estivesse na rua.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Que País quer o Partido Socialista? Um Portugal per-
dedor, face aos objectivos europeus, ou um Portugal ven-
cedor, o que implica esforço, trabalho e sacrifício nos
objectivos europeus que podem levar-nos, como devem, à
prosperidade?
Estas reflexões são necessárias porque hoje, mais uma
vez, se observou, Sr.as e Srs. Deputados do PS, que tam-
bém na atitude perante o País há pelo menos dois discursos
no vosso partido.
O Sr. José Magalhães (PS): — Um mau e um bom?!
O Orador: — Não escapou a ninguém a diferença de
discursos entre o Dr. Ferro Rodrigues e o Eng.º José
Sócrates. Quando o Dr. Ferro Rodrigues ainda tenta um
módico de racionalidade, depara-se logo com aquela
ansiedade do PS que ontem denunciou junto dos seus
camaradas, em Guimarães — não demoraram nem 24
horas a descobrir o rosto da ansiedade!
Risos do CDS-PP.
Se o líder do PS, legitimamente, ainda hesita quanto a
questões fundamentais, logo salta o Eng.º José Sócrates
para o amarrar ao caminho errado, sabe Deus porquê!
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Isto é que é o estado
da Nação?!
O Orador: — Se o líder do PS tem de decidir, com a
responsabilidade que essas decisões encerram, o posicio-
namento do partido relativamente a leis que aferem a cre-
dibilidade externa do Estado português logo se agita o
Eng.º José Sócrates como quem diz: «Líder, se líder queres
continuar a ser, faz o que as sondagens mandam, não faças
o que o País precisa!»
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
Sr. Eng.º José Sócrates, a sua intervenção pareceu diri-
gida contra o Governo, mas, na verdade, foi dirigida para o
interior do seu partido. Sr. Eng.º José Sócrates, a sua inten-
ção não foi ter razão, foi condicionar a liderança do PS!
O Sr. José Magalhães (PS): — Escreva uma carta ao
Sócrates!
O Orador: — Sr. Presidente, cada qual assume as suas
responsabilidades! O País tem um Governo que corrige,
decide e reforma, mas não sabe se tem um principal parti-
do da oposição responsável e com sentido de Estado.
Amanhã saberemos!
Aplausos do PSD e do CDS-PP, de pé.
62
I SÉRIE — NÚMERO 30
Srs. Deputados não presentes à sessão por se encon-
trarem em missões internacionais:
Partido Socialista (PS):
Alberto Bernardes Costa
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida
Srs. Deputados que faltaram à sessão:
Partido Social Democrata (PSD):
António Joaquim Almeida Henriques
Eugénio Fernando de Sá Cerqueira Marinho
José Manuel Pereira da Costa
Maria Eduarda de Almeida Azevedo
Mário Patinha Antão
Partido Socialista (PS):
Acácio Manuel de Frias Barreiros
António Ramos Preto
Fernando Ribeiro Moniz
Jaime José Matos da Gama
João Barroso Soares
José da Conceição Saraiva
José Miguel Abreu de Figueiredo Medeiros
Luísa Pinheiro Portugal
Maria Amélia do Carmo Mota Santos
Maria Cristina Vicente Pires Granada
Maria Helena do Rêgo da Costa Salema Roseta
Partido Popular (CDS-PP):
Basílio Adolfo de Mendonça Horta da Franca
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL
O Sr. José Magalhães (PS): — É assim que acaba o
debate sobre o estado da Nação, com uma «carta de amor!?»
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro de Estado deixou no
ar uma interrogação a que posso responder dizendo apenas
que da nossa ordem do dia de amanhã consta, exactamente, a
discussão da proposta de lei sobre a estabilidade orçamental.
Antes, porém, conforme foi estabelecido, haverá período
de antes da ordem do dia, sem prolongamento, para cumprir-
mos algumas inscrições que relevam da anterior sessão.
Por hoje, está encerrada a sessão.
Eram 20 horas e 40 minutos.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Social Democrata (PSD):
Alexandre Bernardo Macedo Lopes Simões
António Paulo Martins Pereira Coelho
Carlos Alberto da Silva Gonçalves
Eduardo Artur Neves Moreira
Partido Socialista (PS):
Alberto Arons Braga de Carvalho
Joel Eduardo Neves Hasse Ferreira
José Manuel de Medeiros Ferreira
Maria do Rosário Lopes Amaro da Costa da Luz Carneiro
Nelson da Cunha Correia
Sónia Ermelinda Matos da Silva Fertuzinhos
Teresa Maria Neto Venda
Partido Popular (CDS-PP):
José Miguel Nunes Anacoreta Correia
Telmo Augusto Gomes de Noronha Correia